Contrato de trabalho intermitente: panorama após dois anos da reforma trabalhista
As alterações legislativas demandam maior tempo para adequação, caberia ao Judiciário compreender o cenário econômico do país, principalmente a modernização das relações de trabalho, e reconhecer a validade dos novos modelos de contrato de trabalho, sempre que aplicados de forma correta pelos empregadores.
quarta-feira, 4 de dezembro de 2019
Atualizado às 11:07
Passados dois anos da vigência da lei 13.467/17 (reforma trabalhista), é salutar analisar se algumas das alterações nela propostas, mesmo que consideradas polêmicas por alguns, apresentaram algum resultado.
Sob este viés, aponta-se como exemplo o contrato de trabalho intermitente, que permite a prestação de serviços com alternância de períodos de atividade e inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador (exceto para os aeronautas, que são regidos por legislação própria), e no qual o período de inatividade do empregado não é considerado como tempo à disposição do empregador.
Esta modalidade de contrato vem encontrando resistência principalmente por parte de entidades sindicais, que buscam no STF a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos que introduziram o contrato de trabalho intermitente na legislação trabalhista.
A ADIn 6154, por exemplo, movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria - CNTI, contesta a referida modalidade de contrato sob o argumento de ter sido concebido ''para a precarização dos meios de contratação de trabalhadores com intento estatístico de propagandear um falso incremento do emprego no Brasil''.
Enquanto o STF não realiza o julgamento desta e de outras ADIns que tratam sobre o tema, recente decisão proferida pela 4ª Turma do TST, nos autos do AIRR 10454-06.2018.5.03.0097, foi no sentido de declarar válida a contratação de um empregado sob a modalidade do regime intermitente, uma vez que, no caso concreto examinado, foram observados, pelo empregador, todos os ditames da Lei.
Ressaltaram os ministros que o contrato de trabalho intermitente não gera precarização dos direitos do trabalhador, mas sim segurança jurídica aos empregadores e trabalhadores, bem como estimula a criação de novos postos de trabalho, além de garantir direitos básicos a determinada parcela de trabalhadores que se encontravam na informalidade, sem as garantias dos direitos fundamentais trabalhistas.
De fato, a ''flexibilidade'' criada pelo legislador, possibilitando a alternância entre os períodos de atividade e inatividade na prestação de serviços, não deve ser entendida como supressão de direitos trabalhistas.
Pelo contrário, na nova modalidade de contratação é assegurado ao empregado o pagamento de verbas características de um contrato de trabalho comum como, por exemplo, repouso semanal remunerado, férias e décimo terceiro salário proporcionais, recolhimentos previdenciários e fundiários.
Além disso, a legislação garante ao contratado uma remuneração mínima proporcional ao período de prestação de serviços, quando determina que o valor da hora de trabalho não pode ser inferior ao valor hora do salário mínimo ou daquele salário devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em uma relação de contrato de trabalho comum.
A maior diferença entre o contrato intermitente e um contrato de emprego comum é que, no primeiro, o empregado será remunerado tão somente pelo tempo despendido em favor do empregador e no período de inatividade poderá buscar outras atividades remuneradas.
Na prática, o que se vê é que, de acordo com os dados do CAGED1 divulgados em outubro de 2019, somente no acumulado do ano de 2019, o país gerou cerca de 761.766 empregos formais, número que confirmou o crescimento já observado no ano de 2018, que no mesmo período indicava o surgimento de novos 719.089 empregos.
Dentre o aglomerado de novos empregos formais, o trabalho intermitente foi responsável por cerca de 115 mil vagas. Destaca-se que desde a vigência da reforma trabalhista, o saldo de vagas geradas pelos contratos intermitentes não teve sequer um mês negativo. Em 2017 (novembro e dezembro), o saldo foi de 6.029 vagas. Já em 2018, o trabalho intermitente apresentou um saldo de 51.178 empregos e no ano de 2019, até o mês de setembro, o saldo foi de 58.080 novos empregos.
Portanto, a despeito de críticas que são lançadas, é certo que o contrato de trabalho intermitente constitui uma das ferramentas que podem contribuir com o desafogo econômico, gerando novos postos de trabalho e assegurando direitos aos trabalhadores que viviam na informalidade.
Não há dúvida de que é possível manter o princípio da proteção ao trabalhador e ao mesmo tempo buscar alternativas que estejam em consonância com o tempo atual, cuja dinâmica e velocidade de transformação nas relações precisam ser acompanhadas pela legislação e pelo Judiciário.
Tendo em vista que as alterações legislativas demandam maior tempo para adequação, caberia ao Judiciário compreender o cenário econômico do País, principalmente a modernização das relações de trabalho, e reconhecer a validade dos novos modelos de contrato de trabalho, sempre que aplicados de forma correta pelos empregadores, o que certamente já a médio prazo promoverá um ciclo virtuoso na economia e no mercado de emprego.
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*Carime Abreu Sader Junior é advogado de Trigueiro Fontes Advogados em São Paulo.