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É preciso fortalecer as agências reguladoras

Maria Stella Gregori

O assunto "agências reguladoras" está na crista da onda. Infelizmente, sempre que ouvimos falar delas escutamos algum tipo de reclamação. Uma pena. Gostaríamos, no entanto, de fazer menção à forma através da qual elas surgiram no cenário brasileiro. No fim dos anos 90 o governo de Fernando Henrique Cardoso repensou as funções do Estado e a estrutura de seu aparelho, de sua máquina administrativa. Procedeu-se, então, a uma reforma do aparelho do Estado com o objetivo precípuo de modernizá-lo, bem como de viabilizar o ajuste fiscal e incentivar o crescimento das iniciativas do setor não governamental, em uma tentativa de possibilitar o aumento de investimento em setores considerados essenciais.

quarta-feira, 4 de outubro de 2006

Atualizado em 3 de outubro de 2006 13:40


É preciso fortalecer as agências reguladoras

 

Maria Stella Gregori*

 

O assunto "agências reguladoras" está na crista da onda. Infelizmente, sempre que ouvimos falar delas escutamos algum tipo de reclamação. Uma pena. Gostaríamos, no entanto, de fazer menção à forma através da qual elas surgiram no cenário brasileiro. No fim dos anos 90 o governo de Fernando Henrique Cardoso repensou as funções do Estado e a estrutura de seu aparelho, de sua máquina administrativa. Procedeu-se, então, a uma reforma do aparelho do Estado com o objetivo precípuo de modernizá-lo, bem como de viabilizar o ajuste fiscal e incentivar o crescimento das iniciativas do setor não governamental, em uma tentativa de possibilitar o aumento de investimento em setores considerados essenciais.

 

As agências reguladoras aparecem no ordenamento jurídico com guarida constitucional. A Constituição Federal de 1988, ao dispor sobre a ordem econômica, em seu artigo 174, fixou o papel do Estado como agente normativo e regulador e como executor subsidiário de atividades econômicas. Nesse contexto, as agências reguladoras foram concebidas para serem autarquias de natureza especial, criadas por lei, dirigidas por um órgão colegiado com a missão de regulamentar e fiscalizar a prestação de certos bens e serviços considerados de relevância pública, sendo dotadas de independência decisória, autonomia financeira, administrativa e gerencial. Os diretores devem ser nomeados pelo presidente da República, previamente aprovados pelo Senado Federal, para exercer mandatos fixos e não coincidentes. Com isso, o ordenamento jurídico pátrio procurou prover as agências do aparato necessário à estabilidade institucional.

 

A idéia central da criação desses entes reguladores foi justamente a busca da modernização do Estado e a harmonização dos setores regulados, principalmente com a diminuição da assimetria de informações e as falhas de mercado. Um órgão especializado, dotado de pessoal técnico e familiarizado com o setor regulado, propicia maior eficiência às normas expedidas e à fiscalização exercida.

 

De outro lado, como os mercados regulados, em geral, envolvem a necessidade de investimentos vultosos e de retorno demorado, se fazia necessário lhes atribuir o maior nível possível de estabilidade, pois de outra forma a iniciativa privada poderia ser repelida por riscos estranhos à natureza das atividades a serem exploradas (como ingerências políticas, normas que inviabilizassem a prestação eficiente dos serviços, metas tangíveis etc.).

Precisamos estar atentos para que o modelo de agências reguladoras não seja extinto no Brasil

No entanto, se durante alguns anos se presenciou uma árdua tentativa do Poder Executivo em solidificar as bases desse novo modelo de administração pública, o que se tem assistido mais recentemente é exatamente o inverso: contingenciamento de recursos, intervenção dos ministérios nas decisões das agências, morosidade na indicação de diretores, comprometendo o quorum para as decisões, indicação de diretores de acordo com critérios políticos e não técnicos e, ainda, instabilidade das regras.

 

É evidente que, como qualquer reestruturação profunda, o modelo das agências reguladoras precisa de ajustes, e sua reforma deve ocorrer de maneira gradual e fundamentada, para que um dia tenhamos a consolidação de uma cultura regulatória independente neste país. Porém, para que isso ocorra, é fundamental que as competências das agências sejam claramente delimitadas, mas que sua autonomia e atuação sejam respeitadas pelos poderes Executivo e Legislativo.

 

Assim é que já há um projeto de lei de reforma do regime jurídico das agências reguladoras em tramitação no Congresso Nacional. Tema polêmico, a reforma do modelo de agências, da mesma forma que pode se constituir em uma grande aliada do amadurecimento do método de regulação setorial, se promovida sem maiores debates pode se tornar uma ferramenta de combate à real função desses entes. Uma coisa é certa: mesmo aqueles que são contrários à existência das agências reguladoras no Brasil relutam em defender abertamente a sua extinção. Assim, uma mudança legislativa que acabe com sua utilidade prática e confira legitimidade às interferências que vêm ocorrendo pode, eventualmente, se concretizar. Justamente por essa razão, a importância da discussão do tema se mostra da maior grandeza no momento atual.

 

É fundamental o aperfeiçoamento, inclusive esta é uma atitude construtiva. O que não podemos é aceitar o retrocesso institucional, ou seja, a volta do modelo antigo de centralização do poder nos ministérios. Precisamos estar atentos para que o modelo de agências reguladoras, um ícone do Estado democrático de direito, não seja extinto no Brasil. Em uma democracia é importante contar com agências reguladoras fortes e que garantam a preservação da regras de mercado. Se assim procedermos, estaremos garantindo contínuos investimentos nacionais e internacionais nos setores regulados. Sem isso, não se terá a certeza de um cenário apropriado para a competição sadia e os investidores, tão necessários a um país carente de recursos financeiros como é o nosso, serão afugentados. Almejamos um crescimento sustentado, com agências reguladoras autônomas.

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*Advogada do escritório Barretto Ferreira, Kujawski, Brancher e Gonçalves - Sociedade de Advogados


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