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A isenção de IPVA para empresas de transporte de passageiros (fretamento contínuo) e a ilegalidade nas condições impostas pelo fisco paulista para concessão do benefício fiscal

Dado o alto valor dos veículos envolvidos na atividade (ônibus, micro-ônibus e vans) esse IPVA de 2020 pode atingir valores exorbitantes, perto da casa dos R$ 100 mil reais, onerando ainda mais a atividade desses empresários, que já tiveram que desembolsar altas quantias no final de 2019 com o pagamento do 13º salários e férias de seus funcionários.

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Atualizado às 10:43

O ano de 2020 se inicia com a esperança de retomada da economia e do crescimento econômico, principalmente no Estado de São Paulo.

No entanto, todo início de ano traz para os empresários do setor de fretamento de veículos o temor com os altos gastos com o IPVA da frota de veículos e as exigências impostas pelo Fisco Paulista para concessão do benefício da isenção do imposto às empresas.

Dado o alto valor dos veículos envolvidos na atividade (ônibus, micro-ônibus e vans) esse IPVA de 2020 pode atingir valores exorbitantes, perto da casa dos R$ 100 mil reais, onerando ainda mais a atividade desses empresários, que já tiveram que desembolsar altas quantias no final de 2019 com o pagamento do 13º salários e férias de seus funcionários.

Trata-se, portanto, esse gasto com o IPVA, de um gasto que impacta negativamente o caixa dessas empresas, dificultando o início de ano destas, bem como novos investimentos.

Visando incentivar a mobilidade urbana e privilegiar o transporte coletivo de passageiros, o Estado de São Paulo concede à essas empresas (fretamento contínuo) que realizem o transporte público de passageiros, seja na modalidade de transporte urbano como metropolitano, o benefício fiscal da isenção do IPVA, isto é, empresas que realizem o transporte de passageiros ficam desoneradas do pagamento do IPVA desde o momento da formulação do pedido.

É o que diz o artigo 13 da lei estadual 13.296/09:

"Artigo 13 - É isenta do IPVA a propriedade:

(...)

VI - de ônibus ou microônibus empregados exclusivamente no transporte público de passageiros, urbano ou metropolitano, devidamente autorizados pelos órgãos competentes;"

Regulamentando o tema, o Governo do Estado de São Paulo editou o decreto estadual 59.953/13, em seu artigo 4º, II, que dispõe que a isenção do IPVA será concedida também as empresas que exercem a atividade de transporte rodoviário de passageiros sob a modalidade de Fretamento Contínuo1.

"Artigo 4 - A isenção do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA poderá ser concedida, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa em requerimento com o qual o interessado comprove o preenchimento das condições e o cumprimento dos requisitos, nas seguintes hipóteses:

(...)

II - ônibus ou microônibus empregados exclusivamente no transporte público de passageiros, urbano ou metropolitano, devidamente autorizados pelos órgãos competentes, conforme disciplina a ser estabelecida pela Secretaria da Fazenda.

Parágrafo único - A isenção de que trata o inciso II:

(...)

2 - Aplica-se, inclusive:

a) ao transporte escolar e ao transporte coletivo rodoviário de passageiros, sob a modalidade de fretamento contínuo;"

No entanto, ao conceder o benefício acima, o Governo do Estado de São Paulo extrapolou na sua competência regulamentar, criando exigência não prevista na Lei instituidora do benefício fiscal, é o caso da exigência de regularidade fiscal dos veículos da frota para concessão da isenção do IPVA, prevista no artigo 6º, II, "b" do mesmo Decreto Estadual nº 59.953/2013[3].

"Artigo 6º- As isenções previstas nos artigos 4º e 5º:

I - aplicam-se também às hipóteses de arrendamento mercantil e alienação fiduciária em garantia;

II - ficam condicionadas, cumulativamente, a que:

(...)

b) o proprietário do veículo, na data da concessão da isenção, não possua obrigação fiscal vencida e não paga relativa a qualquer veículo de sua propriedade, bem como não esteja incluído no Cadin Estadual, nos termos da Lei 12.799, de 11 de janeiro de 2008."

Dessa forma, ao pleitearem a concessão do benefício, muitos empresários se deparam com uma exigência flagrantemente ilegal do Fisco paulista, qual seja, a de que a existência de qualquer débito fiscal de algum veículo da frota da empresa possa inviabilizar a concessão do benefício para toda a sua frota. Com isso correm para regularizar multas de trânsito que ainda não foram pagas, débitos de IPVA de outros veículos, comprometendo a liquidez da empresa logo no início do ano.

Isso porque, com o indeferimento do IPVA, o valor do imposto vai para a conta fiscal da empresa, para posterior inscrição em dívida, protesto da CDA e a posterior execução fiscal do débito, o que pode culminar na indisponibilidade de bens da empresa, o que além de tormentoso para o empresário, acaba dificultando  ou até inviabilizando novos investimentos na sua atividade logo no início do ano.

Ocorre que, como dissemos, essa exigência de regularidade fiscal para concessão da isenção do IPVA pelo Fisco Estadual é completamente ilegal,uma vez que ao estabelecer a exigência, pela via normativa do Decreto, o Governo do Estado de São Paulo viola o princípio da legalidade, exorbitando na sua função regulamentar, criando obrigação não prevista anteriormente em lei.

Trata-se, portanto, de flagrante violação do art. 5º, II e do art. 84, IV, ambos da Constituição Federal de 1988 por parte do Governo do Estado de São Paulo.

Inclusive, nesse sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo também vem se posicionando favoravelmente aos empresários do setor, afastando a necessidade de regularidade fiscal da frota para concessão da isenção do IPVA, desde que cumpridos os demais requisitos para concessão deste

Como exemplo, podemos destacar a recente decisão, proferida pelo Tribunal de Justiça, em outubro de 2019 que afastou a exigência de regularidade da empresa para concessão do benefício, considerando ilegal a ausência de débitos como critério para concessão da isenção do IPVA:

MANDADO DE SEGURANÇA. IPVA. ISENÇÃO. Exercício do ano 2018. Transporte de Passageiros. Veículos utilizados no transporte coletivo urbano. Isenção nos termos do art. 13, inciso VI, da Lei Estadual nº 13.296/2008. Cabimento. Impetrante que preencheu os requisitos legais, além de já ter obtido isenção em anterior mandado de segurança relativo ao ano de 2017. (...) Isenção nos termos do art. 13, inciso VI, da Lei Estadual nº 13.296/2008. Alegação de que o pedido de isenção está condicionado à ausência de débitos. Não cabimento. Decreto nº 59.953/2013 que extrapolou o limite regulamentador ao estabelecer restrição não prevista em lei. Reconhecimento do direito à isenção que possui efeitos declaratórios, retroagindo à data do preenchimento dos requisitos. Concessão da ordem mantida. Reexame necessário e recurso improvidos. 

(TJSP;  Apelação / Remessa Necessária 1011528-33.2018.8.26.0309)

Portanto, para que seja concedida a isenção do IPVA, basta que a empresa preencha os requisitos legais que são, realização de transporte urbano e metropolitano, sob o regime de fretamento contínuo e a autorização do órgão competente (EMTU, ANTT, ARTESP, etc), de forma que qualquer exigência de regularidade fiscal por parte do Fisco Estadual se mostra completamente ilegal.

Com isso, os empresários do setor que se virem diante dessa situação de exigência de regularidade fiscal por parte do Fisco Paulista para concessão do benefício fiscal (isenção do IPVA da frota), podem pleitear judicialmente que a referida exigência seja desconsiderada e, caso o valor do IPVA já tenha sido pago, pleitear também a devolução dos valores pagos indevidamente, uma vez que o benefício retroage à data da formulação do pedido.

___________

1 Fretamento Contínuo: é aquele contratado para o transporte frequente de pessoas com origem e destino pré-determinados, como transporte de trabalhadores de indústrias, estudantes universitários, entre outros. Os passageiros têm vínculo com a contratante e o motivo das viagens geralmente é trabalho ou estudo (Clique aqui).

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 *Renato Sales dos Santos é advogado. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Especialista em Direito Tributário e Processual Tributário pela Escola Paulista de Direito (EPD).

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