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A utilização da ata notarial elaborada mediante colaboração das partes como medida de alívio para o Poder Judiciário

De nada adiantará ficar reclamando de lentidão do Judiciário, quando nós, advogados e partes, não tentamos nos utilizar de "ferramentas" simples, que podem contribuir para melhoria na tão buscada celeridade processual.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Atualizado em 5 de setembro de 2019 10:38

Em alguns escritos anteriores, abordei rapidamente questões como uma necessária revisitação do interesse de agir, para elevar de patamar os meios alternativos de solução de disputas1, assim como a inclusão de cláusulas contratuais com previsões expressas da obrigatoriedade de "acionamento prévio de instrumentos de ODR como requisito para a configuração do interesse de agir".2

Agora, retorno para breves palavras a respeito da utilização da ata notarial pelas partes, com a finalidade de registrarem perante um serviço destinado a "garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos"3, atos que somente seriam praticados quando da audiência de instrução e julgamento.

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Mais especificamente: por qual motivo nós, advogados, não passamos a avaliar o cabimento - em alguns casos - do convencimento de nosso cliente quanto à viabilidade de se realizar uma "instrução" em cartórios extrajudiciais, registrando-se em ata notarial as perguntas e respostas de partes e testemunhas?

Convencido o cliente dos possíveis benefícios e riscos4, o ajuste pode ser realizado com o advogado da parte adversa, num instrumento de redação simples, para ser levado ao conhecimento do Magistrado.

Trata-se de uma materialização clara do princípio da cooperação (CPC, art. 6º). Segundo Erik Navarro Wolkart, a cooperação no processo civil deve ser entendida como5:

[...] uma união de esforços na busca de um sistema de justiça que, longe do cenário de tragédia, seja capaz de ofertar tutelas justas, efetivas e em prazo razoável.

Segue o ilustre Doutor apontando que o benefício comum buscado pela cooperação é o bom funcionamento do sistema de justiça e que o conteúdo da cooperação abrange todos os deveres dos sujeitos processuais capazes de auxiliar o processo e o sistema como um todo ao proferimento tempestivo de tutelas jurisdicionais justas e efetivas.6

De acordo com a lei Federal 8.935/94, os notários têm competência para "autenticar fatos", e aos tabeliães de notas compete exclusivamente a lavratura de atas notariais (artigos 6º, III e 7º, III). Por outro lado, o CPC ressalta no artigo 384 que "a existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião".

Presentes as partes e seus advogados, apresentadas as perguntas e obtidas as respostas para, no fecho, ambos os patronos incluírem suas declarações finais (se assim entenderem necessário), seria lavrada a ata notarial com todos os detalhes, atendendo inclusive aos requisitos do artigo 215 do CC.

De posse do documento, anexado à petição firmada pelos advogados, elaborada com fundamento no artigo 190 do CPC7, o Magistrado poderia passar a tratar como documental uma prova que seria inicialmente produzida oralmente no juízo, sabe-se lá quando...

Observe-se, outrossim, que, segundo o próprio CPC, a Audiência de Instrução e Julgamento, a princípio, não é um ato imprescindível, restando plenamente possível ao magistrado - mesmo quando as partes não declarem expressamente o desinteresse na AIJ - designar ou não a audiência:

Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo:
(...)
V - designar, se necessário, audiência de instrução e julgamento.

Antes de qualquer outra coisa, o processo civil é direcionado pelos valores e normas fundamentais da CF de 1988 (CPC, art. 1º), cabendo ao Magistrado, ao aplicar o ordenamento jurídico, atender aos fins sociais e às exigências do bem comum, "promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência" (CPC, art. 8º).

Ao agirem assim, os patronos certamente darão um passo relevante no sentido de contribuir com maior celeridade não só do seu processo judicial, mas também beneficiarão terceiros, na medida em que o tempo que seria utilizado para aquela audiência de instrução poderá ser redirecionado para a prática de outro ato, pelo Magistrado, pelos servidores e pelos próprios advogados (além, é claro, de diminuir o tempo que as partes gastam com idas e vindas ao Judiciário).

De nada adiantará ficar reclamando de lentidão do Judiciário, quando nós, advogados e partes, não tentamos nos utilizar de "ferramentas" simples, que podem contribuir para melhoria na tão buscada celeridade processual.

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1 - Online Dispute Resolution e o interesse de agir.

2 - Contributo para o descongestionamento do Poder Judiciário: os contratos e a legitimação dos métodos online de resolução de disputas como requisito pré-processual. 

3 - Artigo 1º da lei Federal 8.935/94.

4 - A meu ver, a depender da matéria envolvida, o único risco é o Magistrado aplicar o parágrafo único do art. 190 do CPC.

5 - Análise econômica do processo civil: como a economia, o direito e a psicologia podem vencer a tragédia da justiça. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. Pág. 229.

6 - Ob. cit., pág. 231.

7 - Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. 
Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.

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t*Umberto Lucas de Oliveira Filho é advogado do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia, certificado pelo EXIN. Especialista em Direito Processual. Pós-Graduando em Direito Digital pelo CERS.

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