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Sua empresa vai superar os impactos do covid-19?

Espera-se que as pessoas e as sociedades empresárias ajam com prudência, determinem seus riscos, seus planos de ação durante os próximos meses e, com um saudável otimismo - pautado em um mix de fé e de atuação diligente - encontrem o "tratamento" para superar ou mitigar os prejuízos e as expressivas mudanças que estão viralizando com o covid-19.

sexta-feira, 27 de março de 2020

Atualizado às 12:35

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A capacidade de contestar pensamentos catastróficos recorrentes de forma eficaz é uma das vertentes do viés otimista, cuja definição está atrelada às expectativas das pessoas sobre a ocorrência de certos eventos. Ser otimista traz inúmeros benefícios, como proteção contra a depressão, elevação do nível de conquista do indivíduo, melhoraria do seu bem-estar físico e, além de tudo, é um estado mental mais agradável de se conviver e estar. Para Daniel Kahneman, "o principal benefício do otimismo é a resiliência em face dos reveses".

É de se concluir, portanto, que o otimismo é essencial para que as pessoas possam atravessar o revés, sem precedentes históricos, do covid-19. No entanto, a despeito de parecer positivo ser otimista, por promover ação, resiliência e comprometimento, o otimismo é útil até certo ponto, pois em determinado nível de atuação e a depender do contexto da situação pode tornar-se prejudicial. Quando combinados, fatores emocionais, cognitivos e sociais que apoiam o otimismo exagerado podem agir como uma "poção inebriante", fazendo com que as pessoas assumam riscos que, se soubessem das chances, teriam evitado.

Avaliações irreais sobre si e acerca dos planos futuros e, ainda, a ilusão de estar no controle dos acontecimentos da vida fazem parte do viés otimista. Em exemplos práticos, pode-se dizer que as pessoas possuem a tendência de acreditar que irão gostar do primeiro emprego, que receberão uma boa remuneração e, sem dúvida, que terão um filho talentoso. É fácil - e natural - acreditar que o futuro será melhor que o presente.

Em contrapartida, o viés otimista faz com que as pessoas diminuam ou, por vezes, desconsiderem as chances de sofrer alguma tragédia ou revés em suas vidas, como se envolver em um acidente automobilístico, ser vítima do cometimento de um crime, adquirir alguma doença ou vivenciar uma pandemia. É como se a maioria dissesse: "o futuro será ótimo, especialmente para mim". Basta se atentar à quantidade de pessoas que, mesmo diante da avalanche de decretos federais, estaduais e até municipais determinando medidas de isolamento social, continuam andando pelas ruas das cidades, especialmente aqueles que fazem parte do grupo de risco, como os idosos. Certamente, cada pessoa que se coloca em situação de perigo nos dias atuais é um otimista e acredita demasiadamente que, talvez por ato divino, não "pegará" o novo coronavírus - aliás, "o outro sim, pegará, mas eu não", é o que dizem. 

O viés otimista, portanto, está intimamente ligado ao excesso de confiança e à tomada de decisões arriscadas. De uma forma ou de outra, eventuais falhas tendem a ser desconsideradas e é aí que reside o perigo. No âmbito jurisdicional, por exemplo, o contexto de incerteza jurídica ou de impossibilidade de se determinar a probabilidade mínima acerca do êxito da demanda a ser ajuizada, somado, muitas vezes, às baixas ou à ausência de custas judiciais, fomenta o gosto pelo risco, leiase, pela ação judicial.

Na avaliação de Oren Bar-Gill, "a lei pode desempenhar um papel importante na formação da percepção", ou seja, "não apenas os vieses cognitivos afetam o funcionamento das regras legais, mas as próprias regras legais influenciam o tipo e a magnitude dos vieses cognitivos predominantes". Além da efervescência de decretos e de medidas provisórias promulgados, o próprio contexto e ambiente ora vivenciados é de incerteza. Certamente, as pessoas que ainda saem às ruas acreditam que não serão vítimas do covid-19 ou que se trata de uma mera "gripezinha". Igual  lógica se aplica às sociedades empresárias e não se pode ignorar o ser humano que as habita.

É necessário traçar cenários, avaliar o nível de exposição da empresa aos impactos decorrentes do covid-19, identificar as obrigações que podem ser afetadas, avaliar meios alternativos de adimplemento, estabelecer planos de ação, renegociar e fazer tudo o que for possível para criar uma linha de conduta baseada mais na prudência e menos no otimismo. Em recente artigo publicado pela empresa de consultoria empresarial McKinsey & Company, mencionou-se que a implementação de lockdowns, ou seja, de fechamento total das empresas cuja atividade seja reputada de "não essencial" pelo Estado, gera uma queda na atividade econômica mais acentuada e abrupta que qualquer outra já vivenciada pelos autores. Simplesmente, as pessoas não estão comprando, viajando, trocando de carro, saindo para jantar ou preocupadas com as roupas que poderiam adquirir nos shopping's center's - estocar comida, remédios e rolos de papel higiênico(?!) concentram o enfoque atual ou a insônia de boa parte da população mundial.

A incerteza ainda é prevalente e a ausência de certeza fomenta o otimismo e este, por sua vez, promove a busca pelo risco - o que pode significar a decisão das pessoas e das empresas de deixar que o tempo, a boa sorte e os inúmeros decretos e medidas provisórias resolvam seus problemas. O primeiro ponto para se iniciar a construção de soluções aos impactos econômicos e  comportamentais decorrentes do covid-19, por conseguinte, perpassa pela edificação de um cenário menos inseguro, com regras e restrições claras. Até o momento, ficar em casa, passar álcool em gel, manter as avós e avôs em "cárcere privado" são medidas que já foram absorvidas. Porém, em relação às empresas, quais possibilidades estão sendo aventadas? O que será passível de aplicação para mitigar os prejuízos sofridos?

Alegações de força maior, imprevisão contratual, onerosidade excessiva, entre outras, estão sendo abordadas pelos juristas como hipóteses capazes de servir ao propósito de solucionar os problemas que já estão surgindo na seara empresarial e contratual. Mais que entender os requisitos e os conceitos atinentes a cada possibilidade teórica, no entanto, deve-se compreender que a cessação paulatina dos lockdowns gerará a necessidade de adaptação aos novos cenários. A capacidade de entrega das empresas, como restaurantes, bares etc. será menor, as mesas deverão ficar mais distantes, menos garçons e cozinheiros serão necessários; o aumento do desemprego é iminente; as companhias aéreas tendem a operar em menor escala, já que as pessoas não estão e, provavelmente, não viajarão tão cedo à turismo; as lojas tendem a sofrer com a diminuição das compras, pois os clientes, traumatizados pela situação de pandemia, talvez prefiram guardar seus salários em vez de adquirir aquele casaco ou sapato. Enfim, diversas intercorrências - contratuais, trabalhistas, imobiliárias e, sobremaneira, emocionais -, seja em pequenos ou em grandes negócios e em pequenas ou em grandes famílias, já estão e continuarão ocorrendo.

Nas próximas semanas, ou até mesmo dias, os protocolos e as dinâmicas de intervenção do Estado tendem a ficar mais claros. Espera-se que as pessoas e as sociedades empresárias ajam com  prudência, determinem seus riscos, seus planos de ação durante os próximos meses e, com um saudável otimismo - pautado em um mix de fé e de atuação diligente - encontrem o "tratamento" para superar ou mitigar os prejuízos e as expressivas mudanças que estão viralizando com o covid-19. De todo modo, ainda que mais tarde, a engrenagem da economia precisa - e vai - voltar a funcionar. A economia vai reaquecer. As pessoas e as empresas conseguirão se adaptar ao novo cenário mundial que está em formação. Apenas se anseia, com força, que essa visão de "final feliz" não seja, apenas, uma simples manifestação do otimismo que pulsa no íntimo desta autora.

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BAR-GILL, Oren. The evolution and persistence of optimism in litigation. The Journal of Law, Economics, & Organization. Oxford, UK, v. 22, n. 2005, p. 492. Artigo enviado pelo autor por meio do e-mail [email protected] em setembro de 2017.

FUX, Luiz; BODART, Bruno. Processo civil e análise econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

GOULART, Bianca Bez. Análise econômica do litígio: entre acordos e ações judiciais. Salvador: Editora JusPodivm, 2019.

KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: duas formas de pensar. Tradução de Cássio de Arantes Leite. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

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SELIGMAN, Martin E. P.; VERKUIL, Paul R.; KANG, Terry H. Why lawyers are unhappy. Deakin Law Review, v. 10, n. 1, p. 49-66, 2005. Disponível em: LSUC/Articles/WhyLawyersareUnhappy.pdf>.

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WOLKART, Erik Navarro. Análise econômica do processo civil: como a economia, o direito e a psicologia podem vencer a tragédia da justiça. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.

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Bianca Bez Goulart - Editora Juspodivm*Bianca Bez Goulart é mestre em análise econômica pela UFSC. Diretora-secretária da ABDE. Professora de cursos de pós-graduação. Advogada.

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