Revisão do contrato de locação em meio à pandemia do covid-19
Caso fortuito ou força maior x discrepância entre o valor do aluguel e o preço efetivo de mercado x fato imprevisível e extraordinário x onerosidade excessiva.
quarta-feira, 8 de abril de 2020
Atualizado em 9 de abril de 2020 14:19
O momento de instabilidade social e econômica decorrente da pandemia do Coronavírus (covid-19) - declarada pela OMS no dia 11/3/20201 e pelo Brasil em 20/3/20202 - está causando reflexos sem precedentes nas relações jurídicas e impactando diretamente nos negócios imobiliários e no desenvolvimento nacional, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil3.
Indiscutível que no momento a atenção deve estar voltada para a saúde, direito de todos e dever do Estado4, envidando-se todos os esforços necessários da administração pública e do povo brasileiro para prevenir e conter a disseminação do Coronavírus, principalmente diante da declaração de situação de Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII)5.
Visando a proteção da coletividade, o Brasil instituiu o Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da covid-196, adotando como medida inicial o distanciamento social, isolamento domiciliar e quarentena7.
Outras medidas foram tomadas, como por exemplo a Medida Provisória 9268 que estabeleceu procedimentos para aquisição de bens, serviços e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde, e a Medida Provisória n. 9369 que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública.
Essas medidas "não afastam a competência concorrente nem a tomada de providências normativas e administrativas pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios", conforme decidido liminarmente na ADI 634110 pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF),
Corroborando esse entendimento, em recente decisão liminar proferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 67211, o ministro Alexandre de Moraes reconheceu a competência estadual, distrital e municipal para o enfrentamento do estado de calamidade pública, mesmo que em sentido contrário aos comandos do Poder Executivo Federal, in verbis:
"Não compete ao Poder Executivo federal afastar, unilateralmente, as decisões dos governos estaduais, distrital e municipais que, no exercício de suas competências constitucionais, adotaram ou venham a adotar, no âmbito de seus respectivos territórios, importantes medidas restritivas como a imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outros mecanismos reconhecidamente eficazes para a redução do número de infectados e de óbitos, como demonstram a recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vários estudos técnicos científicos".
"Em momentos de crise, o fortalecimento da união e a ampliação de cooperação entre os três poderes, no âmbito de todos os entes federativos, são instrumentos essenciais e imprescindíveis a serem utilizados pelas diversas lideranças em defesa do interesse público", afirmou o ministro Alexandre de Moraes12.
A propósito da competência concorrente o Estado do Espírito Santo também vem adotando medidas para enfrentamento da pandemia, v.g. decretos 4.593, 4.600-R, 4.605-R e 4.607-R que determinaram a suspensão do funcionamento de estabelecimentos comerciais em geral (roupas, calçados, eletrodomésticos, móveis, papelaria, eletrônicos, decoração), centros comerciais (shopping centers), academias de esporte de todas as modalidades, escolas, faculdades, universidades, cinemas, teatros, museus, atendimento ao público em todas as agências bancárias, boates, casas de shows e espaços culturais.
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1 Disponível em
2 Decreto Legislativo n. 6/2020. Disponível em
3 Art. 3º, CF. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) II - garantir o desenvolvimento nacional.
4 Art. 6º, CF. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 23, CF. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
Art. 196, CF. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
5 Lei 13.979/2020. Disponível em
6 Decreto 10.277, de 16 de março de 2020. Disponível em
7 Lei 13.979/2020. Disponível em
8 Medida Provisória 926/2020. Disponível em
9 Medida Provisória 936/2020. Disponível em < https://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv936.htm>
10 Decisão proferida na ADI 6341 em 24 de março de 2020, às 10h30. Íntegra da decisão. Disponível em
11 Disponível em
12 Disponível em
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*Germano Naumann Margotto é especialista em Direito Negocial e Imobiliário pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI), Direito Tributário pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV) e Gestão Tributária pela Universidad de Castilla-La Mancha (UCLM). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM) e da Associação Brasileira de Contribuintes (ABCONT). Sócio-fundador do escritório Margotto, Pedreira de Freitas Sociedade de Advogados.