CVM edita parecer sobre contratos de indenidade
O cumprimento formal das orientações do parecer não exime os administradores de suas responsabilidades, caso sua atuação não atenda às finalidades e objetivos regulatórios que informaram sua edição.
quarta-feira, 10 de outubro de 2018
Atualizado em 25 de setembro de 2019 15:16
A CVM editou, em 25 de setembro de 2018, o parecer de orientação 38, que trata de contratos de indenidade, ou seja, contratos em que a companhia assume a obrigação de indenizar o administrador por perdas sofridas no desenvolvimento de suas atribuições na companhia, em especial no que se refere à relação entre esses contratos e os deveres fiduciários que devem ser observados pelos administradores. O parecer foi aprovado pelo colegiado da autarquia em reunião realizada em 29 de agosto de 2018.
A CVM reconhece os possíveis benefícios da celebração de contratos de indenidade entre companhias e seus administradores, em particular o incentivo gerado à atração e retenção de profissionais qualificados. Por outro lado, reconhece também que esses contratos podem gerar incentivos inadequados para os administradores e que a própria celebração desses contratos pode refletir uma situação de conflito de interesses.
Diante disso, a autarquia recomenda regras e procedimentos para mitigar potenciais conflitos de interesse na celebração de contratos de indenidade entre companhias abertas e seus administradores. As regras são aplicáveis também à previsão de regras de indenidade equivalentes por outros meios, como regras estatutárias e políticas e regimentos internos.
O parecer de orientação abordou, dentre outros, os seguintes aspectos sobre tais contratos de indenidade: (i) a delimitação das possíveis perdas indenizáveis; (ii) a deliberação prévia sobre sua celebração; (iii) os parâmetros para os procedimentos internos de decisão sobre a indenização, ou não, de determinadas perdas, no caso concreto; e (iv) a divulgação de informações relacionadas a contratos de indenidade.
1. Delimitação das perdas indenizáveis.
Em primeiro lugar, a CVM recomenda que nem todas as perdas sofridas por administradores, ainda que relacionadas às suas atribuições na companhia, sejam passíveis de indenização no âmbito de contratos de indenidade.
Destacam-se, dentre as perdas tidas por não indenizáveis, aquelas decorrentes de: (i) atos do administrador fora do exercício de suas atribuições na companhia; (ii) atos praticados com má-fé, dolo, culpa grave ou fraude do administrador; e (iii) atos praticados em interesse próprio ou de terceiros, em detrimento do interesse social da companhia. A CVM recomenda que tais excludentes sejam previstas nos contratos de indenidade e que sejam verificadas previamente a qualquer decisão sobre a liberação, ou não, da indenização ao administrador em determinada situação.
2. Deliberação prévia sobre a celebração de contratos de indenidade.
A CVM considera ser desejável que, antes da celebração de um contrato de indenidade, a diretoria elabore um parecer circunstanciado, com os fundamentos que indiquem como o contrato mitiga os riscos de conflito de interesse e equilibra os interesses envolvidos, e que esse parecer seja aprovado pelo conselho de administração.
3. Procedimentos internos de decisão sobre indenização.
A CVM recomenda que as companhias adotem procedimentos internos claros e objetivos para a tomada de decisão sobre a indenização de seus administradores, inclusive quanto à autorização do pagamento, reembolso ou adiantamento dos valores correspondentes, de forma independente e no interesse social.
Dentre as regras procedimentais, a autarquia destaca que os contratos de indenidade devem especificar inclusive: (i) o órgão responsável pela verificação da ocorrência de excludentes de indenização; e (ii) os procedimentos para que os administradores envolvidos na potencial indenização não participem da referida verificação.
A CVM entende, ainda, que a submissão da matéria a deliberação assemblear, e outros procedimentos adicionais de governança, devem ser considerados caso: (i) mais da metade dos administradores seja beneficiária direta em determinada deliberação sobre o dispêndio de recursos para fins de indenização; (ii) haja divergência sobre a possibilidade, ou não, de indenizar determinada perda; ou (iii) haja exposição financeira significativa da companhia.
4. Divulgação de informações.
A CVM recomenda a divulgação dos contratos de indenidade celebrados pelas companhias e seus administradores, bem como determinadas informações referentes a tais contratos.
Dentre as informações a serem divulgadas, destacam-se: (i) a existência, ou não, de previsão estatutária sobre a indenidade; (ii) a existência, ou não, de valor de limite máximo de indenidade; (iii) o prazo da obrigação de indenizar da companhia; (iv) os administradores elegíveis para a celebração de contratos de indenidade; (v) as excludentes de indenidade; (vi) a natureza das perdas indenizáveis; e (vi) o procedimento interno referente a decisões sobre indenização, inclusive quanto ao pagamento, reembolso ou adiantamento dos valores correspondentes.
Enquanto não houver regulamentação específica sobre a forma de divulgação de tais informações, as companhias deverão observar as orientações da superintendência de relações com empresas (SEP) sobre a matéria. Até o momento, há apenas um novo item (contratos de indenidade) no sistema empresas.net para a divulgação dos contratos de indenidade celebrados com administradores.
A CVM ressalta, por fim, que o cumprimento formal das orientações do parecer não exime os administradores de suas responsabilidades, caso sua atuação não atenda às finalidades e objetivos regulatórios que informaram sua edição.
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*Anelise Paschoal Garcia Duarte é advogada do escritório Lilla, Huck, Otranto, Camargo Advogados.
*Bruno Robert é advogado do escritório Lilla, Huck, Otranto, Camargo Advogados.
*Lucas Carneiro Gorgulho Mendes Barros é advogado do escritório Lilla, Huck, Otranto, Camargo Advogados.
*Tiago Molina Ferreira é advogado do escritório Lilla, Huck, Otranto, Camargo Advogados.