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As garantias para liberação de crédito de cota de consórcio

Finalmente cumpre afirmar que a LC responsabiliza a administradora em caso de liberação de crédito com garantia insuficiente (inclusive se houver uma substituição, autorizada pela administradora, da garantia original por outra no decorrer da marcha consorcial).

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Atualizado em 3 de outubro de 2019 17:19

A lei 11.795/08 (Lei de Consórcio - LC) é o diploma legal que traz as disposições norteadoras de todo o sistema consorcial nacional, sendo complementada por normativos emanados pela autoridade fiscalizadora1, que é o Banco Central do Brasil.

Sendo assim a Lei de Consórcio afirma categoricamente de que o contrato deve prever, de forma clara, as garantias que serão exigidas do consorciado para que ele venha a utilizar o crédito (art. 142).

Se trata de princípio básico de redação contratual, especialmente em se tratando de um contrato por adesão (art. 103 da LC), a fim de que o contratante tome conhecimento prévio do que lhe será exigido no momento de utilização do crédito.

O que gera dúvida ao consorciado é saber qual garantia ele poderá atrelar (vincular / alienar) ao contrato de consórcio contemplado.

Quando da adesão a um plano de consórcio há a prévia estipulação de um bem (valor) de referência. Com base nesse bem o crédito é ajustado4, tudo nos termos do contrato.

Esse bem de referência simplesmente fornece um direcionamento sobre quanto o consorciado contemplado terá à sua disposição quando da contemplação para aquisição de um bem (serviço) que seja de seu interesse.

O valor do crédito será sempre o do bem (serviço) de referência ao valor do momento da contemplação, podendo o consorciado adquirir qualquer outro, se da mesma natureza, de valor igual, superior ou inferior.

Independentemente do bem a ser adquirido uma regra é básica: a garantia (alienação fiduciária, por exemplo) deve recair no bem adquirido pelo consorciado (§1º5 do artigo 14 da LC).

Essa obrigatoriedade (em regra) visa impedir que o consórcio seja desnaturado com o uso, por exemplo, do crédito como capital de giro (uso do crédito para pagamento de uma dívida, refinanciamento de um bem junto a banco, etc., tendo como bem alienado um veículo já de propriedade do consorciado).

O bem que ficará alienado (ou qualquer outra que seja a garantia vinculada ao contrato) deve ser aquele efetivamente adquirido pelo consorciado, pois essa é a natureza do sistema: propiciar que bens sejam adquiridos com o crédito consorcial decorrente da contribuição da coletividade de consorciados presentes no grupo.

Como afirmado a regra comporta exceção quando o bem adquirido é imóvel. Nesse caso o imóvel adquirido pode ser diverso do alienado, contanto que este último seja de valor suficiente para assegurar o cumprimento das obrigações pecuniárias do consorciado contemplado em favor do grupo (§2º6 do artigo 14 da LC).

Hipóteses de aplicação da exceção supracitada é o consorciado que aliena fiduciariamente imóvel residencial utilizando o crédito em casa de veraneio em ilha, ou ainda em local em que a administradora entenda, de forma clara e objetiva, que o bem ofertado não garanta a dívida em caso de inadimplência, aceitando outro que proteja financeiramente o grupo.

Quanto a tal ponto é importante salientar que a exceção somente admite a alienação de um imóvel por outro. Não há autorização para que o crédito seja utilizado na aquisição de bem móvel enquanto a alienação fiduciária ocorre em bem imóvel.

Outra exceção é no caso de consórcio de serviços (uma cirurgia plástica em que a garantia é uma nota promissória, por exemplo); ou quando o bem estiver em produção, incorporação ou situação análoga definida pelo Banco Central do Brasil (§3º7 do artigo 14 da LC).

No caso de bem que esteja em produção, por exemplo, a administradora deve se munir de documentos e informações que sustentem tal análise de crédito, evitando que a ansiedade do consorciado por alguns dias (até que o veículo seja produzido, por exemplo) faça com que a garantia seja atribuída, desnecessariamente, a coisa diversa da adquirida.

A administradora pode (ainda) exigir garantias complementares proporcionais ao valor do débito vincendo.

Essa exigência deixa ao arbítrio da administradora essa análise e escolha sobre quais os casos em que o consorciado terá de "reforçar" o valor de garantia atrelado à sua cota de consórcio.

A administradora de consórcios terá de criar critérios objetivos dentro dessa subjetividade da norma legal. A previsão em contrato de dissabores práticos ocorridos em casos pretéritos é a melhor forma de a administradora blindar o grupo de consórcio de uma liberação de crédito em caso que a complementação de garantia deveria ser exigida.

Exemplo clássico é o do carro, cuja desvalorização é evidente. Imagine que um consorciado queira adquirir um veículo cuja maturidade (ano de fabricação) seja alta, mas que no momento da contemplação e análise de crédito garanta a dívida existente.

Ocorre que o bem de referência do contrato é veículo moderno e cujo reajuste é esperado pelos próximos anos. Sendo assim, enquanto o bem que o consorciado deseja desvaloriza, o crédito reajusta. Em determinado momento, durante a marcha consorcial, em caso de inadimplência, a garantia (possivelmente) não será suficiente para saldar a dívida.

Outros exemplos são cabíveis e, por isso, vale reafirmar que a previsão contratual de situações objetivas para o critério legal subjetivo evita questionamentos dos consorciados e justifica de exigência de reforço de garantia ao Banco Central do Brasil, tornando transparente a relação contratual, inclusive para aplicação plena dos termos do Código de Defesa do Consumidor.

Caso haja dúvida consistente vigora a máxima de que se beneficia a coletividade (ou o grupo), mesmo que em detrimento do consorciado cujo caso é analisado naquele momento, exatamente como preceitua o §2º do artigo 03º da LC.

Esse "interesse privilegiado" não é desarrazoado já que uma liberação de crédito com garantia insuficiente, indevida, etc., prejudica exatamente o grupo em benefício de um ou alguns.

O grupo deve se manter saudável durante todo seu trâmite, especialmente nos casos dos de longa duração, evitando que em caso de inadimplência a garantia dada não seja suficiente em caso de recuperação para saldar o débito.

Finalmente cumpre afirmar que a LC responsabiliza a administradora em caso de liberação de crédito com garantia insuficiente (inclusive se houver uma substituição, autorizada pela administradora, da garantia original por outra no decorrer da marcha consorcial).

Caso existam divergências de entendimentos cabe ao consorciado a via judicial para buscar que o magistrado da causa defina se a garantia é ou não suficiente, se um bem pode ou não ser alienado, etc.

Entendo ainda que a via contrária também é cabível, a fim de que a administradora compelida (por exemplo) por decisão do Banco Central do Brasil a mudar seu critério de análise de crédito, busque no judiciário o entendimento sobre o tema, considerando ser ato ilícito do órgão fiscalizador determinar ação que prejudique o grupo, ferindo norma legal, cabendo análise judicial.

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1 Importante afirmar que o presente texto focará nas disposições contidas na Lei de Consórcio. Vale afirmar que a Circular 3432 do Banco Central do Brasil detalha, por exemplo, questões que devem ser previstas em contrato, os bens que podem ser adquiridos (inciso XIII do art. 05º, por exemplo), dentre outras questões e especificidades do sistema de consórcio.

2 Art. 14. No contrato de participação em grupo de consórcio, por adesão, devem estar previstas, de forma clara, as garantias que serão exigidas do consorciado para utilizar o crédito.

3 Art. 10. O contrato de participação em grupo de consórcio, por adesão, é o instrumento plurilateral de natureza associativa cujo escopo é a constituição de fundo pecuniário para as finalidades previstas no art. 2º.

4 Importante afirmar que o crédito não é somente "reajustado", mas sim "ajustado", podendo sofrer variações para mais ou menos, a depender do bem de referência e as estipulações contratuais.

5 § 1º As garantias iniciais em favor do grupo devem recair sobre o bem adquirido por meio do consórcio.

6 § 2º No caso de consórcio de bem imóvel, é facultado à administradora aceitar em garantia outro imóvel de valor suficiente para assegurar o cumprimento das obrigações pecuniárias do contemplado em face do grupo.

7 § 3º Admitem-se garantias reais ou pessoais, sem vinculação ao bem referenciado, no caso de consórcio de serviço de qualquer natureza, ou quando, na data de utilização do crédito, o bem estiver sob produção, incorporação ou situação análoga definida pelo Banco Central do Brasil.

8 § 2º O interesse do grupo de consórcio prevalece sobre o interesse individual do consorciado.

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*José Tito de Aguiar Junior é advogado e pós-graduado em Direito Processual Civil.

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