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Responsabilidade por ato do administrador

Elaboramos este artigo, com o intuito de esclarecer as principais dúvidas de um empreendedor ou representante legal de uma empresa.

terça-feira, 29 de outubro de 2019

Atualizado às 10:57

Infração ética

Há uma diferença bastante importante sobre uma infração ética e uma legal. As normas de ética, quando infringidas, recebem em geral, uma pena menor. Digo em geral porque, p.ex. pode ocorrer uma multa na esfera ética, seja maior que na esfera penal. Ex. Excesso de velocidade dentro de um condomínio, pode gerar, em tese, uma multa maior do que se o excesso tivesse sido praticado na via pública. Na esfera ética, o que ocorre é que, estando o sujeito inserido em um determinado grupo social, este grupo, por determinação de seus estatutos, possui seus próprios códigos de conduta. Assim, os médicos, os engenheiros, o clube de campo, e até os edifícios, têm seus próprios códigos de ética. Portanto, a infração ética poderá ocorrer, sem necessariamente, haver infração de norma legal, por exemplo, um determinado edifício pode consentir a presença de animais e outro não.  O importante é sabermos que, a maior pena por infração ética, além da multa, será a exclusão do sujeito daquele determinado meio, ou seja, o pior que o indivíduo pode sofrer, além da eventual multa, será a exclusão daquele ambiente composto por aquela determinada comunidade.

Infração legal

Uma infração legal, por sua vez, ocorre quando um sujeito transgrida uma norma emanada pelo poder público, ou seja, uma lei ou o próprio Código Penal que afinal não deixa de ser uma lei, tal infração, diferentemente da infração ética, pode gerar além de multas, bloqueio de bens inclusive ativos financeiros, podendo chegar até, a uma pena privativa de liberdade. É interessante notar que a lei, de um modo geral, não proíbe que se cometa determinada infração. Ex., o art. 121 do Código Penal, determina:  art. 121 - Matar alguém. - Pena de seis a 20 anos.

Logo, o que existe é uma punição a quem matar alguém. A par disto, o que vai determinar a absolvição ou o tempo de prisão, será a avaliação da culpa do indivíduo, que poderá ser agravada ou atenuada, dependendo da intenção dele, na hora do cometimento do ilícito. Vejamos algumas hipóteses de agravantes: o crime ter sido cometido mediante paga; emprego de veneno, fogo, explosivo ou ainda ter sido cometido mediante emboscada. Vejamos algumas hipóteses de atenuantes: o indivíduo age por motivo de relevante valor social, se tomado por violenta emoção, isto ocorrendo, o juiz poderá diminuir a pena em até um sexto. A par disto, a figura das descriminantes. Ou seja, a conduta deixa de ser considerada criminosa.  Exemplo disto seria a legítima defesa - em sendo agredido, ou supondo que o seja, mata alguém usando apenas de força suficiente para conter a agressão.

Já no direito romano existe a distinção nestes dois tipos básicos de culpa:

Crime doloso

É o caso da culpa "lato sensu", é bastante simples de se definir. Ela ocorre quando o resultado do ato, foi desejado pelo autor da ação. É, por exemplo, quando uma pessoa, intencionalmente, dispara arma de fogo objetivando atingir alguém, outro exemplo seria uma empresa, deliberadamente, despeja dejetos tóxicos em ribeirão que abastece uma cidade. Vale ressaltar que, para os crimes contra a vida, em ocorrendo o dolo, o julgamento será feito pelo Tribunal do Júri, objetivando com isto, a que o indivíduo seja julgado por seus iguais, mais precisamente pelos jurados, que são pessoa previamente escolhidas por meio de sorteio, para o veredito se o mesmo foi culpado ou inocente.

Crime culposo

É o caso da culpa "strictu sensu", ela ocorre sempre que o sujeito, sem desejar o resultado, age com: a) negligência - Ocorre quando o sujeito gera o resultado danoso, por não ter tomado as providências necessárias a que o dano ocorresse. Ex. Andar com o carro sem freios b) imprudência - Ocorre quando o sujeito age de modo a favorecer o dano. Ex. Excesso de velocidade. ou c) imperícia.   Ocorre quando o sujeito não detém a habilitação legal à prática de determinado ato. Ex. Assinar um balanço sem inscrição no CRC.

Infração civil

A base de toda a culpa na esfera cível, se encerra no art. 168 do CC: "Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."

Com a evolução do direito e o aperfeiçoamento da sociedade e objetivando melhor atingir o bem comum, surgiu também a modalidade da culpa "objetiva", que nada mais é, do que a decorrente da relação pessoal do sujeito com o dano. A obrigação de reparação do dano, é proveniente do exercício de uma determinada atividade econômica, decorre, pois, do proveito econômico auferido por este alguém, que pode até não ter concorrido pessoalmente com o dano.

Assim, quanto ao causador do dano, não discutirá sua culpabilidade, ou seja, se é ou não responsável diretamente pelo ocorrido. É o caso do patrão que paga os prejuízos de acidente de trânsito, no qual seu empregado dirigia o veículo. Ou quando uma mineradora tem que despoluir um lago, por conta dos rompimentos de uma barragem, por negligência do operador da esteira, que, por negligência, rompeu o muro de contensão.

Vale ressaltar que, a chamada responsabilidade objetiva, no Brasil, foi finalmente acatada, de vez, quando fez consignar no parágrafo único do artigo 927 do atual Código Civil: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Aliás importante ressaltar, também, que o direito passou a imputar fatos criminosos as empresas, coisa impossível de ocorrer até pouco tempo. Nesta trilha, ressalte-se que a própria Organização das Nações Unidas, em seu VI Congresso para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente, reunido em Nova York, em 1979, quando analisa o tema do delito e do abuso do poder, recomenda o estabelecimento do princípio da responsabilidade penal das sociedades. Isto significa que qualquer sociedade ou ente coletivo, privada ou estatal, será responsável pelas ações delitivas ou danosas, sem prejuízo da responsabilidade individual de seus diretores. Mais recentemente, no XV Congresso Internacional de Direito Penal, realizado em setembro de 1994, no Rio de Janeiro, a comunidade jurídica internacional aprovou, por ampla maioria de votos, algumas recomendações concernentes aos delitos cometidos contra o meio ambiente, reconhecendo a responsabilidade criminal das empresas.

Fato que merece destaque, a essa altura, e que também tem origem da legislação Norte Americana, e hoje plenamente incorporada a nosso direito, é a teoria do "desregard of legal entitity", por onde, constatada a utilização de interposta pessoa jurídica para a prática de ato ilícito, o juiz poderá esquecer a personalidade jurídica da empresa, para atuar diretamente contra os dirigentes ou proprietários da empresa. Com certeza este será o atalho para que um terceiro prejudicado, ente público ou particular possa atingir os executivos de uma determinada corporação.

No Brasil, antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, já havia algumas leis neste sentido, embora à época, contrariando o princípio societas delinquere non potest. Com a promulgação da referida Constituição, consagrou-se a imputabilidade penal das pessoas jurídicas na esfera das lesões ao meio ambiente, bem como nos crimes contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular. Após longa tramitação legislativa, portanto, foi publicada, em 13 de fevereiro de 1998, a lei 9.605 (lei de crimes ambientais), que adotou a responsabilidade penal objetiva para as pessoas jurídicas.

Tendo em vista a vasta gamas de leis e normas que possam ser objeto de "infração", estendidas por força da "solidariedade legal" aos administradores das sociedades, e, consequentemente, podendo gerar a estes, multas, bloqueio de bens, ordens de prisão, etc.

Vejamos alguns exemplos de condutas delituosas, por vezes desconhecidas dos empregados e administradores, que podem trazer várias consequências indesejáveis:

Código penal

Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena. - Detenção de três meses...

Art. 177- Promover a fundação de sociedade por ações, fazendo em prospecto ou em comunicação ao público ou à assembleia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando fraudulentamente fato a ela relativo.

Art. 199. - Constranger alguém a participar ou deixar de participar de sindicato.

Art. 203 - Frustrar mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho. Pena Reclusão de 1 a 2 anos.

Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo à praticar ou omitir ou retardar ato de ofício. - Pena Reclusão de 2 a 12 anos.

Art. 334 - Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria - Pena Reclusão de 1 a 4 anos.

Art. 337 - Subtrair ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado a custódia de funcionário, em razão de ofício, ou de particular em serviço público. Pena Reclusão de 2 a 5 anos.

Art. 337- Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante: - ...I - omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações; deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa...; III - Omitir ... Recitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais....Pena: 2 a 5 anos.

Meio ambiente - lei 9605/98

Trata de crimes praticados contra a fauna, flora e meio ambiente. A responsabilidade, pela prática dos delitos contra a ordem ambiental, ordem econômica ou tributária é idêntica à do direito penal comum, já é bastante antiga. O legislador, neste caso, apenas deu especial destaque ao crime cometido através da pessoa jurídica, que é a regra tratando-se de delitos fiscais.

Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsáveis administrativa, civil e penalmente, conforme disposto nesta lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse da sociedade.

Par. Único - A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas...

Art. 54 - Causar poluição de qualquer natureza em níveis que resultem ou possam resultar em danos a saúde humana, ou que provoquem mortandade de animais ... Pena Reclusão de uma a quatro anos.

Crimes tributários - lei 8137/90

Art. 1º...

I - Omitir informação, ou prestar declaração falsa as autoridades fazendárias;

II - Fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal

III - Falsificar ou adulterar nota fiscal, fatura, duplicata

IV - Elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber ser falso ou inexato

V- Negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relati a venda de mercadoria ou prestação de serviço...

Código tributário nacional

Art. 134 - Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

...

III - os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes;

VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.

Contra ordem econômica - lei 8884/94

Art. 17 - Serão solidariamente responsáveis as empresas ou entidades integrantes de grupo econômico, de fato ou de direito, que praticarem infração da ordem econômica.

Art. 23 - A prática de infração de ordem econômica sujeita os responsáveis as seguintes penas:

...

II - no caso de administrador, dieta ou indiretamente responsável pela infração cometida por empresa, multa de dez a cinquenta por cento do valor daquele aplicável a empresa, de responsabilidade pessoal e exclusiva ao administrador

IBGC - Instituto Brasileiro de Governança Corporativa

No Brasil, buscando os ideais de melhores práticas de governança corporativa, o IBGC, criou um código de conduta, focado em quatro princípios básicos: transparência; equidade; prestação de contas (ACCONTABILITY) e, responsabilidade corporativa.

Transparência - O pronto desejo de informar, resulta num clima de confiança, tanto internamente, quanto nas relações com terceiros.

Equidade - caracteriza-se pelo tratamento justo e igualitário de todos os grupos minoritários, sejam do capital ou das demais "partes interessadas" (stakeholders), como colaboradores, clientes, fornecedores ou credores. Atitudes discriminatórias são inaceitáveis.

Prestação de Contras - Os agentes da governança corporativa devem prestar contas de sua atuação a quem os elegeu e respondem integralmente por todos os atos que praticam no exercício de seus mandatos.

Responsabilidade Corporativa - Conselheiros e executivos devem zelar pela perenidade das organizações (visão de longo prazo, sustentabilidade) e, portanto, devem incorporar considerações de ordem social e ambiental na definição dos negócios e operação.  

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*Osvaldo Correa de Araújo é sócio diretor do CASC - Correa de Araújo, Sant'anna & Cescon Advogados Associados.

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