O encanto das livrarias físicas
Comprar livros pela internet é legal, mas comprar em livrarias reais, físicas, é sensacional.
quarta-feira, 29 de maio de 2019
Atualizado em 24 de maio de 2019 08:31
Leitores vorazes sofreram, desde o começo do ano passado, quando as duas maiores redes de livrarias do país - Cultura e Saraiva - mostraram publicamente que estavam com dificuldades para honrar seus compromissos financeiros. Ambas pediram recuperação judicial. A Saraiva tem dívidas de aproximadamente R$ 675 milhões. As dívidas da Livraria Cultura são estimadas em R$ 285 milhões. O cenário enseja várias reflexões para quem ama literatura.
É preciso lembrar que essas duas livrarias fizeram a história de vários leitores. A Livraria Saraiva, na década de 1990, fundou em São Paulo a primeira megastore - com livros, revistas, música e ainda com espaços de convivência para cafés e leitura. A Livraria Cultura seguiu caminho semelhantes.
As livrarias físicas são mundos de contos. Quem convive comigo sabe o quanto AMO livros. Amo com A maiúsculo. A cada história eu viro um personagem. Viro uma zeladora que oculta sua inteligência e erudição, um homem que esconde sua condição racial, uma menina travessa e má, uma astróloga iniciante, uma criança rindo junto com seu coelho imaginário de estimação, um velhinho colocado em um asilo e por aí vai. Junto com o amor aos livros vem meu amor pelas livrarias. As livrarias físicas - para ficar bem claro.
Nelas, a experiência sensorial é fantástica. As prateleiras ordenadas, com os títulos recentemente lançados, com os clássicos, livros separados por temas, por áreas, todos com a lombada à mostra, convidando para serem capturados das estantes, para receberem os dedos (de adultos e crianças) em suas páginas, oferecendo o índice, a capa bem pensada, a textura das folhas. Sem falar das poltronas, sofás aconchegantes e o dinossauro de madeira com almofadas convidativas para as crianças. E principalmente pessoas - sejam aquelas que trabalham ali, sejam as que as frequentam. Ah!!! Chego a me emocionar quando penso em quanto fui e sou feliz nesse ambiente.
Mas a emoção vem mais forte quando penso que essa experiência rica, bela, profunda, de estar em uma livraria física, vai virar outra história para eu contar para meus netos. Essa história é mais ou menos assim: "Sabe, lindinho da vovó, no meu tempo, comprávamos livros em lugares muito gostosos de ir, de passear. Naqueles lugares as pessoas podiam pegar os livros da estante, folheá-los, passear por suas páginas, sentindo a gramatura da folha, paquerar o leitor interessante que estava por ali em busca de alguma aventura literária, sentar numa poltrona de couro, aconchegante, e passar a tarde inteira ali, largadas na saudável imaginação. Também podíamos tomar um café gostoso na cafeteria, acompanhado de um pãozinho macio e um bombom. Quando esses lugares ainda existiam, eu costumava levar sua mãe lá. Adorava ver a Clara se encantando com o universo dos livros. Ela ama livros pelos livros, eu sei, mas muito pela lembrança de estarmos juntas ali, compartilhando histórias as mais diversas. Pergunte para ela. Talvez, sua mãe se lembre".
Bom, o diálogo imaginário tem tudo para ser real, mas aguardemos o que o futuro reserva. O triste fato é que as nossas livrarias físicas estão passando por dificuldades financeiras. Cultura, Saraiva e FNAC, além de tantas outras estão em um caminho de obstáculos. Lugares belos, ambientes de uma riqueza inenarrável, tendo que reduzir pessoal, cortar custos, diminuir de tamanho e até fechar. Uma lástima.
Estou tentando retardar esse cenário. Meu esforço é o de uma formiga frente a um gigante, eu sei. Mas por decisão muito pensada eu compro livros, preferencialmente, em livrarias físicas.
Como leitora e frequentadora apaixonada, compartilho com vocês o que vai na minha alma e faço um apelo: Antes de pensar em comprar obras na livraria eletrônica, vamos tentar primeiro fazer isso em livrarias físicas? Comprar livros pela internet é legal, mas comprar em livrarias reais, físicas, é sensacional. Isso por tudo o que faz parte dessa experiência.
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*Janaína Castro de Carvalho é advogada e sócia do escritório Eduardo Antônio Lucho Ferrão - Advogados Associados.