Os três anos da vigência do novo CPC: novos mecanismos e institutos processuais trazidos pela lei
Por serem mudanças normativas recentes, na prática, observa-se ainda pouca utilização dos novos mecanismos e institutos, e como consequência, poucos temas foram apreciados pelos Tribunais de Justiça e Tribunais Superiores.
quinta-feira, 12 de setembro de 2019
Atualizado às 11:18
O novo CPC, instituído pela lei 13.105/15, entrou em vigor em 18 de março de 2016. O referido código trouxe significativas inovações, sobretudo, novos mecanismos processuais e institutos processuais. Ultrapassado um pouco mais de três anos da sua entrada em vigor, o que se observa na prática é certa timidez dos operadores do direito em utilizar as novidades trazidas pelo legislador, que em determinados pontos alteram a dinâmica do processo civil.
Importante destacar que o novo CPC está totalmente alinhado ao CC de 2002, que dentre suas alterações destacam-se a introdução de princípios nas relações civis. O mesmo ocorre com o CPC de 2015, na medida em que seu artigo 1º, deixou claro que os princípios constitucionais passam a integrar o sistema processual civil. Vale dizer que em ambos os Códigos os princípios foram positivados e ambas as legislações estão alinhadas. Como exemplo, podemos citar o princípio da boa-fé, que norteia tanto o CC, como também irá guiar a dinâmica processual, através do princípio da boa-fé processual, embora utilizado de maneira irrestrita, demonstra a força normativa dos princípios dentro da esfera do próprio direito privado.
Uma das mudanças mais significativas do novo sistema processual é com relação às tutelas provisórias e a extinção das ações cautelares. Na nova lei processual as tutelas provisórias são divididas em tutela de urgência e tutela de evidência, sendo essa última uma novidade trazida pela lei 13.105/15.
Ocorre que na prática, observa-se que tais institutos e procedimentos não são utilizados de maneira correta, por vezes, o que se observa é o mesmo procedimento do antigo Código de Processo, mas com a roupagem estabelecida pelo novo CPC, sem no entanto, os operados do direito observarem a nova forma, ou seja, o novo procedimento estabelecido pela lei. Embora o legislador tenha retirado as cautelares, continua-se utilizando os instrumentos processuais do Código de 1973, como ocorre nas ações de exibição de documentos, sustação de protesto, cautelares extintas, mas que são ajuizadas diariamente e vem sido admitidas pelos julgadores, que tentam encaixá-la no novo modelo trazido pelo CPC de 2015, mas que não se mostra a melhor forma.
Outra mudança importante, que também pouco se verifica na prática diária, é com relação a inversão do ônus da prova. Há que se destacar que diante das mudanças do sistema processual, é necessário harmonizar a interpretação e a aplicação do artigo 6º do CDC com o artigo 373 do novo CPC. Isso porque no CPC de 2015 permite-se a distribuição do ônus da prova, ou seja, a inversão não é regra absoluta, na nova dinâmica, tem-se a distribuição da carga probatória e não mais aplicar de forma ampla a inversão do ônus da prova em vista da hipossuficiência e verossimilhança das alegações.
Novamente, o que se observa no dia-dia, sobretudo, nas ações do denominado contencioso de massa, é que os juízes continuam aplicando de forma ampla e irrestrita a inversão do ônus da prova, sem levar em consideração o novo mecanismo adotado pelo legislador de 2015. Por isso, revela-se fundamental o papel do advogado, diante do caso concreto demonstrar a mudança trazida pela lei para que o julgador até mesmo reveja o seu posicionamento. Evidente, que toda a mudança implica em um trabalho gradual, mas é nesse ponto que o advogado assume relevante papel no sentido da lei ser corretamente observada e aplicada pelo magistrado.
Assim como a inversão do ônus da prova, o CPC de 2015 trouxe o denominado negócio jurídico processual, instituto mal utilizado e que ainda não tem sequer discussão nos tribunais a seu respeito e também pouco estudado pela doutrina. É um instituto bastante amplo e faltam parâmetros específicos na lei e talvez por essa razão não seja tão utilizado. Ressalta-se que no CPC de 1973 já convivia-se com os denominados negócios processuais típicos, como por exemplo, o foro de eleição, cláusula de convenção arbitral, suspensão do feito pela vontade das partes.
Ainda no que tange o negócio processual, o CPC de 2015 trouxe uma novidade em seu artigo 190. Trata-se de uma cláusula geral no sentido de que a vontade das partes é fonte do direito. Ressalta-se que o negócio processual pode ser estabelecido antes do processo ou no curso do processo e assim como o negócio jurídico material, também tem regras gerais e específicas. O que se discute é a sua forma, na medida em que o legislador não a especificou na lei, o que geram dúvidas e receio em utilizar o instituto nos moldes estabelecidos pelo novo CPC.
Outra relevante mudança trazida pelo novo Código Processual, é com relação às tutelas provisórias. Dentro da nova dinâmica, as tutelas estão divididas em: tutela de urgência, que visam neutralizar os efeitos gerados por situação de perigo; e tutela de evidência, que tem por objetivo redistribuir o ônus do tempo no processo, para tanto, necessário razoável evidência do direito da parte. De acordo com a doutrina, o legislador ao tentar simplificar o procedimento retirando as cautelares, não foi bem sucedido, em especial, ao conceituar as tutelas antecedentes, o que implica, na prática, verdadeira confusão ao interpretá-las e aplicá-las, inclusive, gerando tumulto processual, na medida em que o procedimento não é claro, o que não é benéfico. Além dos conceitos não serem muito claros, o procedimento também não é, o que resulta nos problemas práticos com relação ao manejo das tutelas provisórias trazidas pelo legislador.
Por ora, não há muita jurisprudência a respeito, então somente com o tempo juntamente com a interpretação doutrinária e jurisprudencial serão sanadas as questões procedimentais que revestem as tutelas provisórias.
Essas são apenas algumas das mudanças trazidas pelo CPC de 2015, mas que devem ser estudadas e também utilizadas pelos operadores do direito, de modo a evitar que caiam em desuso ou sejam usadas de maneira equivocada no caso concreto.
Por serem mudanças normativas recentes, na prática, observa-se ainda pouca utilização dos novos mecanismos e institutos, e como consequência, poucos temas foram apreciados pelos Tribunais de Justiça e Tribunais Superiores, sendo que somente com o decorrer do tempo e com a utilização desses instrumentos processuais é que será possível analisar os seus impactos e a sua própria interpretação dentro do sistema processual civil.
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*Érica Escolano é advogada do escritório Chalfin, Goldberg, Vainboim & Fichtner Advogados Associados, mestranda em Direito Político e Econômico no Programa de Pós Graduação Strictu Sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie.