Contrato de trabalho intermitente: Receita Federal regulamenta a contribuição à previdência
A Receita Federal publicou a instrução normativa 1.867/19, que regulamentou à contribuição previdenciária trabalhadores intermitentes, dando-lhe tratamento tributário semelhante àquele observado por trabalhadores avulsos - que prestam serviços a várias empresas por intermédio de sindicatos.
terça-feira, 19 de março de 2019
Atualizado em 15 de março de 2019 12:42
De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED1, entre janeiro e dezembro de 2018 foram criadas 69.984 vagas de trabalho intermitente no Brasil, e houve 19.951 desligamentos de trabalhadores neste modelo, chegando-se ao saldo de 50.033.2 O número representa quase 10% do total de empregos criados no período, que foi de 529,5 mil.
Na modalidade do trabalho intermitente, o funcionário tem carteira assinada e presta serviços por períodos alternados, quando convocado pela empresa. O empregado intermitente é remunerado apenas pelos serviços prestados, assim que o trabalho é concluído. No pagamento recebido são inclusos os valores proporcionais de décimo terceiro salário e férias.
Contudo, ainda há um fator inibitório para o incremento desta modalidade, a insegurança jurídica que se insurge a partir da falta de regulamentação. Isto porque as regras sobre os direitos e contribuições devidas no novo tipo de contrato ainda são insuficientes, já que a medida provisória 808/17, que entrou em vigência adjuntamente à lei 13.467 e, ofereceu uma maior regulamentação sobre a modalidade de contratação, perdeu a validade em abril por não ter sido apreciada pelo Congresso, gerando uma lacuna sobre o tema.
Buscando este enfrentamento, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), publicou em 23 de maio de 2018, a portaria 349. O texto da portaria é uma cópia de trechos da MP 808/17. Quanto ao trabalho intermitente, a portaria diz que o contrato deve detalhar o local e o prazo para pagamento da remuneração, sendo que o valor da hora não pode ser inferior àquele pago aos demais empregados que exerçam a mesma função, tampouco ao valor por hora do salário mínimo.
Recentemente, em 28 de janeiro de 2019, a Receita Federal publicou a instrução normativa 1.867/19, que regulamentou à contribuição previdenciária trabalhadores intermitentes, dando-lhe tratamento tributário semelhante àquele observado por trabalhadores avulsos - que prestam serviços a várias empresas por intermédio de sindicatos.
De plano, a IN 1.867/19, estabelece que o trabalhador intermitente é segurado obrigatório da Previdência. Contudo, para que o tempo de trabalho seja computado no cálculo da aposentadoria, é preciso que o empregado pague a contribuição previdenciária equivalente a um salário mínimo.
Assim, se o funcionário contratado sob regime de trabalho intermitente receber valores inferiores a um salário mínimo, ele pode fazer a complementação da diferença entre a remuneração recebida e o valor do salário mínimo mensal, para que aquele período trabalhado conte como tempo de serviço.
A MP 808/17, trazia alguns contornos neste sentido3, no entanto, estabelecia que na hipótese de não ser feito o recolhimento complementar, o período sequer seria considerado para fins de aquisição e manutenção de qualidade de segurado do Regime Geral de Previdência Social nem para cumprimento dos períodos de carência para concessão dos benefícios previdenciários.
A IN 1.867/19 também estabelece que a base de cálculo inclui o valor proporcional pago em férias e décimo terceiro para o trabalhador intermitente. A alíquota varia de 8% a 11%, de acordo com a faixa salarial.
Neste pormenor nos cabe uma avaliação mais crítica, pois entendemos que, neste caso, haveria incidência de tributos sem ocorrência do fato gerador, violando os artigos 113 e 114 do Código Tributário Nacional (CTN). Isto porque, há um entendimento sedimentado pelas cortes superiores de que, se o trabalhador usufruiu as férias, a verba tem natureza remuneratória e, portanto, sobre ela incide contribuição.
Lado outro, as férias não gozadas, passam a ter natureza indenizatória e, sendo assim, não incide contribuição previdenciária, inclusive quanto ao terço constitucional. No caso do Trabalho intermitente, as férias são obrigatoriamente indenizadas ao final de cada período de prestação de serviço. Assim, a luz desta exegese, não deveria haver incidência de contribuição previdenciária.
Ainda, cabe citar que a IN 1.867/19 incluiu novos contribuintes da previdência, a exemplo de motoristas que disponibilizam serviços de transporte por intermédio de aplicativos e médicos participantes do programa Mais Médicos, além de estabelecer procedimentos para produtores rurais recolherem a contribuição previdenciária calculada sobre a folha de pagamentos (opção alternativa ao Funrural).
Acreditamos que estas normativas, tanto a portaria 349 do MPT quanto a IN 1.867/19 da Receita Federal, trazem a modalidade de trabalho intermitente maior segurança jurídica em sua aplicação, entretanto, ideal seria que o Congresso, a quem compete o poder legislativo, pudesse aperfeiçoar o instituto, que foi estabelecido pela reforma trabalhista, com uma regulamentação mais aprofundada.
Por fim cumpre salientar também, que o tema ainda é alvo de questionamento no STF, por meio das ADIns 5806, 5826, 5829 e 5950. O relator das ações é o ministro Edson Fachin, no entretanto, até o momento, nenhuma delas começou a ser apreciada.
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2 Vale ressaltar que os dados, apesar de indicarem crescimento nos intermitentes, mostram apenas o número de contratos firmados entre empresas e trabalhadores, assim, ainda carecem dados sobre quantas vezes cada trabalhador foi convocado para efetivamente atuar.
3 Art. 911-A, § 2º Incluído pela medida provisória nº 808, de 2017 (Vigência encerrada).
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*Kleber Correa da Silveira é analista jurídico no escritório Andrade Maia Advogados e membro-pesquisador do Grupo de Pesquisa - O Direito do Trabalho e Mundo Contemporâneo da UFRGS cadastrado junto ao CNPq.