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A importância da cláusula MAC em fusões e aquisições em tempos de pandemia do coronavírus

A cláusula MAC sempre mereceu o devido cuidado dos investidores em operações de M&A

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Atualizado às 11:58

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Como já é de conhecimento de empresários e investidores em geral, a economia mundial vem enfrentando turbulências desde que a pandemia do novo coronavírus se espalhou entre os mais diversos países. Somado aos efeitos econômicos do coronavírus, a disputa comercial entre Arábia Saudita e Rússia, quanto ao preço do barril do petróleo, fez o valor do óleo reduzir drasticamente no cenário internacional, trazendo ainda mais impactos para os negócios das empresas de vários setores da economia, não sendo diferente com o setor de óleo e gás.

A situação atual revelou um grande risco existente em operações de fusões e aquisições. O investidor, na posição de comprador, subitamente acabou sendo surpreendido, no curso de uma negociação de fusões e aquisições ou de venda de empresa, pela ocorrência de um evento inesperado que impactou de modo relevante o resultado ou os ativos da empresa alvo que estava sendo adquirida, justamente por conta do cenário macroeconômico ainda incerto como consequência do coronavírus.

E as perguntas que esses investidores buy side têm feito nesse momento repleto de incertezas e com maiores riscos são: O que posso fazer nesse cenário? Como devo conduzir, daqui para frente, uma operação de fusões e aquisições já iniciada? Quais os efeitos da crise do coronavírus na relação jurídica já existente entre as partes? Há alguma forma de minimizar minhas eventuais perdas na condição de investidor/comprador nesse cenário de possível diminuição da rentabilidade dos negócios? É possível fazer uma revisão dos contratos assinados já com a maior parte das negociações avançadas?

Esse problema acontece justamente porque, na maioria das operações de fusões e aquisições, existe um período considerável entre o início das negociações e o fechamento do negócio com o pagamento do preço, pagamento esse que pode durar alguns meses e, às vezes, até anos. E, nesse período, os negócios da empresa-alvo podem ser prejudicados por circunstâncias estranhas ao negócio em si, mas que impactarão os lucros e viabilidade do negócio para o investidor. E é exatamente nesse cenário que surge a questão para avaliar se o investidor tem obrigação de fechar o negócio e pagar o valor acordado ou se pode dele desistir.

Daí a importância da elaboração aprofundada dos documentos negociais para que possam ser previstas situações com a narrada acima, que, certamente, estão impactando atualmente muitos negócios de fusões e aquisições ao redor do mundo, enquanto o coronavírus se propaga pelos países e ainda não se tem a real certeza do tamanho dos prejuízos econômicos que serão causados pela pandemia.

Essa situação pode ser perfeitamente regulada pela cláusula Material Adverse Change, ou Cláusula MAC, conforme a sua sigla em inglês. De acordo com essa cláusula, o investidor, na posição de buy side, poderá desistir do negócio se a empresa alvo sofrer uma diminuição ou perda de seus ativos, condições, operações, resultados ou expectativas, oriundos de eventos ou ocorrências imprevistas, sem que essa desistência possa gerar ao investidor qualquer penalidade1.

A cláusula "Material Adverse Change" teve sua origem na regulamentação americana do mercado de valores mobiliários. Conforme dados oficiais, seu primeiro registro foi identificado na obrigatoriedade de divulgação de atos, fatos e situações que pudessem causar à companhia alvo efeitos materiais adversos, conforme a previsão do Securities Exchange Act, promulgada nos Estados Unidos da América2.

Vê-se, portanto, que a cláusula MAC é de suma importância, sobretudo em momentos de dificuldades financeiras, operacionais ou estruturais da empresa-alvo. Uma redação abrangente da cláusula Material Adverse Change pode deixar o buy side em uma situação muito mais confortável e segura para, a qualquer momento, interromper as negociações e desistir da aquisição ou da fusão inicialmente acordada. É possível ainda que o sell side aceite renegociar o preço, especialmente quando a cláusula for redigida por especialistas com termos mais genéricos ou abrangentes.

Os efeitos da pandemia ainda podem estar relacionados a muitos fatores que impactarão o equilíbrio econômico-financeiro da operação, a capacidade de pagamento, além da variação cambial excessiva com a volatilidade atual do mercado. Por isso, a existência da cláusula MAC em contratos de M&A já celebrados é um trunfo para os investidores no atual cenário e deve servir de aprendizado para vendedores e compradores que não utilizaram essa cláusula em seus contratos negociais anteriormente.

De qualquer forma, para as operações já iniciadas e em andamento antes da pandemia do covid-19, é importante que o investidor insista na caracterização da força maior, com o efeito material adverso, cabendo a ambas as partes avaliar sua aplicação na negociação já existente, considerando que certamente os negócios da empresa alvo serão impactados pelas incertezas da atividade econômica mundial.

Fica evidente, portanto, que os termos do contrato de fusões e aquisições que lidam com mudanças adversas relevantes devem ser cuidadosamente negociados pelas partes envolvidas e devem levar em consideração as circunstâncias particulares de cada negócio em relação aos casos adversos, o que vale dizer que a caracterização de mudanças materiais adversas é específica para cada tipo de contrato e negócio3.

Uma estratégia muito comum que pode ser utilizada pelos vendedores é exigir a definição de exceções à aplicação da cláusula MAC, como, por exemplo, determinar que ela não deve ser aplicada quando as mudanças forem ocasionadas pela alteração nas condições econômicas gerais ou setoriais (como alteração governamental da inflação, juros ou nova regulamentação da atividade da companhia) ou quando as mudanças resultarem da própria transação de aquisição ou de venda da empresa.4

Como se vê, a cláusula MAC sempre mereceu o devido cuidado dos investidores em operações de M&A. Em situações de calamidade e de crise econômica, como essa causada pela pandemia do coronavírus, mais ainda se confirma a necessidade de se negociar e priorizar tal cláusulas nas operações, principalmente por parte do buy side, que precisa se resguardar de situações imprevistas na condução do seu negócio.

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1 WEST, Glenn. Avoiding the Mindless Use of the Brainless MAC Clause. 2017

2 THREET, Hunter C. The Definition of Material Adverse Change: Balancing Risk in Merger Agreements Under Delaware Law, p. 1020.

3 WHITEHEAD, Charles K. Sandbagging: Default Rules And Acquisition Agreements. 36 Del. J. Corp.

L. 1081, 2011.

4 SIEDEL, George J. The Double Liar Dilemma in Business Negotiations. 17 Stanford Journal of Law,

Business & Finance 1, Fall, 2011.

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t*Leandro Luzone é advogado, fundador do escritório Luzone Legal, e diretor da Luzone Capital, empresa de investimento e intermediação em M&A.

 

 

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