Responsabilidade penal do médico em caso de morte
A responsabilização penal, pelos efeitos severos que produz, requer cautela na sua aplicação e é importante que os profissionais do direito tenham um mínimo de conhecimento acerca do trabalho exercido pelo médico, pois nem todo ato médico possui nexo de causalidade com o dano experimentado pelo paciente.
sexta-feira, 8 de março de 2019
Atualizado em 6 de março de 2019 11:50
É cediço que existe um dever do médico em face do cliente que se caracteriza pela personalidade e pela confiabilidade. A primeira característica aponta no sentido de que o médico deve exercer pessoalmente sua tarefa. Assim, nenhum paciente vai procurar um determinado especialista para ser atendido pelo seu assistente. Além disto, a confiabilidade pressupõe que o paciente se entrega por completo confiante da precisa atuação do médico, sendo estes dois pontos de relevância para aferir a responsabilidade jurídica do médico diante do paciente.
A busca pela justiça na aferição da responsabilidade do profissional médico por conduta equivocada é uma questão que não se pode perder de vista, deve ser respeitada de forma absoluta, desde que pautada em conhecimento cientifico concreto.
Um estudo realizado pelo IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar) em parceria com a Faculdade de Medicina da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), diz que 829 brasileiros morrem diariamente em hospitais públicos e privados por falhas que poderiam ser evitadas, ou seja, o número acima equivale a três mortes a cada cinco minutos.
Esta é a segunda causa de morte mais comum no Brasil., ficando atrás apenas das doenças cardiovasculares, responsáveis pela morte de 950 brasileiros por dia.1
Inúmeras podem ser as circunstâncias que acarretam o erro, mas convém destacar algumas:
- Deficiência na formação médico - universitária, agravada diante da crise enfrentada pelo sistema de ensino vigente, mormente nas universidades públicas pelo descaso das políticas voltadas para a valorização da educação.
- Acomodação do profissional que não procura especializar-se e atualizar-se em sua área de atuação profissional.
- Interesses meramente comerciais, nos quais o paciente é visto exclusivamente como o resultado pecuniário advindo do exercício da profissão, seja por iniciativa isolada do médico em especialidades rentáveis, ou em conjunto por meio de cooperativas ou empresas médicas comprometidas com o lucro.
- A falta de compromisso de alguns médicos, junto com a precária fiscalização do exercício profissional por parte das entidades de classe, que nem sempre procuram ajustar o profissional às normas éticas que regem seu oficio.
Devido a todos esses fatores é que vemos nas mídias uma grande quantidade de médicos que executam algum tipo de procedimento sem sequer possuir especialização, sendo que a grande maioria se dá na área de cirurgia estética, ocasionando traumas nos pacientes e sequelas irreversíveis, chegando até mesmo a ocasionar a morte.
O Código de Ética medica em seu art. 29 diz:
É vedado ao médico praticar atos profissionais danosos ao paciente que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligencia.
O código penal em seu art. 18, II, diz que o crime é culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, imperícia ou negligencia.
Assim, se um homicídio ou lesão ocorre em decorrência de um mal atuar do profissional, aplica-se de logo, uma causa de aumento de pena prevista no § 4º do art. 121 ou na hipótese de lesão corporal § 7º do art. 129 do Código Penal.
É estranho pensar que o profissional que jurou exercer seu oficio, visando a preservação da vida do paciente, aja de modo a conduzi-lo ao óbito. Nesses casos, o mais comum é o médico agir com negligência e, por isso, responder pelo homicídio culposo.
Sendo o homicídio praticado culposamente, o Código Penal prevê a pena de um a três anos de detenção, conforme art. 121, § 3º do Código Penal. Contudo, poderá ser aumentado em um terço se o crime resultar de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou oficio, ou se o agente deixar de prestar socorro à vítima, não procurar diminuir as consequências do seu ato, ou fugir para evitar prisão em flagrante.
Logo, a problemática que o tema envolve e as graves consequências do erro no agir do médico, requer a compatibilização do direito médico com as normas de cunho penal.
A responsabilização penal, pelos efeitos severos que produz, requer cautela na sua aplicação e é importante que os profissionais do direito tenham um mínimo de conhecimento acerca do trabalho exercido pelo médico, pois nem todo ato médico possui nexo de causalidade com o dano experimentado pelo paciente. Contudo, pode haver situações em que a negligência médica será fator determinante para o dano ao paciente, ou até mesmo o agir médico de forma precipitada e errônea agravará o quadro clínico, podendo em seus casos mais graves ocasionar graves sequelas e até mesmo a morte do paciente.
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*Rotieh Machado Carvalho é sócio-supervisor da Jacó Coelho Advogados.