Os ditames da lei 13.874/19 frente às teorias da asserção e da aparência nos casos de discussão contratual
Vê-se que aquele que quiser alterar o contrato atrai todo o ônus probandi, devendo ser demonstrado com robusteza de provas os motivos e motivações causadoras da alteração dos instrumentos.
segunda-feira, 7 de outubro de 2019
Atualizado às 12:20
Atualmente não é incomum ver em julgados a aplicação da teoria da asserção ou mesmo da teoria da aparência, principalmente quando se versa sobre empresas que fazem parte de um mesmo grupo econômico.
Em uma breve análise crítica, vejo as duas teorias como uma forma de se mitigar/mascarar uma possível falta de condição da ação e/ou até mesmo de legitimar ilegítimos, ignorando por vezes a técnica processual e até mesmo a personalidade distinta das pessoas jurídicas que figuram nos polos das ações.
Nota-se que a nova legislação que versa sobre a liberdade econômica (lei 13.874/19) trouxe uma maior proteção a essas empresas, deixando claro a sua autonomia econômica e até mesmo afastando a possibilidade de confusão entre as personalidades jurídicas.
Com o advento do art. 49-A, o CC esclarece de vez que a personalidade da pessoa jurídica não se confunde com a dos seus sócios, associados, instituidores ou administradores, assim como seu parágrafo único, onde reforça a personalidade própria da pessoa jurídica, trazendo à baila a sua autonomia patrimonial.
Ou seja, por mais que as pessoas jurídicas façam parte de um mesmo grupo econômico, estas não se confundem entre si, vez que muitas das vezes possuem atividades distintas.
Ademais, o art. 50 em seu novo texto também esclarece que a mera existência de grupo econômico não é suficiente para autorizar a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, trazendo maior segurança às empresas que os integram.
Pessoas jurídicas possuem personalidade própria e autonomia, as quais possuem CNPJ's distintos, de modo que em hipótese alguma se confundem, mesmo se tratando de empresas de um mesmo grupo econômico.
Nesse caso, se a nova lei traz essa proteção, se preocupando em distingui-las, a fim de que não se caracterize uma possível confusão, por que seria ainda possível a aplicação da teoria da aparência ou da asserção quando se houver uma discussão contratual?
EIRELI's ou Empresas Limitas com apenas um sócio, continuam se tratando de pessoas jurídicas, de forma que suas personalidades não se confundem com as dos seus sócios.
Deste modo, entende-se que, quando houverem contrato entre pessoas jurídicas, sem ausência de qualquer vulnerabilidade presumida, não haverá mais que se falar que as empresas se confundem aos olhos de quem as vê de fora. Afastando, assim, a aplicação da teoria da asserção e da aparência.
Não faz muito tempo que advoguei em um caso que versava sobre rescisão contratual e no polo passivo figurava empresa diversa daquela que constava no contrato, contudo, se tratava de pessoal jurídica pertencente ao mesmo grupo econômico. A atividade da empresa contratante era totalmente diversa daquela que figurava na ação. E, para minha surpresa, foi aplicada a teoria da asserção e a da aparência, sendo legitimado um polo passivo ilegítimo. Se tratavam de pessoas jurídicas diversas e com patrimônio diverso. Qual é a lógica?
As pessoas jurídicas alheias aquelas legitimadas, por fazerem parte de um mesmo grupo econômico, podem sofrer intervenções externas por meios de teorias mal aplicadas, de forma que mexa inclusive com seu caixa?
Onde está a autonomia? A legitimidade deve ser respeitada, assim como o nexo causal, causa de pedir próxima e remota.
Tais teorias podem servir como artimanhas para se legitimar uma possível desconsideração da personalidade jurídica no início de uma demanda judicial. Bastaria o demandante entender que tal empresa do mesmo grupo tenha um maior capital, independente da sua atividade.
Não obstante, outra alteração trazida, é que os contratos presumir-se-ão paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, bem como ficou claro que a intervenção externa do Estado, assim com a revisão do contrato deve se tratar de algo excepcional, principalmente nas relações contratuais privadas.
Nesse sentido, vê-se que aquele que quiser alterar o contrato atrai todo o ônus probandi, devendo ser demonstrado com robusteza de provas os motivos e motivações causadoras da alteração dos instrumentos.
Por fim, nota-se que com a nova lei, quando um instrumento contratual for entabulado entre partes capazes, tratando-se de pessoas jurídicas, ou seja, contrato paritário, inexistindo qualquer parte vulnerável ou hipossuficiente, deve ser respeitada a autonomia e personalidade jurídica própria das empresas, independente de fazer parte ou não grupo econômico, sendo, nesse sentido, inaplicáveis as teorias da asserção e da aparência.
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*Daniel Masello Monteiro é advogado associado na MoselloLima Advocacia.