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Homo sacer e a legítima defesa

No Brasil o índice de mortes de cidadãos advindo de ações policiais sempre foi alto, principalmente de pessoas de classe média ou baixa, maiores residentes de regiões periféricas onde as ações policiais são sempre mais fortes e recorrentes, como mostra uma matéria de 2019 que esclarece sobre o número recorde de mortes por policiais nesse ano no estado do Rio de Janeiro

segunda-feira, 9 de março de 2020

Atualizado às 11:42

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A lei 13.964/19, também conhecida como pacote anticrime, entrou em vigor em janeiro de 2020 e trouxe diversas alterações legislativas referentes às leis penais e processuais penais. Contudo, como visto desde a apresentação do projeto desta legislação, muitas destas alterações são polêmicas e inflam discussões entre os juristas.

Especificamente, o artigo 2º desta legislação altera o Código Penal brasileiro em seu artigo 25 que trata sobre a legítima defesa, ampliando o instituto já existente, abrangendo a possibilidade de um agente de segurança pública agir de forma violenta em detrimento da defesa da integridade física dele ou de outrem.

No Brasil o índice de mortes de cidadãos advindo de ações policiais sempre foi alto, principalmente de pessoas de classe média ou baixa, maiores residentes de regiões periféricas onde as ações policiais são sempre mais fortes e recorrentes, como mostra uma matéria de 2019 que esclarece sobre o número recorde de mortes por policiais nesse ano no estado do Rio de Janeiro1.

Essa alteração legislativa pela lei 13.964/19 se dá pela justificativa do alto índice de violência no Brasil com a compreensão de que a ampliação da ação policial pudesse diminuir a violência como um todo. Há tempos se sabe que violência não se combate com mais violência, o que torna essa abrangência de ação policial, desde a apresentação do projeto de lei, um enorme equívoco e, consequentemente, carta branca para que ocorram mais mortes e repressões policiais desnecessárias.

Neste ponto é que diversos juristas vêm associando essa alteração de lei com o instituto proveniente do Direito Romano, a expressão latina Homo Sacer, que significa aquela pessoa desprovida de proteção do Estado, que se encontra à mercê de qualquer um, que pode ter sua vida ceifada a qualquer momento, sendo o seu agressor isento de qualquer penalidade.

Essa comparação se deve ao fato de que a parte da população brasileira que será direta e negativamente atingida por essa alteração legislativa é a mesma de sempre. Com a diferença de que isso ocorrerá em âmbito mais agravado em desfavor dos cidadãos de periferia, classe média baixa e que vivem nas zonas de maior violência e maior ação policial.

Como gravame à questão de violência policial tramita na Câmara dos Deputados o projeto de lei 5.610/19 que dispõe sobre os deveres do cidadão durante uma abordagem policial, com o intuito de criminalizar e delimitar as ações de um indivíduo quando este for abordado por um agente de polícia. Definindo, inclusive, que se as obrigações não forem cumpridas a pessoa poderá estar sujeita a pena de detenção de três meses a um ano e multa.

O que se conclui desta modificação legislativa e o que certamente será retratado nos gráficos de violência dos próximos anos é que não haverá diminuição da violência no país, mas sim um aumento do número de mortes causadas por policiais que estavam agindo em legítima defesa, bem como de indivíduos que foram mortos durante ações policiais por balas perdidas.

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1 Matéria G1 - Mortes Recordes no Estado do RJ: Clique aqui

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t*Mariana Cardoso Magalhães é sócia advogada do escritório Homero Costa Advogados.

 

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