Os shoppings e os empregados dos lojistas
Cada lojista do shopping mantém sua própria autonomia financeira e administrativa, planeja seus investimentos, suas expansões, fixa seus preços, sua margem de lucro. Cada lojista do shopping contrata seus próprios funcionários, fornece treinamento, estabelece salários, aplica sanções, demite, enfim, estabelece e pratica políticas de recursos humanos que lhe são próprias.
quinta-feira, 18 de abril de 2019
Atualizado em 17 de abril de 2019 12:28
O shopping, organizado como Condomínio Edilício, ou gerido por uma administradora, não tem relação de trabalho, muito menos vínculo de emprego, com os empregados dos lojistas instalados no empreendimento.
O shopping não tem relação intuito personae com esses empregados, não tem poder diretivo sobre os mesmos, não participa de sua escolha ou demissão, não os remunera, nem deles é tomador de serviços, pois a força produtiva desses empregados é voltada exclusivamente à consecução do objeto social de venda ou prestação de serviços da Loja que lhes dá emprego.
O lojista e seus empregados mantêm relação direta com os consumidores que vão à loja, não respondendo o shopping por vícios ou defeitos de produtos ou serviços ali vendidos ou prestados.
O shopping não corre os riscos do negócio do lojista. O shopping recebe do lojista-locatário um valor a título de aluguel no final do mês quer a loja tenha lucro ou prejuízo.
Cada lojista do shopping mantém sua própria autonomia financeira e administrativa, planeja seus investimentos, suas expansões, fixa seus preços, sua margem de lucro. Cada lojista do shopping contrata seus próprios funcionários, fornece treinamento, estabelece salários, aplica sanções, demite, enfim, estabelece e pratica políticas de recursos humanos que lhe são próprias. Cada lojista do shopping decide quanto, como e onde utilizar seu conjunto de bens (estabelecimento) no exercício da atividade empresarial, sem nenhuma interferência ou vinculação de uma loja com a outra, não se envolvendo o shopping em nenhum desses assuntos.
Pois veja-se que nem todos esses argumentos juntos têm evitado condenações de shoppings ao cumprimento de obrigações em favor de empregados que não são seus, como é o caso da imposição de implementação de espaço para guarda e vigilância de crianças lactantes a que se refere o art. 389, parágrafo 1º, da CLT, para uso de empregadas de lojistas. E muitas dessas condenações vêm conjugadas com indenizações por danos morais coletivos, decorrentes de obrigações que somente passaram a surgir para o shopping por força da própria decisão judicial que as instituiu.
Definitivamente, não há previsão legal para essa transferência de responsabilidade por obrigação laboral. A tese da subordinação reticular estrutural (citada em alguns acórdãos) não se aplica ao shopping, uma vez que este não é tomador de serviços dos empregados dos lojistas. E o shopping não é um estabelecimento único, pois as sociedades empresariais nele instaladas, pois as sociedades nele instaladas não guardam relação entre si, cada qual buscando realizar, individualmente, seus objetivos sociais.
Reconhece-se a importância do direito à maternidade, da saúde da mulher, da proteção à criança e da necessidade de um ambiente de trabalho sadio, mas não se pode aceitar que essas garantias tenham que ser asseguradas através da imposição de obrigação trabalhista a quem não é empregador, nem tem relação de trabalho, com o beneficiário da medida, sob pena de violação ao princípio da legalidade - CF, art. 5º, II.
Veja-se que a implementação de espaços para guarda e vigilância de crianças lactantes não é impositiva a todos os empregadores, mas apenas para os que tenham pelo menos 30 mulheres com mais de 16 anos trabalhando no estabelecimento. Além disso, a legislação fornece alternativas ao cumprimento de tal obrigação, como a celebração de convênios com creches ou a concessão do reembolso-creche. Ou seja, reconhece o legislador que a instalação desses espaços não é essencial à proteção dos direitos supra referidos. Não obstante, em algumas decisões judiciais contra shoppings, nem mesmo a possibilidade de cumprimento alternativo da obrigação, nos termos da lei, vem sendo permitida.
O assunto, atualmente, não tem posição pacificada no âmbito dos Tribunais Trabalhistas. Há, de um lado, julgados entendendo tratar-se de obrigação dirigida ao empregador, e, de outro lado, julgados condenando os shoppings, valendo ressaltar que uma das discussões sempre intrínsecas ao tema é também a própria competência da Justiça do Trabalho para a resolução dos litígios envolvendo o shopping e os empregados dos lojistas.
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*Sérgio Vieira é advogado e sócio do escritório Lobo & Lira Advogados, com atuação junto ao setor de Shopping Centers.