Tratamento contábil da exclusão do ICMS do PIS/Cofins
Preocupada com essa questão de vital importância nos relatórios das demonstrações financeiras de 2018 das companhias abertas, a CVM publicou o ofício-circular 01/19, estabelecendo novas orientações quanto a aspectos relevantes a serem observados, especialmente quanto aos efeitos do ICMS na base de cálculo do PIS e Cofins.
quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019
Atualizado em 26 de fevereiro de 2019 15:29
O tratamento contábil a ser adotado para o reconhecimento no encerramento das demonstrações financeiras de 31/12/18 pelas companhias abertas e demais empresas, relativamente aos efeitos da decisão proferida em sede de repercussão geral pelo STF no julgamento do RE 574.706, que considerou inconstitucional a inclusão do valor do ICMS na base de cálculo das contribuições PIS e COFINS, tem gerado inúmeras discussões entre os administradores das companhias e as empresas de auditoria, que relutam em permitir que sejam contabilizados tais efeitos antes do trânsito em julgado da ação judicial.
Entendem as auditorias, com base em interpretação das Normas Brasileiras de Contabilidade que dispõe sobre as contingências ativas, em especial o pronunciamento técnico CPC 25 (IAS 37) e o ofício-circular CVM 002/11 que, no caso de ações judiciais, mesmo que a administração julgue como provável o ganho de causa, caso ainda caiba recurso da Procuradoria da Fazenda Nacional (PGFN), a situação não é ainda considerada praticamente certa e, portanto, o ganho não deve ser registrado.
Porém, preocupada com essa questão de vital importância nos relatórios das demonstrações financeiras de 2018 das companhias abertas, a CVM publicou o ofício-circular 01/19, estabelecendo novas orientações quanto a aspectos relevantes a serem observados, especialmente quanto aos efeitos do ICMS na base de cálculo do PIS e Cofins.
Segundo este novo ofício-circular, a administração da companhia, em conjunto com seus assessores e com a validação da auditoria, deve verificar a situação concreta de cada processo judicial, para sendo o caso, desde já reconhecer ou não os ganhos dele decorrentes.
Portanto, não se trata mais de apenas verificar, como vinha até então ocorrendo, se a Fazenda Nacional possui a faculdade processual de ingressar com eventual novo recurso, para com isso concluir pela impossibilidade de reconhecer imediatamente os ganhos do processo judicial em suas demonstrações financeiras, mas de analisar a possibilidade que tem tal recurso de prosperar e obstar o reconhecimento do direito postulado pelo contribuinte.
Neste mesmo ofício-circular, a CVM menciona que, não obstante o entendimento da PGFN, no sentido de que os tribunais devem aguardar a análise dos embargos de declaração já apresentados ao STF, processos relacionados ao tema têm avançado e até transitado em julgado. Observa que, em decisão monocrática proferida em 9/8/18, o ministro do STF Celso de Mello, negou seguimento à reclamação 30996, ajuizada pela União, pontuando que a jurisprudência do STF é no sentido de que, para a aplicação da decisão proferida no RE 574.706, com repercussão geral, não é necessário o trânsito em julgado ou eventual modulação de efeitos.
O pronunciamento da CVM no ofício-circular 01/19 está correto pois não faz sentido tratar igualmente situações que podem ser totalmente distintas. Como ela mesmo observa, há processos sobre esta matéria com trânsito em julgado, outros em que sequer há sentença de primeiro grau, cada qual merecendo análise específica por parte da administração da companhia e sua auditoria.
Nesse sentido a CVM é enfática ao esclarecer que "um bom juízo de valor deve ser levado a feito caso a caso", sendo indispensável "uma boa divulgação em nota explicativa das decisões tomadas pela administração da companhia, bem como as bases sobre as quais estão assentadas, e os efeitos dessas decisões sobre o balanço patrimonial, a demonstração do resultado e a demonstração dos fluxos de caixa".
O princípio da competência determina que o reconhecimento dos resultados ocorra pari passu com sua realização.
Se tal reconhecimento não puder ser efetuado pela possibilidade de que a Fazenda ingresse com algum recurso, mesmo que a matéria já tenha sido julgada com repercussão geral em favor do contribuinte, este princípio restará de difícil observância e aplicação no Brasil, pois após o trânsito em julgado ainda existe a possibilidade de ação rescisória e, além disso, o contribuinte obrigatoriamente deverá habilitar seu crédito perante a Receita Federal.
O não reconhecimento do crédito com base no princípio da competência determina o claro de risco de misleading, que é o de as demonstrações financeiras não espelharem corretamente a situação da entidade naquele dado momento, ensejando prejuízo dos investidores do mercado de capitais, razão pela qual a CVM optou por publicar o novel ofício-circular para que essa questão seja devidamente esclarecida nas demonstrações financeiras.
Este é o sentido da nova orientação da CVM, que visa trazer o princípio da competência para a discussão do ICMS na base de cálculo do PIS e Cofins, ensejando o reconhecimento do ganho tributário quando demonstrado por um bom juízo de valor que sua realização é praticamente certa, hipótese em que o ativo deixa de ser considerado uma contingência ativa, tornando as demonstrações financeiras mais fidedignas e aderentes a realidade da entidade no momento de sua elaboração e divulgação.
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*Alberto Brentano é sócio do escritório Silveiro Advogados.
*Sergio Lewin é sócio do escritório Silveiro Advogados.