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Dados de saúde: A pandemia da divulgação

A LGPD, sem dúvidas, traria enorme segurança jurídica neste momento, vez que haveria o controle do tratamento de dados em geral, especialmente, os de saúde, considerados sensíveis.

terça-feira, 28 de abril de 2020

Atualizado às 11:41

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Com a pandemia da Covid-19, muitos dados de saúde de pacientes e da população em geral têm sido analisados e transferidos entre entidades públicas e privadas visando, principalmente, a análise e a criação de estratégias para contenção do surto que se instalou no Brasil e no mundo, além de estudos sobre tratamentos eficazes e desenvolvimento de vacinas.

Com certeza, a divulgação de informações relevantes acerca da doença, seus sintomas, graus de acometimento e severidade, incidência e prevalência são de suma importância, tanto para controle da pandemia, como para que sejam estabelecidos os critérios e meios de combate ao coronavírus. Além disso, a divulgação desses dados auxilia na conscientização da população que, aliás, tem expresso direito à informação. 

Por óbvio e sem que sejam necessárias grandes explanações, a notificação ao Ministério da Saúde a respeito dos casos confirmados da doença e dos locais onde se encontram os pacientes é de extrema necessidade. Quanto a isso, não nos parece haver divergência. 

Mas, é preciso ter cautela. 

Com certa frequência, dados diversos, inclusive prontuários e relatórios médicos de pacientes acometidos pela Covid-19 têm sido lidos e/ou transcritos nos meios de comunicação e nas redes sociais, expondo as pessoas de maneira que pode lhes gerar problemas e/ou discriminação.  

Da mesma forma, inúmeras estratégias de controle e monitoramento vêm sendo elaboradas, desde aplicativos em celulares até compartilhamento de informações de geolocalização. 

Mas, será, de fato, necessário que dados tão detalhados e específicos sejam coletados e divulgados? 

O primeiro alargamento da vacatio legis da Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD (Lei nº 13.709/2018) acabou por trazer este "prejuízo" para o atual momento.

Dados sensíveis importantíssimos precisam ser tratados, compartilhados e divulgados e não se tem, ainda, uma regulação específica para isso, tampouco há uma certeza de que tais dados serão excluídos ao final deste período tão difícil, preservando, assim, a privacidade dos titulares. 

Vale destacar que a vigência da LGPD em nada afetaria a possibilidade de divulgação de tais dados sensíveis, pois a própria Lei prevê, dentre suas bases legais, a possibilidade de tratamento de dados sem o consentimento do titular. A proteção da vida ou a incolumidade física do titular ou de terceiros; a tutela da saúde em procedimento realizado por profissionais de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária; o tratamento e o uso compartilhado, pela administração pública, de dados necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos; a realização de pesquisas em saúde pública; e o cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador são hipóteses que, analisando-se caso a caso, poderiam justificar o tratamento dos dados no contexto da pandemia do coronavírus. 

O que não se pode deixar de observar é que a dispensa de consentimento não significa um "passe livre" para que os dados coletados sejam tratados em desobediência aos demais princípios da Lei, em especial a finalidade e a necessidade do tratamento dos dados, menos ainda aos princípios constitucionais.

Porém, diante do grave momento vivido, é muito provável que haja novo adiamento da entrada em vigor da LGPD ou, ao menos, da aplicação das sanções nela previstas, inclusive já havendo Projetos de Lei nesse sentido (PL https://1.179/2020, já aprovado pelo Senado, que seguirá, agora, para votação na Câmara dos Deputados e, após, para sanção/veto presidencial; PL 5.762/2019; e PL 6.149/2019). 

A LGPD, sem dúvidas, traria enorme segurança jurídica neste momento, vez que haveria o controle do tratamento de dados em geral, especialmente, os de saúde, considerados sensíveis. Além disso, vigente estivesse a Lei, certamente um prazo - como, por exemplo, o fim do estado de calamidade pública ou da pandemia - seria estabelecido para que tais dados fossem excluídos, cessando por completo a possibilidade de compartilhamento e divulgação. 

Por outro lado, a entrada em vigor nesse momento, certamente implicaria em enormes esforços técnicos e excessivos gastos pelas empresas que, por óbvio, já vêm passando por um difícil período de recessão. 

De todo modo, a transmissão e a divulgação dos dados de saúde dos pacientes, independentemente de a LGPD ainda não vigorar, deve ser feita com muito cuidado, sempre com obediência estrita aos direitos fundamentais e com máximo respeito à dignidade da pessoa humana e ao princípio da boa-fé. Não se pode olvidar jamais dos direitos à privacidade, à honra, à intimidade e à imagem, constitucionalmente previstos e que devem, em qualquer hipótese, ser observados e respeitados.

Nada obsta, também, que o regramento da LGPD já comece a ser, ainda que aos poucos, instituído pelas empresas, que já vêm, às muitas, demonstrando interesse em sua aplicação.

Nos parece razoável, portanto, que as informações acerca dos dados de saúde dos pacientes acometidos pela Covid-19 sejam coletados, compartilhados e divulgados, desde que com extremo cuidado, já se observando os ditames da LGPD, atentando-se para o tratamento somente dos dados extremamente necessários e indispensáveis, sempre com absoluta atenção aos direitos fundamentais e à dignidade da pessoa humana. 

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*Marília Mendes Chiaradia é sócia da Vencovsky & Chiaradia Advogados.

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