Autogoverno do TJ/SP
Espera-se que as instituições não se dirijam a um caminho burocrático e tortuoso, buscando, ao contrário, como é desejado nesse tipo de conflito, a via da resolução amigável da pendência.
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019
Atualizado às 08:21
Causaram estranheza e perplexidade os eventos ocorridos no final da última semana, em que o Tribunal de Justiça de São Paulo informou, na sua página inicial da internet, com repercussão em toda mídia, a contratação bilionária da empresa Microsoft para a transformação digital do Tribunal, incluindo novo sistema de tramitação processual. Mas não foi só!
O Conselho Nacional de Justiça, de ofício, e após deliberação do Conselheiro Marcio Schiefler Fontes, determinou à administração do Tribunal de Justiça de São Paulo que se abstivesse de "praticar qualquer ato tendente a concretizar ou dar execução à contratação noticiada antes de assim autorizado pelo Conselho Nacional de Justiça".
Diante de tais graves fatos, não há como os partícipes da atividade forense se calarem.
Em primeiro lugar, não obstante a qualidade e competência dos ilustres Conselheiros do CNJ, que vêm prestando relevantes serviços à sociedade, não nos parece, com o devido acatamento, que uma notícia veiculada em sítio da internet, repercutindo declaração do presidente do maior Tribunal de Justiça do Brasil, e quiçá das Américas, possa justificar uma medida unilateral e abrupta. Isso porque, de um lado, considerando inclusive a presunção de legalidade e boa-fé dos atos administrativos, nada impedia a prévia notificação dos gestores do Tribunal para que explicassem as medidas que estão sendo adotadas, até mesmo em homenagem ao princípio constitucional do autogoverno de nossos Tribunais (artigo 99 da Constituição Federal). Nesse sentido, não se mostra crível que os elevados valores da contratação, pelo Tribunal que responde por mais de 40 milhões de processo, sejam, por si só, razão para tal deliberação.
De outro turno, relevante salientar que as decisões administrativas dos Tribunais Estaduais, tanto quanto dos Federais, não são dependentes de autorizações do CNJ, na medida em que essas Cortes de Justiça devem se pautar pela observância dos limites da atuação, livre e altaneira, pontuados em nossa Constituição. Aliás, já se discutiu que somente as regras gerais do processo eletrônico devem ser centralizadas e unificadas, com o objetivo de propiciar a interoperabilidade do sistema. No mais, cabe a cada Tribunal regulamentar o seu sistema e procedimentos. Isso decorre, inclusive, da estrutura de nossa Federação, cujo rol de competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios vem estabelecido com significativa especificidade em nossa Constituição.
Com relação ao Tribunal de Justiça de São Paulo, apesar da autonomia que lhe é atribuída constitucionalmente, além da amplitude de atuação que decorre do princípio constitucional do autogoverno, parece-nos, com a devida vênia, que uma alteração do porte daquela que vem sendo divulgada justificaria a prévia discussão com os partícipes da atividade forense (Advocacia, Ministério Público, Defensoria Pública) para que, longe de criarem óbices, possam prover subsídios e sugestões para que a modernização pretendida não provoque qualquer impacto negativo nos jurisdicionados, além da desejada e necessária adesão ao projeto em gestação.
Em apertada síntese, espera-se que as instituições não se dirijam a um caminho burocrático e tortuoso, buscando, ao contrário, como é desejado nesse tipo de conflito, a via da resolução amigável da pendência, podendo, tal como ocorreu à época da implantação do processo eletrônico no TJ/SP, com a presença de instituições representativas da advocacia, dentre elas a Associação dos Advogados de São Paulo - AASP, ser realizada uma audiência de conciliação para que a questão seja dirimida rapidamente.
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*Arystóbulo de Oliveira Freitas é sócio do escritório Arystóbulo Freitas Advogados.