O Transtorno do Espectro Autista e os planos de saúde
Contar com uma assessoria jurídica especializada é fundamental, pois mesmo com a legislação vigente, há casos em que os planos negam cobertura e ou restringem a mesma.
quinta-feira, 7 de novembro de 2019
Atualizado às 11:39
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento no qual o indivíduo apresenta dificuldade na comunicação social e mantém um interesse restrito e estereotipado. O diagnóstico é clínico e o tratamento requer acompanhamento multidisciplinar, psicólogo, psicopedagogo, terapeuta ocupacional etc, por período indeterminado. Assim, muitas são as dúvidas e os conflitos relacionados ao TEA e aos planos de saúde.
Quando se trata da questão que concerne à cobertura dos planos de saúde e o entendimento jurisprudencial sobre o tema, o consenso é de que os planos não podem negar ou limitar atendimentos e tratamentos prescritos por especialistas.
A lei 12.764/12, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos de Pessoa com TEA, prevê a obrigatoriedade do fornecimento do atendimento multidisciplinar à pessoa com autismo.
Contudo, na prática, essa determinação nem sempre é cumprida. Além da negativa na contratação, há outras situações de desrespeito à legislação envolvendo TEA e planos de saúde.
Uma das questões que geram conflitos é a limitação do número de sessões de terapia - a priori, deve ser seguida a determinação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ou ser solicitada, adequadamente, alteração, em casos em que seja necessário um número maior que o previsto.
Porém, há situações em que o contrato do plano de saúde apresenta uma cláusula diferenciada sobre esse ponto. Fique atento!
A metodologia do atendimento e a quantidade de sessões devem ser prescritas e indicadas pelo médico. Assim, não cabe aos planos de saúde interferirem nesse tipo de procedimento, haja vista caracterizar descumprimento do objeto contratual, que é a saúde do segurado. Quem determina a quantidade e tipo de sessões com cada profissional é o médico, não o plano de saúde.
Um aspecto fundamental quando se trata de TEA e planos de saúde é estar ciente de que o tratamento e acompanhamento não têm um padrão de terapia. Dos pontos de vista clínico e jurídico, essa clareza é crucial.
Ademais, cada paciente responderá ao tratamento de uma forma, ou seja, os resultados são variáveis de um caso para outro, tanto que é utilizada a terminologia "espectro".
O autista pode apresentar características como dificuldade no contato visual ou na realização de gestos e de expressões faciais, bem como dificuldade para entender emoções ou sentimentos.
Por isso, situações comuns para outras pessoas como fazer amizade, conversar, brincar, se tornam difíceis para ele.
Movimentos repetitivos no corpo ou na fala, extrema angústia com mínimas alterações na rotina, hiper ou hipo reação a estímulos do ambiente, sensibilidade a barulhos, também estão entre as características da pessoa com TEA.
Pesquisas apontam que intervenções baseadas no método ABA (Análise do Comportamento Aplicada, do inglês Applied Behavior Analysis), resultam em evolução significativa, com redução dos déficits.
Por meio do método, é feita uma avaliação do paciente e proposta uma intervenção individual, com foco no trabalho voltado aos déficits e aos excessos do autista.
Desde o recebimento do diagnóstico pela família, é importante que ela tenha acesso a às informações e aos serviços essenciais, conforme as necessidades individuais do paciente.
As intervenções multidisciplinares são necessárias desde o diagnóstico, para que o indivíduo no TEA se desenvolva. Muitas vezes, recomenda-se uma série de serviços integrados que ultrapassam a área da saúde, englobando educação, esportes etc.
Há casos em que são necessários medicamentos e tratamentos mais complexos. Mas, é possível minimizar as dificuldades de comunicação e comportamento social, melhorando, dessa maneira, a qualidade de vida do autista, bem como estimulando sua autonomia.
No entanto, não cabe ao plano de saúde determinar ou impor um padrão de tratamento ou, ainda, restringir a prescrição do especialista.
Mas, você sabe o que fazer quando a legislação não é cumprida, pelos planos de saúde, no contexto do TEA em casos de TEA e planos de saúde? No caso de negativas ou restrições do plano, a orientação é ingressar com ação judicial para obter seus direitos.
Ambas as situações, negativa ou restrição de tratamento pelos planos de saúde, constituem condutas abusivas e ilegais, que comprometem, ainda mais, o quadro do indivíduo no TEA.
É comum o pedido de tutela provisória antecipada, no momento de abertura da ação. Inclusive, a Justiça prevê multa diária para a operadora de plano de saúde que descumprir a decisão.
Esse tipo de pedido, quando deferido pelo Poder Judiciário, garante ao paciente com TEA o tratamento imediato, sem necessidade de aguardar o fim do julgamento. A jurisprudência aponta para decisões em favor dos pacientes.
Outras possibilidades, de acordo com cada caso, são a solicitação, ao plano de saúde, de reembolso por procedimentos pagos ou, ainda, ação de danos morais e materiais.
Vale lembrar que os planos e seguros de saúde estão sujeitos ao CDC. Assim, mesmo que o contrato seja de adesão, deverá sempre ser benéfico ao usuário. Excluir o tratamento adequado e ou limitá-lo pode ser considerado uma afronta ao Princípio da Função Social do Contrato, ferindo assim a dignidade da pessoa, entre outros princípios e direitos.
Contar com uma assessoria jurídica especializada é fundamental, pois mesmo com a legislação vigente, há casos em que os planos negam cobertura e ou restringem a mesma. É importante ter o respaldo de profissionais que tenham conhecimento aprofundado da legislação e ter em mente que, mesmo que o plano apresente cláusulas de restrição no contrato, não é permitido que o convênio limite o atendimento ou a cobertura das terapias e procedimentos indicados pelo médico. Faça sempre valer os seus direitos.
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*Juliana Cafezeiro é advogada do Badaró Almeida & Advogados Associados. É especializanda em Inclusão e Direitos da Pessoa Com Deficiência pelo CBI of Miami. Membro da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas Com Deficiência da OAB/BA. Atua nas áreas do Direito de Saúde, Inclusão e Proteção à Pessoa Com Deficiência e Neurodiversidade.