Perda da pensão por morte em razão de novo casamento ou união estável
A penalidade contida na legislação estadual (perda da pensão por morte) é totalmente contrária aos novos paradigmas inseridos pela Constituição Federal que prevê expressamente a proteção dos direitos fundamentais, no caso, o direito fundamental à pensão por morte, benefício previdenciário de natureza alimentar e social.
segunda-feira, 7 de maio de 2018
Atualizado às 10:28
A legislação previdenciária de alguns estados brasileiros, inclusive, a do Estado de São Paulo, prevê o cancelamento da pensão por morte na hipótese do ex-cônjuge ou companheiro constituir novo vínculo familiar (casamento, união estável ou união homoafetiva).
Na prática, os Institutos de Previdência ao tomarem conhecimento da existência do casamento, da união estável ou da união homoafetiva promovem o cancelamento do benefício, com base na legislação estadual. Aliás, no caso de novo casamento, além do cancelamento da pensão, é feita a cobrança dos valores recebidos pelo beneficiário desde a data do matrimônio.
A previsão existente na legislação estadual e a interpretação restritiva e literal atribuída pelo poder público (cancelamento abrupto do benefício, muitas vezes sem observar o direito à ampla defesa no devido processo legal administrativo), desvirtua completamente a finalidade da pensão por morte, que é prover a subsistência dos dependentes do servidor falecido.
Com efeito, ao aplicar a legislação estadual o Instituto de Previdência presume que, a partir da constituição do novo vínculo familiar, deixou de existir automaticamente a dependência econômica do pensionista em relação ao ex-servidor, sem sequer observar se o novo vínculo familiar resultou em melhoria na condição econômica do pensionista, ignorando, inclusive, a natureza alimentar do benefício previdenciário.
Nos casos de união estável, é comum ocorrer o cancelamento da pensão sem sequer ficar comprovado de fato no processo administrativo a existência dos requisitos legais para a constituição da referida união. Aliás, o ônus da prova, nesse caso, é de responsabilidade do Instituto de Previdência.
Em face do cancelamento das pensões com fundamento na constituição de novo vínculo familiar, muitos pensionistas têm ingressado com ações judiciais discutindo o direito à continuidade do recebimento do benefício, inclusive, sem devolução de quaisquer parcelas recebidas, seja porque o Instituto de Previdência não comprovou a existência dos requisitos caracterizadores da união estável, seja porque o novo vínculo familiar não resultou em melhoria da condição financeira do beneficiário da pensão.
O primeiro fundamento (ônus da Administração Pública comprovar no processo administrativo a existência dos requisitos legais da união estável) tem sido acolhido por praticamente todos os Tribunais, inclusive, pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.
Já a ação baseada no segundo fundamento (melhoria da condição financeira do pensionista em face da constituição do novo vínculo familiar) tem obtido êxito em alguns Tribunais e no Superior Tribunal de Justiça.
O entendimento do STJ é de que antes do cancelamento da pensão deve restar comprovado que o novo casamento, união estável ou união homoafetiva resultou em melhoria na situação financeira do pensionista.
A constituição de novo vínculo familiar, muitas vezes não resulta em melhoria na condição financeira do pensionista, ao contrário, pode resultar em aumento nas despesas mensais do beneficiário da pensão.
Na verdade, a penalidade contida na legislação estadual (perda da pensão por morte) é totalmente contrária aos novos paradigmas inseridos pela Constituição Federal que prevê expressamente a proteção dos direitos fundamentais, no caso, o direito fundamental à pensão por morte, benefício previdenciário de natureza alimentar e social.
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*Abelardo Sapucaia é advogado, consultor e professor especialista em direito previdenciário.