Três coisas que você precisa saber sobre investimentos em startups
As startups são empreendimentos de alto risco, e os investidores sabem disso.
quinta-feira, 16 de agosto de 2018
Atualizado em 26 de setembro de 2019 16:46
Se você é sócio de uma startup, certamente já pensou em receber investimentos. Além de saber fazer um bom pitch para vender bem a sua ideia, existem algumas informações jurídicas importantes que você precisa aprender sobre o assunto.
Sim! Apesar de a palavra "jurídico" remeter a noções como burocracia, lentidão e entraves (e é verdade, infelizmente, que essa associação não é totalmente errada), a startup pode (e deve) se utilizar de conhecimentos jurídicos para evitar dores de cabeça no futuro.
#1 Investimentos, no plural
Dificilmente uma startup receberá um único investimento ao longo de seu processo de crescimento.
Logo no início, na fase de ideação da startup, é comum que os próprios sócios precisem financiar o desenvolvimento da sua ideia: é o chamado bootstrapping. Também esta é a fase de recorrer aos famosos três F's, Friends, Family and Fools (amigos, família e tolos).
Depois disso, são diversas as possibilidades de investimento: (equity) crowdfunding, seed capital, venture capital, private equity, aceleradoras, entre outros. O tipo de investidor ideal vai mudar, a depender do lugar em que sua startup estiver, no caminho entre o MVP e o IPO.
Pensando na longa jornada que há pela frente, nas primeiras rodadas de investimentos, que normalmente envolvem valores menores, é importante não comprometer uma parcela muito significativa do seu capital social.
O recomendado é que a primeira rodada não ultrapasse 15% do capital, mas isso vai depender da análise de cada caso, considerando variáveis como valuation da startup, valor do aporte, relevância do investidor para o ecossistema, entre outros.
O importante é ter em mente - na hora de negociar com o investidor a sua participação no capital social - que a startup passará por outras rodadas de investimentos. Por essa razão, comprometer uma parcela muito grande do capital logo no início pode acabar implicando a diluição dos sócios fundadores no futuro.
#2 Nem sempre seu investidor vai querer se tornar seu sócio de cara
As startups são empreendimentos de alto risco, e os investidores sabem disso.
Seis a cada dez startups brasileiras fecham as portas em até cinco anos de atividade. Com o seu encerramento, não é incomum restarem dívidas a serem pagas, sejam elas bancárias, trabalhistas, tributárias ou de outras naturezas. Essas dívidas podem atingir os ex-sócios e, até mesmo, o sócio investidor.
Por essa razão, muitos investidores adotam a estratégia de não se tornarem sócios da startup no primeiro momento: emprestam dinheiro para a startup (operação de debt) e, se tudo der certo, convertem o empréstimo em participação no capital social da startup (operação de equity). Para isso, existem vários instrumentos jurídicos possíveis, como os convertible papers, o mútuo conversível e as debêntures conversíveis.
Ao firmar esses instrumentos, algumas cautelas são necessárias. É necessário avaliar com cuidado as regras de conversão e não conversão do débito: o investidor estará obrigado a converter em alguma hipótese? Ou a conversão é uma escolha dele, puramente discricionária? Além disso, caso o investidor decida não converter o débito em capital social, o que acontecerá com a dívida? A startup precisará pagar o empréstimo? Com juros e multa? Ou a dívida será perdoada? Ainda sobre esse assunto, é relevante observar que, em caso de perdão de dívida, haverá incidência de imposto sobre doação (ITCMD), cujo cálculo e procedimento de recolhimento varia de estado para estado.
É imprescindível que as regras estejam claras para as partes e bem estabelecidas nos instrumentos contratuais.
#3 Cuidado com o poder dos investidores
Tudo deu certo até agora: sua startup fez um bom pitch, conseguiu um investidor relevante, negociou uma fatia razoável do seu capital e decidiu quais os termos gerais da operação de investimento.
Falta, contudo, negociar as regras do jogo.
Investidores em geral - invistam eles em startups ou não - normalmente exigem algum poder sobre o rumo dos negócios da investida. Isso é natural, afinal eles querem saber o que será feito com o dinheiro investido.
Os poderes variam conforme o estágio da empresa e vão desde a indicação de um diretor financeiro até a possibilidade de veto em questões como a distribuição de lucros e remuneração dos diretores.
É importante, ao negociar o contrato de investimentos, encontrar o ponto de equilíbrio entre o desejo dos investidores e dos empreendedores.
Não é razoável condicionar toda e qualquer decisão da startup à anuência dos investidores (isso dificultaria, inclusive, futuras rodadas de captação de investimentos). Mas também sabemos que os investidores apenas fecharão negócio se possuírem o mínimo de controle sobre seu investimento.
Nessa hora, é imprescindível estar acompanhado de um bom advogado, capaz de defender os seus interesses sem estressar a relação com o investidor, e que use o conhecimento jurídico contra (e não a favor) da burocracia, da lentidão e dos entraves.
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*Marcelle Penha é advogada na área empresarial do escritório Martorelli Advogados e líder da iniciativa MA4Startups.