Receita Federal estabelece novo formato para a prestação de informações sobre Valor da Terra Nua (VTN)
Caso o contribuinte não concorde com valores arbitrados pelo município, entendemos que há campo para questionar os critérios previstos na IN 1.877/19, especialmente se o contribuinte for capaz de produzir prova (laudos técnicos) demonstrando a irregularidade na avaliação municipal.
terça-feira, 28 de maio de 2019
Atualizado às 09:14
Em 15/3/19, a Receita Federal publicou a IN 1.877 (IN 1.877/19), que estabeleceu novos critérios para apuração do Valor da Terra Nua (VTN) em propriedades rurais. A partir de agora, as autoridades fiscais deverão adotar parâmetros mais próximos aos de mercado no cálculo do VTN e do Imposto Territorial Rural (ITR).
Nos termos da legislação fiscal, o VTN é declarado anualmente e deverá refletir o preço de mercado do imóvel rural, apurado em 1º de janeiro de cada ano-calendário (artigo 8º, § 2º, da lei 9.393/96). No entanto, até a publicação da nova IN, a Receita Federal (IN 1.562/15) estabelecia critérios mais abstratos para a determinação do valor de mercado das propriedades rurais, permitindo que o levantamento de preços fosse baseado em transações, ofertas ou opiniões. Como resultado disso, o valor informado pelos municípios não necessariamente correspondia ao valor real de mercado dos imóveis, isto é, aquele valor que seria utilizado em uma transação de mercado entre partes independentes.
Com a publicação da nova IN 1.877/19 a Receita Federal procurou mudar esse cenário, trazendo mais substância para a determinação do VTN. De acordo com a nova regra, a avaliação das terras rurais passará a ser feita com base em três elementos principais: a localização do imóvel, a dimensão das terras e a aptidão agrícola da propriedade (classificação que busca refletir as potencialidades e restrições para o uso da terra). Especificamente em relação à aptidão agrícola, a IN 1.877/19 também trouxe critérios mais objetivos e realistas para determinar a capacidade produtiva da propriedade rural (art. 3º).
Com isso, a avaliação do valor de mercado das terras rurais levará em consideração a valorização do imóvel em função da sua localidade, o tamanho da propriedade e a sua capacidade (aptidão) de exploração e geração de recursos pelo proprietário. Assim, quanto maior a capacidade de exploração da propriedade, maior será o valor médio do VTN informado pelo município.
Além disso, vale notar que as informações para levantamento do preço das terras passarão a ser estabelecidas por um profissional técnico legalmente habilitado e vinculado ao Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) e aos correspondentes Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (Crea), que se responsabilizará tecnicamente pelo trabalho.
A forma de apresentação das informações relativas ao VTN pelos municípios também foi alterada pela IN 1.877/19. A partir de agora, as informações prestadas deverão ser enviadas eletronicamente, por meio do Portal e-CAC, até o último dia útil do mês de abril de cada ano-calendário.
Na prática, essas mudanças deverão gerar um aumento no valor das terras informado pelos contribuintes, com impacto direto na apuração do ITR anual e na determinação do ganho de capital auferido na venda de propriedades rurais.
Vale lembrar que, nos termos da lei 9.393/96, o cálculo do ganho de capital na venda de terras rurais é efetuado pela diferença entre (i) o valor do VTN declarado no ano-calendário em que ocorreu a venda, e (ii) o valor do VTN no ano-calendário em que ocorreu a aquisição do bem (custo de aquisição). Sobre essa diferença, haverá a incidência do IRPF (no caso de vendas por pessoas físicas) e do IRPJ/CSL (no caso de vendas por pessoas jurídicas). Dessa forma, com o aumento do VTN declarado a partir dos novos critérios previstos na IN 1.877/19, os contribuintes poderão apurar um ganho de capital superior na venda de propriedades rurais.
De modo geral, a publicação da IN 1.877/19 projeta uma maior arrecadação e intensificação dos processos de fiscalização na atividade rural, trazendo critérios mais claros e que serão utilizados por um profissional técnico ligado à Administração Pública para a determinação do VTN anual das terras rurais.
A nosso ver, tendo em vista que os critérios e índices para cálculo do VTN serão aplicados diretamente pelos municípios e pelo Distrito Federal, inclusive com a participação de profissional técnico vinculado aos Conselhos Regionais de Engenharia, há campo para questionar o VTN apurado pelas autoridades municipais, considerando que a competência tributária é indelegável nos termos do artigo 7º do Código Tributário Nacional.
A atividade atribuída aos municípios deve ficar restrita à arrecadação e fiscalização do ITR, não sendo possível aos entes federados determinar a base de cálculo de tributos incidentes sobre a propriedade rural, inclusive para fins de determinação do ganho de capital na venda de imóveis por pessoas físicas e jurídicas.
Também é possível questionar a legalidade da IN 1.877/19, uma vez que os novos critérios para determinação do VTN podem gerar aumento de tributo sem que exista uma lei específica para esse fim. Dessa forma, caso a aplicação da IN 1.877/19 gere um aumento do ITR anual ou ainda do imposto de renda incidente sobre o ganho de capital na venda de propriedades rurais, há argumentos para questionar os critérios da IN 1.877/19 com base no artigo 150, I, da Constituição Federal e artigo 9º, I, do CTN.
Portanto, caso o contribuinte não concorde com valores arbitrados pelo município, entendemos que há campo para questionar os critérios previstos na IN 1.877/19, especialmente se o contribuinte for capaz de produzir prova (laudos técnicos) demonstrando a irregularidade na avaliação municipal.
Principais alterações na determinação do Valor da Terra Nua - VTN |
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Características |
IN 1.562/15 |
IN 1.877/19 |
Competência para prestação das informações |
Municípios e DF |
Municípios e DF |
Levantamento do preço das terras |
Metodologia apontada em levantamento de preços baseado em transações, ofertas ou opiniões. |
Levantamento técnico realizado por profissional habilitado, vinculado ao Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) e aos Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (Crea). |
Prazo para entrega das informações pelos Municípios |
Até o último dia útil de julho de cada ano |
Até o último dia útil de abril de cada ano. |
Critérios para formação do VTN |
Critérios mais abstratos e que não necessariamente eram determinados por autoridades técnicas. |
Critérios mais realistas, objetivos e determinados por autoridade técnica que será responsável pela avaliação. |
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*Giancarlo Chamma Matarazzo é sócio de Pinheiro Neto Advogados.
*Renato Henrique Caumo é associado de Pinheiro Neto Advogados.
*Octavio Rizkallah Alves é associado de Pinheiro Neto Advogados.
*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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