Da responsabilidade do condomínio pelo pagamento de verbas trabalhistas
É de suma importância aos responsáveis pela constituição de um condomínio, ainda inexistente de fato e de direito, a adoção de medidas jurídico preventivas, a fim de que os riscos existentes sejam minimizados e os interesses empresariais eficazmente atingidos.
quinta-feira, 29 de março de 2018
Atualizado em 27 de março de 2018 10:30
Ao se deparar com um profissional que tenha laborado nas dependências de uma determinada área de terras, a qual ainda não se possa denominar condomínio, de fato e de direito, como reconhecer os direitos a ele inerentes e os efetivos responsáveis pela consequente quitação destas obrigações?
A nosso ver, eventuais responsabilidades pelo pagamento de verbas decorrentes de uma relação de emprego não podem recair sobre um condomínio ainda não constituído, de fato e de direito, notadamente por inexistir previsão legal a autorizar qualquer obrigação nesse sentido.
No entanto, na prática, é bastante comum observar reclamações trabalhistas nas quais são alocados no polo passivo apenas e tão somente a figura dos condomínios, ainda que não estejam regularmente constituídos, de modo a se tentar imputar a estes entes toda a responsabilidade pelo adimplemento das verbas decorrentes do regime celetista.
A corroborar tal situação, encontram-se, infelizmente, algumas menos atentas decisões judiciais, calcadas muitas vezes em provas vesgas, as quais deságuam, na realidade, em violência ao quanto previsto nos artigos 2º e 3º, da CLT, de modo a condenar o inexistente condomínio ao pagamento de todas e/ou parte das verbas pretendidas na inicial.
Ora, necessário se faz esclarecer que se considera condomínio a área de terras que se encontrar devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis, sendo necessária a subscrição de sua convenção pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais.
Convenção trata-se de ato-regra da vida condominial e sua subscrição a torna obrigatória para todos os titulares de direito sobre as unidades autônomas, ou para quem sobre elas tiver posse ou detenção, sendo que para ter validade contra terceiros imperioso se faz que esteja devidamente registrada em cartório.
O artigo 1º, da Lei n. º 4.591, de 1964, entende por condomínio as edificações ou conjunto de edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou não residenciais, e vincula a unidade habitacional ou comercial, como propriedade autônoma, a uma parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns (§2º).
Assim, para configuração de um condomínio não basta que em um mesmo terreno duas ou mais pessoas construam unidades autônomas, sendo requisito essencial de sua constituição, tal qual resultante da lei e assentado em doutrina, que estas unidades se encontrem reunidas em um conjunto de terras, nas quais se associem as partes comuns.
Desta feita, para que haja condomínio é preciso que os proprietários dos direitos relativos à aquisição de unidades autônomas, em propriedades a serem construídas, em construção ou já construídas, elaborem, por escrito, convenção condominial, a qual deve ser aprovada pelo mínimo de 2/3 dos moradores (artigo 9º, §3º) e, também por contrato ou deliberação, em assembleia, aprovem o regimento interno das terras, de modo a promover o subsequente registro.
Por outro lado, trata-se de condomínio de fato todo grupamento espontâneo de casas ou de apartamentos não constituído segundo a forma estabelecida no artigo 7º, da Lei n. º 4.591, de 1964 e nos artigos 1.332 e seguintes do Código Civil.
Com efeito, condomínio de fato não se trata de ato de vontade deliberada dos consórcios nem instituição por testamento, sendo que se materializam, via de regra, espontaneamente, por aglomerados de propriedades em forma de vilas de casas ou em ruas sem saída, onde se aloca uma chancela, uma guarita, quase sempre à revelia do Poder Público.
Diante das definições acima relatadas, resta patente a impossibilidade de um condomínio ainda não constituído, de fato e de direito, assumir uma dívida trabalhista de eventuais trabalhadores que lá se ativaram.
Não se pode travestir uma área de terras que se encontra dividida em unidades autônomas em condomínio, tendo em vista esta pretensa equiparação constituir mera ficção jurídica, destinada única e exclusivamente a legitimar eventual representatividade em uma demanda.
Nessa linha, ao examinar-se as normas destinadas a regular a vida em condomínio, à luz do princípio da igualdade proclamado pela Carta Maior, observa-se a isonomia de todos perante a lei, o que se depreende também às disposições instituídas para a regulação da vida em grupo, como ocorre no condomínio a exigir igualdade de tratamento entre os condôminos, respeitadas as suas peculiaridades.
Destarte, em uma reclamação trabalhista ajuizada em face de um condomínio, deve o juiz ater-se a essas peculiaridades, de modo a observar sua efetiva constituição, sendo que não poderá sobrevir condenação se não restar demonstrada inequivocamente sua existência de fato e de direito pelo trabalhador.
Até porque, um inexistente condomínio, não possui qualquer natureza jurídica, não podendo ser sujeito de direitos e deveres e, por consequência, figurar no polo passivo de uma ação judicial.
Eventual responsabilidade pelo adimplemento das verbas trabalhistas deverá recair sobre o efetivo empregador destes empregados, o qual poderá ser identificado através da análise das provas constituídas nos autos, notadamente oitiva das partes e testemunhas, bem como documentos a ele anexados.
Aos magistrados cabe investigar quem efetivamente fora o empregador daquele reclamante, tendo em vista as plúrimas possibilidades, como, por exemplo, empreiteiro, empresas prestadoras de serviços, construtoras, dentre outras.
Se, por sua vez, as provas colacionadas aos autos não forem robustas no sentido de caracterizar inequivocamente o vínculo empregatício, o julgador não terá outra alternativa senão se posicionar pela improcedência da demanda.
Diante de tais fatos, é de suma importância aos responsáveis pela constituição de um condomínio, ainda inexistente de fato e de direito, a adoção de medidas jurídico preventivas, a fim de que os riscos existentes sejam minimizados e os interesses empresariais eficazmente atingidos.
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*Rafael Cenamo Junqueira é sócio proprietário do escritório Cenamo Junqueira Advogados Associados.