Faculdade da contribuição sindical à luz da lei 13.467/17 e da decisão do STF na ADIn 5794
O que se espera com este novo cenário é uma atuação cada vez mais presente dos sindicatos, buscando os interesses dos seus sindicalizados nas relações de trabalho e não apenas a arrecadação contributiva.
quinta-feira, 19 de julho de 2018
Atualizado em 25 de setembro de 2019 17:00
O Brasil, desde a Era Vargas (1930-1945), busca evoluir constantemente nos direitos sociais previstos para todo cidadão, objetivando, prioritariamente, uma legislação que procure melhorar as condições de vida dos trabalhadores, criando regramentos sobre educação, saúde, cultura e trabalho. Neste cenário, construído através de lutas sociais marcantes ao longo do século XX no país, editou-se a CLT, no ano de 1943, para normatizar direitos e deveres outrora inexistentes, sendo, até o presente momento, a maior referência legislativa sobre o tema no Brasil.
Apesar de remontar à Revolução Industrial, o movimento sindical ganhou forma mais robusta no Brasil a partir da vigência da CLT. Os sindicatos têm como objetivo atuar visando o interesse da coletividade que representa e uma menor interferência do Estado nas relações trabalhistas. Assim, os sindicatos passaram a ter papel essencial nas relações de trabalho, participando das negociações entre empregados e empregadores através de normas coletivas ou outras formas de representatividade.
Como meio de fortalecer a atuação dos sindicatos e auxiliar na manutenção e sobrevivência deles, em troca de uma suposta independência em suas atuações, foi criado o imposto sindical, previsto na CLT em seu art. 579, o qual, até então, tinha pagamento de caráter obrigatório por todos os trabalhadores que participassem de uma determinada categoria econômica ou profissional.
Mesmo após a CF de 1988 e as evoluções legislativas surgidas desde então, a CLT permaneceu intacta, exigindo uma profunda análise de seus termos em virtude das modificações evidenciadas nas relações de trabalho ao longo dos anos. Vários de seus dizeres são oriundos de uma época na qual não havia previsão de labor nos formatos hoje exercidos, como o surgimento do home office e do trabalho terceirizado, até então sem previsão legislativa.
Visando uma adequação à realidade atual, foi aprovada e promulgada a lei 13.467/17, que prevê em seu texto inúmeras modificações das normas da CLT, e cujo objetivo é modernizar as relações de trabalho, e normatizar, ou atualizar, pontos que sofreram substancial modificação fática ao longo dos anos.
Dentre estas modificações, um ponto alterado foi a obrigatoriedade do imposto sindical outrora estabelecida:
"Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação." (destaque nosso)
Dessa forma, a lei passa a prever o caráter facultativo da cobrança desse desconto, que fica condicionado a uma autorização expressa e prévia do trabalhador para que tenha a sua validade reconhecida.
Muitos sindicatos, país afora, impetraram medidas contra esta inclusão normativa alegando que tal inserção seria inconstitucional e que, por este motivo, não suportaria modificações no formato realizado pelo legislador. Além disso, alguns sindicatos elevaram o tom da discussão ao arrazoar seus pedidos com base em entendimento da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas), consolidado em um de seus enunciados aprovados na 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, que relata ser passível uma autorização coletiva e não individual para este desconto, senão vejamos:
"CONTRIBUIÇÃO SINDICAL
I - É lícita a autorização coletiva prévia e expressa para o desconto das contribuições sindical e assistencial, mediante assembleia geral, nos termos do estatuto, se obtida mediante convocação de toda a categoria representada especificamente para esse fim, independentemente de associação e sindicalização.
II - A decisão da assembleia geral será obrigatória para toda a categoria, no caso das convenções coletivas, ou para todos os empregados das empresas signatárias do acordo coletivo de trabalho.
III - O poder de controle do empregador sobre o desconto da contribuição sindical é incompatível com o caput do art. 8º da Constituição Federal e com o art. 1º da Convenção 98 da OIT, por violar os princípios da liberdade e da autonomia sindical e da coibição aos atos antissindicais."
Diante deste cenário, e em virtude das inúmeras demandas instauradas por estes Entes sindicais visando taxar como ilegal a aplicabilidade da nova redação do art. 579 da CLT, o STF julgou, no último dia 29/6/18, a constitucionalidade do referido artigo, por 6 votos favoráveis a 3 contra, com prevalência do entendimento exposto pelo ministro Luiz Fux, de que não se pode admitir a imposição da contribuição sindical aos trabalhadores e empregadores quando a CF determina que ninguém será obrigado a se filiar ou a se manter filiado a qualquer entidade sindical, não havendo, por fim, ofensa à Carta Magna.
A constitucionalidade do art. 579 da CLT e, portanto, a faculdade quanto ao recolhimento do imposto sindical, baseia-se na liberdade associativa constitucionalmente prevista, ampliando a liberdade do indivíduo ou da empresa em escolher ou não pela associação a um sindicato e à sua correspondente contribuição representativa.
Sabe-se que este imposto, outrora obrigatório, é importante para a manutenção dos sindicatos, mas a sua imposição não poderia mais imperar em uma época que prevalece a liberdade de expressão, associação e de condução dos atos por cada indivíduo.
Com a prevalência expressa no art. 579 da CLT, aqueles que desejarem contribuir com os sindicatos devem autorizar o seu empregador, de forma expressa e prévia, a processar os descontos pertinentes em seus vencimentos. Para isso, evitando questionamentos futuros, o aconselhável é que aquele que desejar contribuir com a sua entidade sindical, o faça através de carta redigida e próprio punho, entregando-a ao seu empregador que a encaminhará à entidade sindical correspondente.
Um ato coletivo ou uma autorização tácita pode ser discutida judicialmente, sendo aconselhável a formalização do desejo do empregado quanto ao desconto, no formato relatado, para que não se opere em ato ilegal.
A efetiva participação do sindicalizado fica preservada, fazendo prevalecer a autonomia de sua vontade, devendo o ente sindical perseverar na defesa dos interesses de seus membros.
A importância do sindicato permanece e é essencial para a relação de trabalho no país, sendo inclusive valorada nas modificações propostas pela lei 13.467/17 quando, por exemplo, trata sobre a prevalência de alguns direitos acordados sobre o legislado, ou mesmo da necessidade de intervenção sindical nas homologações de termos de quitação anual de débitos entre empregado e empregador.
O que se espera com este novo cenário é uma atuação cada vez mais presente dos sindicatos, buscando os interesses dos seus sindicalizados nas relações de trabalho e não apenas a arrecadação contributiva, sendo mero reflexo de suas atuações o pagamento da contribuição prevista no art. 579, pouco importando o seu caráter obrigatório ou facultativo, pois com a satisfação do sindicalizado a contribuição acabará por ser um ato contínuo.
É cediço por todos que a participação sindical é importante para a validação e preservação dos direitos coletivos, devendo aqueles que assim o quiserem, continuar a contribuir, pois a sua existência colabora para a validação extrajudicial de atos e, consequentemente, a um desafogo do poder Judiciário.
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*Felipe Cunha Pinto Rabelo é advogado trabalhista, sócio-diretor do escritório Abdalla, Landulfo e Zambrotti, especialista em Direito Público pela PUC/MG, especialista em Consultoria Jurídica Empresarial pelo Centro Universitário UniSEB, mestrando em Direito pela Faculdade Milton Campos (BH).