Pais e Filhos
Não precisou proferir a sentença nem de muitas palavras.
sexta-feira, 29 de dezembro de 2017
Atualizado às 11:06
Goffredo e Lygia nunca souberam o que era passar o Natal juntos. Ou o Ano-Novo. Os gêmeos filhos de um promotor e uma advogada nunca viram os pais como um casal. Separaram-se antes de que pudessem ter uma lembrança de que as conversas entre os pais tivesse "mas você isso" "e você aquilo".
As memórias da dupla que, como sugere, recebeu os nomes após dois grandes estudantes das Arcadas, só consegue se separar nestas datas. Se Goffredo passa o Natal com a mãe, significa que Lygia está com o pai. Um para cada data.
2016, entretanto, foi diferente. Cientes de seus direitos e com a maioridade atingida, eles decidiram passar as festas juntos. Pela primeira vez.
- De jeito nenhum! No ano passado a Lygia passou o Ano Novo comigo então este ano vou passar com o Goffredo, reclamou o promotor.
- Também não aceito este acordo, disse a advogada.
Foi a primeira vez que concordaram em algo. Depois de tanto tempo.
- Olha, você corta a mesada dela que eu corto a dele e voltamos como antes, pensou a advogada.
- Boa ideia. Você puxa de um lado e eu do outro. Vamos ver até aonde eles aguentam.
Durante três meses os gêmeos ficaram sem mesada. E dezembro chegou sem que a briga houvesse sido resolvida. Exaustos por não terem feito os pais entenderem a mensagem, lá foram os gêmeos procurar o padrinho Salomão. Sim, eles tinham o mesmo padrinho e a mesma madrinha- esta faleceu um ano antes.
- Eles me contaram o que está acontecendo. Aliás, eu fiquei surpreso pois nunca nem a Lygia e muito menos o Gob (apelido do Goffredo) me contaram que vocês faziam isso com eles. Como puderam agir desta maneira por 18 anos?
- Sal, você conhece bem ele!
- E você conhece bem ela! Não dá nem para conversar com ela.
- Mas, pelo menos desta vez, vocês concordaram não foi?
O ex-casal não havia se dado conta de que, em três meses, eles não brigavam entre eles. Brigavam para que os filhos brigassem por eles.
Salomão nem precisou pedir para cortar os jovens ao meio. Juiz de longa data, a aposentadoria não havia tirado sua sabedoria. Não precisou proferir a sentença nem de muitas palavras. Bastou um olhar para que, a partir deste ano, a paz e a união já fossem consideradas como o melhor transitado em julgado daquela família.
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*Ivy Farias é jornalista e estudante de Direito da UMC- Campus Villa-Lobos/Lapa, uma das fundadoras do movimento Mais Mulheres no Direito.