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Reforma trabalhista - contribuição sindical e a atual insegurança jurídica

Definida a natureza jurídica tributária da contribuição sindical, importante a análise de como se dá a constituição desse crédito pelas vias ordinárias.

terça-feira, 22 de maio de 2018

Atualizado às 08:54

A hoje tão discutida, a contribuição sindical patronal e por categoria profissional, conhecida como imposto sindical, é devida por força do artigo 149 da Constituição Federal e artigo 578 e seguintes da CLT.

Em relação a sua natureza jurídica, o STF pacificou entendimento no sentido de se tratar de espécie tributária distinta, que não se confunde com o imposto. A contribuição sindical é, portanto, modalidade de contribuição parafiscal, na medida em que é destinada ao financiamento de entidades que atuam em favor de interesse social, paralelamente às atribuições do Estado.

Definida a natureza jurídica tributária da contribuição sindical, importante à análise de como se dá a constituição desse crédito pelas vias ordinárias. Assim, passaremos a definir a forma como se opera a incidência da norma jurídica tributária nas relações sociais de forma a nascer o dever de se fazer exigir o recolhimento do tributo.

Na lição do tributarista Luciano Amaro1, a obrigação tributária decorre de uma imposição normativa, a qual desconsidera a vontade do sujeito passivo em aderir ou não a imposição nela prevista. Em ocorrendo o fato gerador previsto em lei, automaticamente nasce o potencial direito creditório do fisco.

Nesse diapasão, é o fato gerador previsto em lei o gatilho da obrigação tributária, o que significa dizer que, a partir desse momento, independentemente da vontade do sujeito passivo da obrigação, nasce o dever de recolhimento de determinado tributo.

No caso da contribuição sindical, com o advento da reforma trabalhista, o fato gerador, que antes era a simples participação em determinada categoria econômica ou profissional, passou a ser, por força da nova redação dos arts. 578 e 579 da CLT, o momento em que ocorre a autorização prévia e expressa dos referidos participantes.

Assim, com a reforma, a obrigação tributária nasce com o advento da prévia e expressa autorização do participante de categoria econômica ou profissional, passando a ser, após esse momento, compulsória nos termos do art. 3º do CTN. Pode até ser considerado um paradoxo o fato de ser a prévia autorização o momento que se torna compulsória a incidência do tributo, mas é o que diz a lei.

Por sua vez, o artigo 142 do Código Tributário Nacional dispõe que é de competência privativa da autoridade administrativa a constituição do crédito tributário por meio do ato administrativo denominado lançamento.

Assim, com a consumação do fato gerador tributário, é a autoridade administrativa que deve diligenciar para fins de constituição do crédito por meio de ato jurídico, seja pelo lançamento ou pela autuação quando do descumprimento de alguma obrigação tributária.

Por sua vez, o lançamento é entendido como o procedimento ou ato administrativo por meio do qual se verifica a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determina-se a matéria tributável, calcula-se o montante do tributo devido, identifica-se o sujeito passivo e, sendo o caso, propõe-se a aplicação da penalidade cabível.

Portanto, com base no ordenamento jurídico a que pertence o sistema tributário, o lançamento é o instrumento por meio do qual o sujeito ativo da obrigação exercita os atos de constituição do crédito para que seja possível a cobrança judicial do tributo.

Tratando-se de ato administrativo, conclui-se que essa cobrança judicial prescinde a existência de um procedimento administrativo de constituição do crédito, pois é por meio dele que se apura o montante devido tanto a título de tributo e os respectivos juros, como a título de multa pelo descumprimento da legislação tributária.

Frise-se que apenas a arrecadação dos tributos é que pode ser repassada às pessoas jurídicas de direito privado, em especial nos denominados lançamentos por homologação, como é no caso dos sindicatos e da sua contribuição, conforme preceitua o art. 7º do CTN, sendo a sua constituição de competência indelegável das pessoas jurídicas de direito público.

Assim, devemos ter bem claros os conceitos de competência tributária e capacidade tributária ativa, essa última, sim, delegável a terceiros. Trata-se a capacidade tributária ativa de uma prerrogativa arrecadatória de créditos tributários.

Por conta disso que o art. 606 da CLT, prevê a capacidade tributária ativa das entidades sindicais, sendo a executividade da contribuição sindical condicionada a sua prévia constituição por certidão de "dívida ativa" expedida pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social, autoridade da administração pública eleita pelo ordenamento jurídico como competente para constituir o referido crédito tributário, em consonância com o art. 2º da lei 6.830/80.

Na prática, o que acontece no dia-a-dia, até em função da redação do art. 583, § 1º da CLT, é que os sindicatos emitem as guias de recolhimento de contribuições sindicais e, na ausência de pagamento da importância respectiva, propõem as ações judiciais de cobrança com ou sem materialização em certidão do Ministério do Trabalho, conforme art. 606 da CLT.

Entendemos que, por se tratar de norma de ordem pública, no mínimo a cobrança judicial desse crédito deva cumprir o requisito formal imposto pelo ordenamento jurídico de prévia existência do instrumento introdutor de norma jurídica para fins execução do crédito tributários, no caso, a certidão do Ministério do Trabalho, por se tratar do órgão que possui a competência tributária.

Por isso mesmo, tal qual defendemos em relação à execução de ofício da contribuição social na Justiça do Trabalho, entendemos que a constituição judicial de tributo não seria uma alternativa por ausência de previsão normativa. Ou seja, o juiz não pode por meio de sentença judicial promover a constituição do crédito tributário decorrente da contribuição sindical.

A fenomenologia da incidência normativa, conforme vimos, passa pela declaração de um fato social por meio de procedimento estabelecido no ordenamento jurídico e através de instrumento introdutor de norma compatível com a sua sistemática. A linguagem utilizada no processo de subsunção deve ser àquela estabelecida previamente em norma geral de regência.

No caso da contribuição sindical, a obrigação tributária nasce com o fato gerador, art. 113 CTN, mas o crédito passível de execução depende de prévia constituição pela administração pública. Ou seja, por força do art. 605 da CLT, é legítimo o envio do boleto de cobrança para fins de facilitação do recolhimento da contribuição pelo sujeito passivo ou pelo responsável tributário. Entretanto, o crédito tributário surge em outro momento previamente definido no ordenamento e posterior ao surgimento da obrigação tributária, in casu representada pela ação do Ministério do Trabalho em emitir a certidão, sendo só com o advento desse ato administrativo vinculado passível de ser executado, a teor dos arts. 2º da lei 6.830/80 e 606, § 2º da CLT.

A CLT regula a alíquota, prazos e parâmetros para recolhimento do tributo, bem como os requisitos para respectiva cobrança, igualmente, o art. 114 da CF estabelece a justiça do trabalho como o órgão do poder judiciário competente para a apreciação de demandas judiciais que se relacionem à contribuição sindical.

A problemática se dá em razão do dispositivo da reforma trabalhista que transformou em facultativa, tanto para empresas, quanto para trabalhadores, o pagamento da contribuição sindical. Poderia o Ministério do Trabalho expedir a tal certidão em razão da negativa de pagamento do tributo ou da falta de prévia autorização? Com a falta da prévia e expressa autorização teria ocorrido o fato gerador?

Constitucionalidades à parte em relação a possibilidade de inserção de norma tributária no ordenamento jurídico por meio de lei ordinária ou quanto a viabilidade de transformação de um tributo em facultativo frente ao disposto no art. 3º do CTN, o fato é que uma vez vigente a norma é válida e eficaz, pelo menos até que sobrevenha decisão que declare a sua inconstitucionalidade, não sendo permitido, portanto, ao representante da administração pública a prática de ato não previsto em Lei, a teor do princípio da legalidade estrita.

Ou seja, o Ministério do Trabalho não poderia proceder com o lançamento tributário em razão de inadimplemento do sujeito passivo de tributo por homologação e, em razão disso, a certidão não seria expedida e careceriam os sindicatos do justo título executivo de crédito tributário. Questionável, inclusive, por se tratar de norma de ordem pública e em razão dos conceitos de competência e capacidade tributária, a legitimidade ativa da entidade sindical para tratar da constitucionalidade da reforma nesse ponto em âmbito de controle difuso.

Igualmente, passível de discussão a adequação da ação civil pública como via adequada para discussão de constitucionalidade da reforma no que se refere à infringência em questões tributárias por força do parágrafo único do art. 1º da lei 7.347/85, bem como por se tratar de discussão de interesse próprio dos sindicatos e não dos direitos e interesses coletivos e individuais da categoria que representa.

O fato é que diante de tantas incertezas e até que sobrevenha a decisão do Supremo em controle concentrado de constitucionalidade a insegurança jurídica estará presente, pois temos acompanhado os mais variados tipos de decisão em primeira instância ao analisar casos concretos de sindicatos, que vão desde a declaração de inconstitucionalidade em sede de ação civil pública até a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário entre empresas e trabalhadores nessa discussão.

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1 "o nascimento da obrigação tributária independe de uma manifestação de vontade do sujeito passivo dirigida a sua criação. Vale dizer, não se requer que o sujeito passivo queira obrigar-se; o vínculo obrigacional tributário abstrai a vontade e até o conhecimento do obrigado: ainda que o devedor ignore ter nascido a obrigação tributária, esta o vincula e o submete ao cumprimento da prestação que corresponda ao seu objeto. Por isso, a obrigação tributária diz-se ex lege. Do mesmo modo, a obrigação de votar, de servir às Forças Armadas, de servir como jurado, entre outras, são obrigações ex lege, que dispensam, para seu aperfeiçoamento, o concurso da vontade do obrigado". (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 10ª ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 240).

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*Mauricio Pallotta é mestre em Direito do Trabalho pela USP e sócio do escritório Pallotta, Martins e Advogados.

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