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MP 905/19: Ponto a ponto

Trata-se de legislação muito mais abrangente que o contrato verde-amarelo, mas de qualquer forma, este esboço já pelo menos, sintetizam as principais alterações, que certamente ganharam destaque nos próximos debates, antes mesmo do enfrentamento da matéria pelas Cortes superiores.

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Atualizado às 10:41

Frente à publicação da MP 905/19, e ainda antes de abordar de forma mais profunda os pontos alterados, cabe uma pequena apresentação sobre as principais alterações. Trata-se de legislação muito mais abrangente que o contrato verde-amarelo, mas de qualquer forma, este esboço já pelo menos, sintetizam as principais alterações, que certamente ganharam destaque nos próximos debates, antes mesmo do enfrentamento da matéria pelas Cortes superiores.

1. Contrato verde e amarelo

Como forma de estimular a criação de novos postos de trabalho para jovens entre 18 e 29 anos de idade, em atividades com salário-base mensal de até 1,5 salário-mínimo, a MP 905/19 institui o Contrato Verde Amarelo (algo similar ao que ocorreu em 2003, com o programa Primeiro Emprego).

Trata-se de contrato a prazo determinado de até 24 meses.

A contratação total de trabalhadores na modalidade CVA fica limitada a 20% do total de empregados da empresa, levando-se em consideração a folha de pagamentos do mês corrente de apuração. As empresas com até dez empregados, ficam autorizadas a contratar dois empregados na modalidade Contrato de Trabalho Verde e Amarelo.

O CVA poderá ser utilizado para qualquer tipo de atividade, transitória ou permanente, e para substituição transitória de pessoal permanente.

Para fins da caracterização como primeiro emprego, não serão considerados os seguintes vínculos laborais: I - menor aprendiz; II - contrato de experiência; III - trabalho intermitente; e IV - trabalho avulso. Também não será aplicável a profissões com regulamentação especial.

Nos CVA ficam garantidos todos os direitos trabalhistas constitucionais (art. 7º CF). É permitido ao empregador convencionar o pagamento antecipado do 13º, férias com 1/3 e multa do FGTS 20%. Assim as verbas podem ser quitadas mensalmente, com a remuneração.

A alíquota mensal relativa à contribuição devida para o FGTS, será de 2%. Ficam as empresas isentas da contribuição previdenciária e contribuições do sistema "S".

Na hipótese de extinção do CVA é devida a multa do FGTS de 20%, incidindo inclusive nas justas causas. Se aplica ao CVA a cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão prevista no art. 481 da CLT. Caso seja exercido tal direito por qualquer das partes, aplicam-se os princípios que regem a rescisão dos contratos por prazo indeterminado.

Independente do futuro da MP 905/19, seja sua conversão, seja sua decadência, o CVA estará disponível ao mercado de trabalho apenas contratações até 12/22.

2.    Programa de habilitação e reabilitação física e profissional, prevenção e redução de acidentes de trabalho.

A MP 905/19 institui o Programa e seu Conselho. O Programa visa empreender ações de educação e capacitação para o trabalho, com especial foco à habilitação e reabilitação física e profissional, bem como à prevenção e redução de acidentes do trabalho. Com vinculação orçamentária limitada a cinco anos, seus recursos virão, em especial, de multas e penalidades aplicadas em ACP's, TAC's ou Termos de Cumprimento, sem prejuízo de outras verbas.

3.    Acidente de percurso ou trajeto

Houve a revogação do art. 21, IV, alínea "d" da lei 8.213/91, tem-se assim o fim da equiparação dos acidentes de trajeto a acidentes do trabalho (trabalho - casa - trabalho).1

4.    Armazenamento em meio eletrônico

Fica autorizado o armazenamento, em meio eletrônico, óptico ou equivalente, de quaisquer documentos relativos a deveres e obrigações trabalhistas, incluídos aqueles relativos a normas regulamentadoras de saúde e segurança no trabalho. O empregador é o natural depositário e guardião da documentação trabalhista, devendo exibi-la sempre que solicitado. A mudança traz complemento à MP 881 (Liberdade Econômica), no sentido de autorizar que tal guarda se dê em suporte eletrônico. O novo suporte, aliado ao e-Social e a e-CTPS permitirá a "fiscalização remota".t

5.    Anotações na carteira de trabalho e Previdência Social 

Na hipótese de ser reconhecida a existência da relação de emprego, o juiz do Trabalho comunicará o Ministério da Economia para que proceda ao lançamento das anotações, por sistema eletrônico, que ainda será desenvolvido, e adote as providências necessárias para a aplicação da multa cabível.

6.    Atualização do valor das multas

Todas as multas administrativas por infrações à legislação de proteção ao trabalho foram atualizadas e observarão os critérios estabelecidos pelo art. 634-A (leve, média, grave e gravíssima).

7.    Trabalho aos domingos

A MP 905/19 tenta pôr fim ao debate travado durante a tramitação da MP da liberdade econômica, alterando a CLT, a lei 605/49, a lei 10.101/00 e a lei 4.178/62, para autorizar o trabalho em domingos e feriados. Também estabelece que o repouso semanal remunerado (RSR) de 24hs consecutivas deverá coincidir com o domingo a cada 4 semanas nos setores de serviços e comércio (que ainda observará a legislação local) e, na indústria, a cada 7 semanas.

8.    Bancários

A MP 905/19 altera o art. 224 da CLT, estabelecendo que a duração normal do trabalho dos empregados em bancos, em casas bancárias e na Caixa Econômica Federal, para aqueles que operam exclusivamente no caixa, será de até seis horas diárias, perfazendo um total de trinta horas de trabalho por semana, podendo ser pactuada jornada superior, a qualquer tempo, nos termos do disposto no art. 58 desta Consolidação, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, hipóteses em que não se aplicará o disposto no § 2º do art. 224. Para os demais empregados em bancos, em casas bancárias e na Caixa Econômica Federal, a jornada somente será considerada extraordinária após a oitava hora trabalhada. 

Na hipótese de decisão judicial que afaste o enquadramento de empregado na exceção prevista no § 2º art. 224, o valor devido relativo a horas extras e reflexos será integralmente deduzido ou compensado no valor da gratificação de função e reflexos pagos ao empregado.

9.    Alimentação

A MP 905/19 altera o art. 457 da CLT para esclarecer que o fornecimento de alimentação ao trabalhador, seja por tickets, vales, cartões ou outros meios viabilizadores da aquisição das refeições ou gêneros alimentícios não terá natureza salarial, mesmo que o empregador não esteja inscrito no PAT. No mesmo sentido, retira o termo "alimentação" do rol das verbas que se constituem em salário in natura (art. 458) quando entregues diretamente pelo empregador, fechando o sistema interpretativo.

10.Juros em débitos trabalhistas

A MP 905/19 modificou substancialmente a sistemática de apuração de juros e de correção monetária de débitos trabalhistas, alterando o artigo 39, da lei 8.177/91 e 883, da CLT.

Instituiu-se que os juros de mora serão equivalentes aos utilizados nas cadernetas de poupança, aplicados desde o mês seguinte ao do seu inadimplemento e até o seu efetivo pagamento. Quanto à correção monetária, a MP 905/19 alterou o art. 879 § 7º da CLT para estabelecer que o IPCA-E é aplicável na atualização dos débitos trabalhistas.

Da leitura conjunta dos três dispositivos legais, após a edição da MP, extrai-se as seguintes conclusões:

a) os débitos trabalhistas devem ser corrigidos pelo índice aplicado à caderneta de poupança (artigo 39, caput, da lei 8.177/91) até que sobrevenha condenação judicial, quando, então, passará a incidir o IPCA-E (ou outro índice que venha a substituí-lo, calculado pelo IBGE, o qual será aplicável até o cumprimento da sentença (artigo 879, §7º, da CLT);

b) os juros de mora, sempre incidentes a partir do ajuizamento da ação, devem ser equivalentes ao índice aplicado à caderneta de poupança, pro rata die (artigos 883 da CLT e 39, §1º, da lei 8.177/91).

11.Participação nos lucros e prêmios

Visando restaurar a segurança jurídica sobre as alterações trazidas pela lei 13.467/17, e afastar os óbices criados pela Receita Federal, a MP 905/19 altera a Lei que dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados (lei 10.101/00).

No que tange a Participação nos lucros e prêmios: houve alteração na lei 10.101/00 para; (i) estabelecer a desnecessidade de negociação via/com a presença do ente sindical, (ii) admitir a negociação de PLR diretamente com o empregado hipersuficiente; (iii) permitir a deflagração de diversas e simultâneas vias de negociação, (iv) mais de um PLR no âmbito da empresa, (v) prevalência da autonomia da vontade dos contratantes em face dos interesses de terceiros, (vi) estabelecer prazos (inclusive presumidos) para o estabelecimento das condições de participação, (vii) permitir que entidades sem fim lucrativos distribuam "resultados".

No que tange aos Prêmios: o texto reforça a tese de que o prêmio é verba de natureza jurídica indenizatória que premia o desempenho excepcional e/ou extraordinário de um empregado. Contudo, a norma traz restrições à periodicidade do pagamento, estabelecendo o critério de no máximo 1x por trimestre e 4 x ao ano. Isto impacta diretamente empresas que vinham realizando pagamentos mensais de prêmios.

12.Vigência e Aplicação

A MP 905/19 trouxe uma pequena modulação quando aos seus efeitos, assim, entra em vigor em:

(i) 10 de fevereiro de 2020, para Penalidades e multas, embargos e interdições;

(ii) 1º de março de 2020, para Contribuições previdenciárias sobre o seguro desemprego;

(iii) 1º de janeiro de 2020, para Extinção da contribuição social adicional do FGTS (10%);

(iv) Na data de sua publicação, quanto aos demais dispositivos.

(v) Ainda, observar que algumas questões dependem de atestado de compatibilidade com a LDO e outras normas regentes das finanças públicas e sistemas para produzirem seus efeitos.

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1 - Frisa-se que o chamado acidente de percurso ou acidente de trajeto, era considerado acidente de trabalho somente para permitir que o trabalhador tenha acesso ao benefício previdenciário, Ou seja, tratava-se de uma ficção jurídica, que por consequência não gera efeitos na esfera de responsabilidade civil do empregador, exceto se comprovado que este concorreu para a sua ocorrência.

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*Kleber Correa da Silveira é analista jurídico no escritório Andrade Maia Advogados. Membro-pesquisador do Grupo de Pesquisa - O Direito do Trabalho e Mundo Contemporâneo da UFRGS cadastrado junto ao CNPq. Membro da RENAPEDTS - Rede Nacional de Pesquisa em Direito do Trabalho e Previdência Social.

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