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Laís Souza e as células-tronco, Eudes Quintino

Laís Souza e as células-tronco

As pesquisas com células-tronco vêm ganhando espaço e apontando para uma medicina regenerativa, justamente porque conseguem se transformar em diferentes tipos de tecidos com possibilidade de regeneração de traumas e outras doenças.

domingo, 6 de maio de 2018

Atualizado em 4 de maio de 2018 11:07

A ex-ginasta e esquiadora Laís Souza, após sofrer um gravíssimo acidente quando treinava para as Olimpíadas de Inverno, que seriam realizadas em Sochi, Rússia, no ano de 2014, experimentou lesão medular completa, deixando-a tetraplégica.

Submeteu-se a um tratamento pioneiro no Miami Project to Cure Paralysis (Projeto Miami para curar paralisia), centro de referência mundial no tratamento e pesquisa de paralisia, assistida pelo médico Barth Green, o mesmo que acompanhou o ator Christopher Reeve e, após conseguir permissão da Food and Drug Administration (FDA), agência governamental de controle de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos, fez uso de células-tronco em terapia de lesão medular.

As células utilizadas foram extraídas da sua medula óssea e, atualmente, conforme noticiário divulgado, foi constatado um significativo progresso de recuperação, graças também à sua extremada dedicação nas sessões de fisioterapia.

As pesquisas com células-tronco, paulatinamente, vêm ganhando espaços e apontando para uma medicina regenerativa, justamente porque as células gozam de um prestígio inigualável no corpo humano, pois conseguem se transformar em diferentes tipos de tecidos com possibilidade de regeneração de traumas e outras doenças.

No caso específico da atleta trata-se, na realidade, de um autotransplante, uma vez que o procedimento consiste em retirar as células da sua medula e alojá-las no local pretendido. Atende, desta forma, rigorosamente aos ditames do princípio da beneficência, que é um dos pilares da Bioética, que apregoa o primum non nocere e o malum non facere, compreendendo aqui a realização de condutas e procedimentos para produzir benefícios de saúde para a pessoa, utilizando-se de meios compatíveis e adequados com a ética médica.

"A terapia celular, conforme Oliveira Júnior, linha de pesquisa que ganhou credibilidade em razão de seus resultados satisfatórios, faz parte da medicina considerada de ponta. As pesquisas realizadas nesta área são tantas, com benefícios incontáveis, que ganharam aprovação popular. O material humano coletado, sem qualquer restrição legal, pode ser aplicado no autotransplante ou no alotransplante. A manipulação com o material humano coletado é de alta responsabilidade, já que lida com componente estrutural e funcional dos seres vivos. Não se trata de uma invasão à privacidade do cidadão, do seu ego e sim da sua essência molecular, do fato gerador do próprio ser humano. É a extração do material biológico que será implantado no próprio paciente ou em outro, com o objetivo de se alojar no órgão ou tecido e ali aprender sua nova função, visto que se trata de célula virgem, sem qualquer experiência operacional. A grandeza do ato, em poder o ser humano realizar esta captação e sequencial transferência, vem a ser um demonstrativo da infinita sabedoria do Criador. O homem, quando nasce, vem coberto de ricas células-tronco distribuídas pela placenta. Igual porção vem alojada no cordão umbilical, possibilitando seu congelamento para utilização posterior. Mas, para aperfeiçoar ainda mais o ser humano, o Criador alojou as células virgens, verdadeiros soldados de reserva, como um autêntico estepe, na medula óssea, disponíveis a qualquer tempo"1.

A utilização das células-tronco no Brasil ainda se encontra em estágio embrionário e não faz parte do protocolo rotineiro da medicina. Assim, todo procedimento é considerado pesquisa experimental, com exceção, é claro, do transplante de medula óssea, observando ainda a necessidade da aprovação do Sistema Cep/Conep para iniciar os estudos.

É oportuno, também, fazer menção à Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, que estabelece as diretrizes protetivas do participante de pesquisa envolvendo seres humanos, compreendendo: a) os aspectos éticos da pesquisa; b) do processo de consentimento livre e esclarecido; c) dos riscos e benefícios envolvendo os seres humanos; d) do sistema Cep/Conep e suas atribuições e competências para análise ética dos protocolos e a emissão de pareceres devidamente motivados e da responsabilidade do pesquisador responsável.

Com tantos dispositivos protetivos, é interessante notar que a ciência não se vê liberada para agir de acordo com sua conveniência e sim deve traçar a evolução de suas pesquisas visando sempre o seu destinatário final, que é o ser humano. As soluções que conflitarem com o sentimento ético e moral do homem serão descartadas. É a prevalência do bom senso, ditado pelo interesse da maioria. O homem passa a ser o epicentro das atenções do próprio homem e não mais sua cobaia ou seu lobo. Não se caminhará cegamente para transformar o corpo do homem em linha de montagem e sim de buscar os mecanismos valiosos para lhe dar sustentação de saúde, bem estar, equilíbrio e felicidade.

Nesta linha de pensamento, toda sorte e sucesso para Laís Souza, merecedora que é pela sua força, dedicação e persistência.

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1 Oliveira Júnior, Eudes Quintino. In Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia.  Clique aqui.

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*Eudes Quintino de Oliveira Júnior, promotor de justiça aposentado/SP, mestre em direito público, pós-doutorado em ciências da saúde, reitor da Unorp, advogado.

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