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O deslocamento da venda de 'thêmis'

Revela-se imperioso 'desalgemar' a 'Thêmis'.

quarta-feira, 24 de abril de 2019

Atualizado em 22 de abril de 2019 16:43

Infelizmente, diante dos recentes acontecimentos, constata-se que a cúpula do Poder Judiciário, por razões ideológicas tão claras quanto perniciosas, deslocou 'a venda de Themis' sob o argumento falacioso de romper a barreira da neutralidade, como suposta forma de concretização de direitos. 

Nesse contexto, o STF rompeu a linha que está a separá-lo, inclusive, dos órgãos essenciais à administração da justiça, de tal sorte que se 'encastelou' (para não dizer se 'aquartelou'), materializando preocupante embate e acotovelamento pela unificação do poder estatal, diante dos olhos estupefatos dos jurisdicionados, dos cidadãos, estes sim, em última análise, legítimos detentores do Poder. 

Não se cuida de mero caso fronteiriço ou limítrofe, nem mesmo de consagração das técnicas de 'freios e contrapesos', como proclamado pelo artigo 2º da Constituição Federal, tão salutar para o democrático funcionamento das instituições estatais. Na verdade, vivenciamos uma patologia sistêmica em relação à qual, a imprensa e os próprios órgãos estatais devem estar vigilantes. 

Logo, impõe-se uma visão do sistema jurídico processual como instrumento de efetivação dos direitos fundamentais, cuja exigência de procedimentos adequados à tutela dos direitos traduz o reflexo da tomada de consciência de que os direitos fundamentais precisam ser tutelados de forma eficaz, pois, a Constituição Federal, fundada na dignidade humana, não só garante uma série de direitos não patrimoniais, como afirma, expressamente, o compromisso com o acesso à justiça de modo a não ensejar a violação ao sistema legal vigente.

Caso contrário, de nada adiantará apregoar os 'pontos sensíveis da prestação jurisdicional' postos em uma perspectiva meramente horizontal e não necessariamente vertical. Isso servirá ao discurso sedutor da elite dominadora. Portanto, para a manutenção da própria dominação. 

Enfim, aspira-se um sistema jurídico permeado por ações fáticas que traduzam a efetiva desneutralização do Poder Judiciário, bem como pela utilização do sistema processual não como forma de dominação da elite econômica, tampouco da cúpula do Poder Judiciário, mas, como consagração e realização dos Direitos Fundamentais Materiais e Processuais.

Evidente que tal postura não se confunde, muito menos se coaduna, com julgamentos padronizados, distanciados do escopo de democratização pela via do processo e da pacificação social. Aproximando-se, por outro lado, de forma atemorizadora, do 'encastelamento' por meio da usurpação e concentração do poder.

De fato, a atividade mecânica, desprovida de análise crítica, reflexiva, interessa à manutenção do processo de dominação da elite judiciária. Assim, revela-se necessário 'iluminar' o ambiente de maneira a permitir enxergar, na paisagem da vida, a imagem fotografada na Constituição Federal. 

Sobretudo, porque a 'Thêmis' foi 'algemada' por aqueles que materializam os ideais que a inspiram e a caracterizam, ou seja, os próprios membros da cúpula do Poder Judiciário. 

Como se os homens impusessem aos Deuses os seus propósitos, ou se tornassem, apesar de mortais, os próprios Deuses. A história demonstrou o quanto isso custou aos Direitos Fundamentais. 

'Diante do exposto', revela-se imperioso 'desalgemar' a 'Thêmis'. Todavia, desta vez, a utilização da chave que permitirá o exercício da liberdade não decorrerá de eventual ordem emanada do Poder Judiciário, mas, da liberdade de expressão, da reflexão, do debate e do exercício da cidadania, frutos de uma visão emancipatória, comprometida com os valores consagrados na Constituição Federal. 

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*Flávio Luís de Oliveira é advogado, mestre e doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná e advogado.

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