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O Governo do Estado de São Paulo não utiliza dados pessoais para medir aglomerações: A privacidade dos titulares de aparelhos de celular está preservada

A ação do Governo de São Paulo, além de manter os dados dos cidadãos anonimizados, atendeu indiscutivelmente ao interesse público.

quinta-feira, 28 de maio de 2020

Atualizado às 07:52

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Em abril de 2020, quando em vigor a exigência do isolamento social, imposto pelo Governo do Estado de São Paulo, pelos decretos estaduais 64.881/2020, 64.920/2020 e 64.946/2020, para o controle e a tentativa de limitação do contágio do vírus covid-19, foi utilizado, e, assim, informado à população, o SIMI - SP - Sistema de Monitoramento Inteligente de São Paulo.

A finalidade de tal sistema é o fornecimento de dados pelas operadoras de telefonia, acerca do uso de aparelhos de telefonia móvel celular, pela população da cidade, identificando locais de concentração, ou seja, de aglomeração de pessoas, que estavam infringindo a determinação de isolamento, mundialmente recomendada, para a redução, ao máximo, do contágio pelo coronavírus, que se tornou uma pandemia de proporções aberrantes e jamais vista no mundo, nos últimos anos.

O objetivo claro do uso de tal sistema não foi violar a privacidade nem a intimidade do usuário dos celulares, até porque não havia necessidade de se obter dados pessoais dos usuários dos celulares, para medir a aglomeração de pessoas nas ruas e o nível de adesão à determinação de isolamento por conta da vasta disseminação do covid-19.

Assim, não foi desrespeitada qualquer garantia individual constitucional. Não há qualquer invasão, do Governo do Estado de São Paulo, nos dados pessoais dos usuários de celulares ao medir-se a aglomeração local com os dados de geolocalização, e enviar-lhes mensagem estimulando-os a permanecer em casa, para minorar a disseminação da doença covid-19.

Nesse caso, a inviolabilidade do sigilo de dados de comunicação telefônica, prevista no art. 5º, inciso XII, da CF, bem como a liberdade de locomoção, outro direito constitucional fundamental, esse previsto no art. 5º, inciso XV, da CF, não foram afetados pela utilização, pelo Governo paulista, do SIMI-SP, no atual momento de disseminação de grave pandemia.

Com a medida implementada pelo Governo, de medição de aglomerações, não foi compartilhado qualquer dado pessoal da população, razão pela qual não foi praticado qualquer desrespeito aos princípios constitucionais acima mencionados (art. 5º, incisos XII e XV da CF). Assim, não se causou dano à população, nem ferimento a direitos individuais, vez que o objetivo foi exatamente o oposto: protegê-la da disseminação do vírus covid-19, que, já foi cientificamente comprovado, transmite-se de forma exponencial, sendo obrigatório o isolamento social, para contê-lo.

Nesse caso de utilização do SIMI-SP, o direito à inviolabilidade do sigilo (art. 5º, inciso XII, da CF) não é atingido, porque não se acessa dados pessoais do titular, nem os contidos nos telefones celulares, mas busca-se apenas identificar a massa populacional em movimento, ensejando aglomeração.

Da mesma forma, o direito à locomoção do cidadão (art. 5º, inciso XV da CF) também não é desrespeitado, porque trata-se de situação excepcional, em que o não deslocamento ou a movimentação restrita das pessoas é explicada e impõe-se, em caso de pandemia representada pelo covid-19, para evitar a proliferação de uma das doenças mais  contagiosas que afetou a humanidade.

Tais restrições devem ser analisadas como medidas excepcionais e destinadas a garantir a saúde e a vida da população, diante de tal gravíssima pandemia, com alto grau de contágio.

O consentimento do titular dos dados pessoais para a divulgação do conteúdo havido em seus celulares, previsto na  LGPD - Lei Geral de Proteção de Dados (lei 13.709/2018), não obstante o normativo ainda não se encontre com plena eficácia, não se aplica no caso em tela, para fins de uso, pelo governo paulista, de dados de geolocalização dos usuários de telefonia móvel celular do Estado de São Paulo, para o bem da população e em harmonia com o interesse público, conforme previsto no artº 4, III, e parágrafo primeiro, da LGPD.

E por que não se aplica a LGPD, ao caso? Porque trata-se de situação excepcional, envolvendo o interesse público de segurança da população, tendo por objeto o controle de uma gravíssima calamidade pública, que permite a aplicação de providências, pelo Poder Público, para a garantia da saúde e da vida do cidadão, dever do Estado, como estabelecem os arts. 5º da CF e 196, da CF e o art. 23, da LGPD, dentre outros.

O Governo do Estado de São Paulo, com a medida de rastreamento das aglomerações, através da utilização do SIMI-SP, tal como noticiado à população, buscou resguardar o interesse público, sobre o particular, como previsto no art. 23, da LGPD e reduzir o risco da disseminação descontrolada e o contágio do vírus covid-19, o que ensejaria o colapso da rede hospitalar, sem qualquer dúvida.

O Governo do Estado de São Paulo, repita-se, não está recolhendo dados pessoais de titulares definidos, identificados e específicos, mas dados estatísticos de movimentação e concentração de indivíduos anônimos, razão pela qual não há que se falar em violação de privacidade do cidadão. A LGPD, como se sabe, trata, nos seus arts. 5, XI, 12 e 13, da anomização de dados.

Tal sistemática promove, assim, um controle em casos excepcionais, como o de pandemia, pelo Governo do Estado de São Paulo, para a localização de concentração de pessoas, de modo que possa intervir, em favor do interesse público, para recomendar o isolamento naquele local identificado com uma excessiva concentração e movimentação de pessoas, o que interfere, de forma significativa, na disseminação do vírus covid-9, provocando uma superlotação de leitos hospitalares.

Ressalta-se, entretanto, que tal sistema, o SIMI-SP, utiliza referência de anônimos e não de indivíduos específicos, como acima mencionado, e conforme previsão legal da LGPD.

O que são dados anonimizados para a LGPD? O artº 5, inciso XI, da LGPD estabelece o significado de anonimização: "utilização de meios técnicos razoáveis e disponíveis no momento do tratamento, por meio dos quais um dado perde a possibilidade de associação, direta ou indireta, a um indivíduo". Um dado anonimizado, portanto, é um dado pessoal ou sensível que foi tratado para que suas informações não possam ser vinculadas ao seu titular original. Pela própria definição da lei, um dado anonimizado perde a possibilidade de associação, direta ou indireta, a um indivíduo.

Um dado só é considerado efetivamente anonimizado se não permitir que, via meios técnicos e outros, se reconstrua o caminho de desvinculação do dado, para "descobrir" quem era a pessoa titular do dado: se, de alguma forma, a identificação ocorrer, então ele não é, de fato, um dado anonimizado e sim, apenas, um dado pseudonimizado e estará, então, sujeito à LGPD.

Segundo especialistas, dados anonimizados são essenciais para o crescimento da inteligência artificial, da internet das coisas, do aprendizado das máquinas, das cidades inteligentes, da análise de comportamentos, entre outros. Eles indicam ainda que, sempre que possível, uma organização, pública ou privada, realize a anonimização de dados pessoais, pois isso aperfeiçoa a segurança da informação na organização e gera, assim, mais confiança em seus serviços e para seus públicos.

Outra forma de identificação de aglomeração já utilizada há tempo, de forma anonimizada, é a que se refere ao fluxo de tráfego nas cidades, através do aplicativo "waze". Dessa forma, verifica-se a concentração de veículos em certo local, sem identificar as pessoas que lá se encontram.

Concluindo, a utilização do SIMI-SP não ofende os direitos individuais garantidos pela Constituição Federal, mas, ao contrário, protege-os, porque estabelece metas de proteção à saúde, com base no interesse público, sem desprezar o sigilo das mensagens telefônicas dos cidadãos, sua intimidade e privacidade, nem seu direito de locomoção, que deve ser, momentaneamente, restrito, como tem sido recomendado por todos os governantes dos países do mundo, por conta da pandemia que atualmente afeta todo o planeta, em razão da disseminação do vírus covid-19, altamente contagioso.

Ressalta-se, para finalizar, que o SIMI-SP harmoniza-se com os princípios supra citados, porque utiliza apenas dados anonimizados, que não identificam qualquer cidadão, nem o perfil dos titulares de celulares observados na aglomeração, mas é utilizado e aplica-se apenas a estudos de medidas de concentração de pessoas em áreas públicas, que descumprem o isolamento social determinado pelo Governo, conforme orientação da OMS - Organização Mundial de Saúde, para evitar a disseminação mais rápida da doença causada pelo vírus covid-19.

O Governo de São Paulo só estaria descumprindo a Constituição Federal, como alegam alguns, se identificasse o perfil dos usuários de linhas de telefone celular em aglomeração de pessoas, e infringisse o sigilo dos dados das pessoas, acessando, de forma não autorizada, os dados dos respectivos titulares, compartilhando o perfil deles com terceiros e divulgando-os.

No caso, a ação do Governo de São Paulo, além de manter os dados dos cidadãos anonimizados, atendeu indiscutivelmente ao interesse público.

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*Maria Clara Villasbôas Arruda é advogada e sócia do escritório Pestana e Villasbôas Arruda  Advogados.

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