O contrato de trabalho na reforma trabalhista
Ao longo de quase 30 anos desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, inovações e alterações importantes atualizaram as relações de trabalho, adequando-as às novas tecnologias e sua utilidade na execução do labor. Além disso, aumentaram a proteção e os direitos dos trabalhadores.
terça-feira, 9 de abril de 2019
Atualizado em 5 de abril de 2019 09:45
1. Da breve evolução do direito do trabalho no Brasil
De 1500 até 1888, o quadro legislativo brasileiro referente ao trabalho registra poucas e esporádicas leis que não chegaram a constituir um ordenamento jurídico trabalhista. Em 1830, uma lei que regulava o contrato sobre prestação de serviços dirigida a brasileiros e estrangeiros. Em 1837, há uma normativa sobre contratos de prestação de serviços entre colonos dispondo sobre justas causas de ambas as partes. De 1850 é o Código Comercial, contendo preceitos alusivos ao aviso prévio. (BARROS, 2016)
De 1888 à Revolução de 1930, os diplomas legislativos de maior relevância são: uma lei sobre sindicalização dos profissionais da agricultura de 1903; uma lei sobre sindicalização de trabalhadores urbanos de 1907; o Código Civil de 1916, com um capítulo sobre locação de serviços, que regulamentava a prestação de serviços de trabalhadores; uma lei sobre acidente do trabalho de 1919.De 1923 é a lei Éloi Chaves que disciplinava a estabilidade no emprego para ferroviários que contassem com 10 ou mais anos de serviço junto ao empregador (esse instituto, mais tarde, foi estendido a outras categorias). Em 1930, dentro do processo de state building aviado por Vargas logo depois da revolução, cria-se o Ministério do Trabalho. Esse é o marco do aparecimento do Direito do Trabalho no Brasil apresentado pela doutrina, embora anteriormente já existisse um ambiente propício ao seu surgimento, em face da legislação que o antecedeu.
Em 1943 foi sancionada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que visava disciplinar a atividade remunerada no Brasil e a relação entre patrão e funcionário. Importantes aspectos passaram a ser regulamentados: jornadas de trabalho, condições de trabalho, Fundo de Garantia, vale-transporte, 13º salário, afastamento por motivos de saúde, aposentadoria, entre outros.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, dispõe dos direitos sociais dos empregados urbanos e rurais, além de outros que visam à melhoria de sua condição social.
Ao longo de quase 30 anos desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, inovações e alterações importantes atualizaram as relações de trabalho, adequando-as às novas tecnologias e sua utilidade na execução do labor. Além disso, aumentaram a proteção e os direitos dos trabalhadores.
Durante um grande período, as relações de trabalho foram regulamentadas com caráter próprio, sugerindo que a proteção deveria vir do estado e não dos sindicatos. Em contrapartida, ofereceu aos empregadores, em sua maioria, as indústrias, proteção econômica.
A lei 13.467/17, denominada reforma trabalhista baseada no preceito conforme o qual o "negociado prevalece sobre o legislado", introduz um aspecto até então estranho à legislação trabalhista brasileira: o da flexibilização. Trata-se da tentativa de modernizar a legislação, adequando-a às novas relações de trabalho intermitente que vêm surgindo já há vários anos nos países ocidentais.
A tese que pretendo sustentar, entretanto, é que a reforma trabalhista fragiliza os direitos do trabalhador e a relação de emprego.
2. O trabalho intermitente no mundo
As relações de trabalho intermitente começam a ser regulamentadas na Europa a partir dos anos de 1980.
A lei de Promoção ao Emprego/1985, na Alemanha, disciplina desde 1985 a jornada mínima e o de um salário mínimo (garantia do mínimo para sobrevivência). Conforme essa lei, o empregador tem obrigação de comunicar a necessidade do serviço do empregado com 04 dias de antecedência. A previsibilidade da jornada de trabalho é de três horas por dia solicitado, devendo o contrato constar com pelos menos dez horas semanais.
Na Itália, a lei Biagi/03, dispõe sobre uma série de tipologias contratuais que têm em comum a ausência de um vínculo duradouro entre empregador e empregado do tipo que vigora no contrato tradicional ("contrato de colaboração por projetos" ou "co.co.pro", "contrato de colaboração intermitente", "contrato de aprendizado", "contrato de trabalho ocasional"). Pensadas como formas contratuais, cuja flexibilidade visava elevar o número de ocupados - sobretudo de jovens no primeiro emprego e de apesentados - e reduzir o trabalho informal, ao passo que simplificavam a burocracia e desoneravam as empresas, as tipologias de trabalho introduzidas com a lei Biagi acabaram se tornando ágeis meios de chantagem nas mãos dos empregadores. À flexibilidade das condições de trabalho correspondia a ausência total de qualquer direito e benefício do trabalhador (como férias, afastamento por motivos de saúde, FGTS, etc.), uma vez que os tipos de trabalho que esses contratos se propunham a regulamentar previam uma ampla margem de autonomia do empregado, em relação às horas efetivas de trabalho (sendo contratado para a realização de um projeto) e, segundo o caso, em relação ao lugar do trabalho (podendo esse último ser exercido em casa). A desoneração tributária da empresa que contratava utilizado uma dessas tipologias era claramente associada à falta de benefícios e direitos que são previstas para formas tradicionais e continuadas de trabalho. Poucas, entretanto, foram as empresas que utilizaram esses contratos conforme previsto pela lei. Na situação mais comum, a empresa contratava jovens no primeiro emprego, formalmente nas condições de flexibilidade previstas por esses contratos, mas de fato obrigando o jovem trabalhador a um expediente normal e a uma relação continuada. A demissão não era nem uma ameaça, tendo sido assinada pelo próprio empregador no primeiro dia de trabalho.
Em Portugal, o trabalho intermitente foi introduzido no Código de Trabalho em 2009, após o seu surgimento no Acordo Tripartido em 2008 e é subdividido em: alternado - quando a prestação de serviço é intercalada e exclusiva e; trabalho a chamada - o empregado deve ser avisado do serviço com pelo menos 20 dias antecedência podendo possuir diversos empregadores.
A prestação de serviço não pode ser inferior a seis meses por ano, sendo que, pelo menos, quatro meses devem ser consecutivos.
Tanto na Itália como em Portugal, há a previsão de pagamento compensatório no período de inatividade pelos setores de hotelaria e alimentação.
No Reino Unido, o trabalho intermitente é baseado em plantões, chamados "contrato zero hora", com carga horária de 26 horas semanais. A faixa etária abrange os jovens com menos de 25 e adultos maiores de 65 anos. Não é um contrato de trabalho estável financeiramente, pois não há garantia dos direitos mínimos.
Em 2014, foi proibido pelo governo britânico o uso de cláusulas de exclusividade nesses contratos.
No Contrato de "trabajo fijo discontinuo" na Espanha, o empregado tem conhecimento dos meses que fará parte da empresa e, durante os meses em que não trabalha, tem o direito de trabalhar para outra empresa ou se quiser, fazer uso do seguro desemprego.
Os acordos coletivos devem estabelecer os meses de trabalho, a forma e ordem de recurso (o direito que os trabalhadores permanentes descontínuos têm de ser chamados) que sejam por escrito. Devem, também, indicar o dia de trabalho, horário de trabalho e salário.
Nos Estados Unidos, os empregados podem ser convocados com a mínima antecedência e com variação nas horas de trabalho. Com o impacto negativo do contrato de trabalho intermitente, alguns estados criaram leis conhecidas como "reporting-time pay", que preveem ao empregado o pagamento de um valor mínimo.
3. O contrato de trabalho intermitente no Brasil
Com a lei 13.467/17, a CLT dispõe sobre o trabalho intermitente, cujo objetivo "é modernizar as relações do trabalho, sem que haja precarização do emprego", conforme o Parecer da Câmara dos Deputados que dispõe sobre o trabalho temporário[1].
A previsão do Contrato de Trabalho Intermitente está disposta no Título IV, do Contrato Individual do Trabalho, Capítulo I, art. 443.
"Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente."
Para considerar-se trabalho intermitente, a prestação de serviços, com subordinação, não pode ser contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria, segundo o §3º do art.443.
O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não (Art. 452-A, caput, da CLT).
Caso o empregado seja contratado verbalmente para trabalhar, a relação de trabalho não será intermitente e o tempo à disposição do trabalhador será contado conforme o art. 4º da CLT, devendo-se ser aplicar às demais regras da CLT.
O empregador convocará o empregado, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de antecedência (§1º do Art.452-A da CLT). Recebida a convocação, o empregado terá o prazo de um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa (§2º do Art. 452-A da CLT). A recusa da oferta não descaracteriza a subordinação para fins do contrato de trabalho intermitente (§3º do art. 452-A da CLT).
Tendo aceitado a oferta para o comparecimento ao trabalho, a parte que descumprir, sem justo motivo, pagará à outra parte, no prazo de trinta dias, multa de 50% (cinquenta por cento) da remuneração que seria devida, permitida a compensação em igual prazo, conforme estabelece o §4º do art. 452-A da CLT.
Presume-se que a multa incida sobre o dia de trabalho descumprido, não devendo ser aplicada pelo período de execução do trabalho.
O § 5o do art. 452-A da CLT deixa claro que o período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador, podendo o trabalhador prestar serviços a outros contratantes.
Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas: remuneração, férias proporcionais com acréscimo de um terço, décimo terceiro salário proporcional, repouso semanal remunerado e adicionais legais (§6º do Art.452-A da CLT). O recibo de pagamento deverá conter a discriminação dos valores pagos relativos a cada uma das parcelas referidas, dispõe o §7º do art.452-A da CLT.
Questiona Vólia Bonfim Cassar2 : "Ora, o que quer dizer "ao final de cada período de trabalho" mencionado na lei? Poderia o professor receber no final do semestre? O motorista "intermitente" poderia receber ao final da viagem, mesmo que esta demore dois meses? Defendemos a periodicidade máxima mensal, mesmo que o trabalho seja em período superior".
O empregador, também terá que efetuar o recolhimento da contribuição previdenciária e o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, na forma da lei, com base nos valores pagos no período mensal e fornecerá ao empregado comprovante do cumprimento dessas obrigações, nos termos do §8º do art. 452-A da CLT.
Quanto às férias, o §9º da art. 452-A da CLT prediz que, a cada doze meses, o empregado adquire direito a usufruir, nos doze meses subsequentes, um mês de férias, período no qual não poderá ser convocado para prestar serviços pelo mesmo empregador.
Ainda questiona a professora Vólia Bonfim Cassar3: "Como será a contagem, por data de aniversário da vigência do contrato ou da soma dos dias trabalhados até completar 365 dias? As férias são de 30 dias ou de um mês? "
O § 9° do art. 452-A da CLT refere-se ao mês sem qualquer, pois o pagamento das férias proporcionais é ao fim de cada período.
4. Portaria n° 349, de 23/05/18, do ministério do trabalho
O Ministério do Trabalho editou a Portaria 349/18 que regulamenta o contrato de trabalho intermitente estabelecendo regras voltadas à execução da lei 13.467, de 13 de julho de 2017, no âmbito das competências normativas do Ministério do Trabalho.
De acordo com a portaria, o contrato de trabalho intermitente será celebrado por escrito e registrado na Carteira de Trabalho e Previdência Social, ainda que previsto em acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva. (Art. 2º da Portaria MTB Nº 349/2018)
O contrato conterá: identificação, assinatura e domicílio ou sede das partes (Art. 2º, I, da Portaria MTB Nº 349/2018); valor da hora ou do dia de trabalho, que não poderá ser inferior ao valor horário ou diário do salário mínimo, nem inferior àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função, assegurada a remuneração do trabalho noturno superior à do diurno (Art. 2º, II, da Portaria MTB Nº 349/2018) e; o local e o prazo para o pagamento da remuneração (Art. 2º, III, da Portaria MTB Nº 349/2018).
No tocante às férias, o empregado, mediante prévio acordo com o empregador, poderá usufruir suas férias em até três períodos, nos termos dos §§ 1º e 3º do art. 134 da Consolidação das Leis do Trabalho (Art. 2º, §1º, da Portaria MTB Nº 349/2018).
Em relação à remuneração, na hipótese de o período de convocação exceder um mês, o pagamento das parcelas a que se referem o § 6º do Art. 452-A da Consolidação das Leis do Trabalho não poderá ser estipulado por período superior a um mês, devendo ser pagas até o quinto dia útil do mês seguinte ao trabalhado, de acordo com o previsto no § 1º do art. 459 da CLT (Art. 2º, §2º, da Portaria MTB Nº 349/2018).
Dadas as características especiais do contrato de trabalho intermitente, não constitui descumprimento do inciso II do caput ou discriminação salarial pagar ao trabalhador intermitente remuneração horária ou diária superior à paga aos demais trabalhadores da empresa contratados a prazo indeterminado (Art. 2º, §3º, da Portaria MTB Nº 349/2018).
Constatada a prestação dos serviços pelo empregado, estarão satisfeitos os prazos previstos nos §§ 1º e 2º do Art. 452-A da Consolidação das Leis do Trabalho (Art. 2º, §4º, da Portaria MTB Nº 349/2018).
É facultado às partes convencionar por meio do contrato de trabalho intermitente os locais de prestação de serviços (Art. 3º, I, da Portaria MTB Nº 349/2018); turnos para os quais o empregado será convocado para prestar serviços (Art. 3º, II, da Portaria MTB Nº 349/2018); e formas e instrumentos de convocação e de resposta para a prestação de serviços (Art. 3º, III, da Portaria MTB Nº 349/2018).
Para fins do disposto no § 3º do art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho, considera-se período de inatividade o intervalo temporal distinto daquele para o qual o empregado intermitente haja sido convocado e tenha prestado serviços nos termos do § 1º do art. 452-A da referida lei (Art. 4º da Portaria MTB Nº 349/2018). Durante este período, o empregado poderá prestar serviços de qualquer natureza a outros tomadores de serviço, que exerçam ou não a mesma atividade econômica, utilizando contrato de trabalho intermitente ou outra modalidade de contrato de trabalho (Art. 4º, § 1º da Portaria MTB Nº 349/2018). Este período não será considerado tempo à disposição do empregador e não será remunerado, hipótese em que restará descaracterizado o contrato de trabalho intermitente caso haja remuneração por tempo à disposição no período de inatividade (Art. 4º, § 2º da Portaria MTB Nº 349/2018).
As verbas rescisórias e o aviso prévio serão calculados com base na média dos valores recebidos pelo empregado no curso do contrato de trabalho intermitente (Art. 5º da Portaria MTB Nº 349/2018). No cálculo da média a que se refere o caput do Art. 5º, serão considerados apenas os meses durante os quais o empregado tenha recebido parcelas remuneratórias no intervalo dos últimos doze meses ou o período de vigência do contrato de trabalho intermitente, se este for inferior (parágrafo único do Art. 5º da Portaria MTB Nº 349/2018).
No contrato de trabalho intermitente, o empregador efetuará o recolhimento das contribuições previdenciárias próprias e do empregado e o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço com base nos valores pagos no período mensal e fornecerá ao empregado comprovante do cumprimento dessas obrigações (Art. 6º da Portaria MTB Nº 349/2018).
Depreende-se da Portaria editada pelo Ministério do Trabalho uma contradição quanto à remuneração no inciso II do Art. 2º e §3º do mesmo artigo.
Deixa a cargo do empregador e do empregado no que condiz às férias, bem como os locais de prestação de serviços, turnos para os quais o empregado será convocado para prestar serviços e formas e instrumentos de convocação e de resposta para a prestação de serviços.
Quanto ao período de inatividade apenas transcreve o art. 452-A, §5º da CLT, assim como o faz quanto aos recolhimentos fundiários e previdenciários (Art. 452-A, §8º da CLT).
A Portaria dispõe que as verbas rescisórias e o aviso prévio serão calculados com base na média dos valores recebidos pelo empregado no curso do contrato de trabalho intermitente e serão considerados apenas os meses durante os quais o empregado tenha recebido parcelas remuneratórias no intervalo dos últimos doze meses ou o período de vigência do contrato de trabalho intermitente, se este for inferior. Entretanto, o Art.452-A, §6º da CLT, com a redação trazida pela lei 13.467/17, estabelece que ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas: remuneração, férias proporcionais com acréscimo de um terço, décimo terceiro salário proporcional, repouso semanal remunerado e adicionais legais.
Indaga-se: quais verbas rescisórias e aviso prévio receberá o trabalhador intermitente?
5. Conclusão
A lei 13.467/17 no tocante ao contrato de trabalho intermitente não trouxe qualquer modernização nas relações de emprego sem precarização. Pelo contrário, a previsão do contrato de trabalho intermitente claramente traz à tona um período sombrio para os trabalhadores, uma vez que vai de encontro com os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal. Entre eles, os mais importantes são: a duração da jornada de trabalho e o salário mínimo. A Portaria editada pelo Ministério do Trabalho, também, não traz benefício algum ao trabalho intermitente, com suas transcrições da própria CLT e suas contradições ao texto da CLT. Mais uma legislação esparsa para acrescentar ao ordenamento jurídico, mas vazia de conteúdo e de aplicação ao caso concreto.
O contrato de trabalho intermitente tenta criar um novo conceito de duração de jornada de trabalho com o tempo à disposição do empregador, mas sem os efeitos jurídicos do tempo à disposição, desconsiderando a previsão do art. 4º da CLT, que considera como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens.
Em relação ao salário, observa-se que o legislador cria mais um tipo de salário-tarefa: quando o salário contratual é calculado sobre a produção do trabalhador no respectivo mês, sendo esta produção calculada sobre o número de horas em que o empregado esteve efetivamente à disposição do empregador a cada convocação do mesmo empregador.
A previsão salarial do contrato de trabalho intermitente contraria tanto o artigo 78 da CLT, como o art. 7º, VII da Constituição Federal, ao pagamento de um salário, nunca inferior ao mínimo vigente à época do contrato de trabalho.
É sabido que o empregado que recebe o salário mínimo mal consegue sobreviver durante um mês, como sobreviverá aquele que somente conseguir trabalho intermitente?
Indubitavelmente, com este tipo de remuneração, esse novo contrato de trabalho poderá afetar de modo sem precedentes o rebaixamento do valor trabalho tanto na economia quanto na sociedade.
A prática do contrato de trabalho será como uma epidemia que atingirá a todos. Até mesmo os bons empregadores. Pois, assim que os concorrentes a tornarem regra em suas contratações, aqueles logo tratarão de precarizar suas contratações, tornando os empregados reféns de um modo de trabalho que fere a dignidade humana.
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1 BRASIL. Parecer ao Projeto de Lei nº 6.787, de 2016, do Poder Executivo, que "altera o Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 - Consolidação das Leis do Trabalho, e a Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, para dispor sobre eleições de representantes dos trabalhadores no local de trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras providências, pag. 49.
2 Cassar, Vólia Bonfim. Comentários à Reforma Trabalhista. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2017, pag. 46.
3 Cassar, Vólia Bonfim. Comentários à Reforma Trabalhista. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2017, pag. 46-47.
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*Lívia Vieira Santos é advogada e pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela UCAM - Universidade Cândido Mendes.