A possibilidade de sentença ilíquida e liquidação de sentença na ação monitória
Observamos que em geral a doutrina pouco se inclina a analisar a possibilidade de sentenças ilíquidas em procedimento monitório. De tal modo, que a liquidação de sentença nas referidas ações também se encontra pouco discutida jurisprudencialmente. Contudo, a discussão existe e o tema já foi enfrentado pelos tribunais em certas ocasiões.
quinta-feira, 21 de dezembro de 2017
Atualizado em 20 de dezembro de 2017 10:49
Ação Monitória
I - Conceito.
A tutela monitória foi criada exatamente para aquelas situações em que, embora não exista título executivo (em que haja, abstrata e previamente, indicação da probabilidade do crédito a ponto de o próprio legislador haver autorizado desde logo a execução), há concretamente forte aparência de que aquele que se firma credor tenha razão.
Através do procedimento monitório busca-se a rápida formação do "título executivo" - um atalho para o processo de execução -, naqueles casos em que cumulativamente: a) há concreta e marcante possibilidade de existência do crédito e b) o réu, regularmente citado, não apresenta defesa nenhuma.
A ação monitória deve ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz.
Devendo ser o pagamento de quantia em dinheiro; entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel; o adimplemento de obrigação de fazer ou não fazer. Assim reza o artigo 700 do Novo Código de Processo brasileiro.
Na ação monitória, ao título falta a exigibilidade para ensejar a ação de execução, visto que se presume existir certeza e liquidez. Significa dizer que a ação monitória é cognitiva e sua decisão constitutiva, visando tão somente, dar ao título injuntivo a exigibilidade.
Tenha-se, contudo presente que a limitação da cognição verificada no procedimento monitório cinge-se apenas à matéria fática agitada pelo requerente, permanecendo totalmente intangida a regra que se supõe ao juiz conhecedor do direito, ou seja, o juiz deve examinar, a exemplo do que ocorre no procedimento comum, os pressupostos de admissibilidade e, no denominado procedimento monitório documental, a idoneidade prima facie da prova escrita.
Enfim, a função essencial do procedimento monitório brasileiro é a de acelerar o surgimento da autorização para executar. Por isso, quem já possui título executivo não pode valer-se dessa via, visto que não lhe traria resultado além daquilo que já tem.
Observamos que em geral a doutrina pouco se inclina a analisar a possibilidade de sentenças ilíquidas em procedimento monitório. De tal modo, que a liquidação de sentença nas referidas ações também se encontra pouco discutida jurisprudencialmente. Contudo, a discussão existe e o tema já foi enfrentado pelos tribunais em certas ocasiões.
Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça teve por entender que a liquidez é um pressuposto do título que enseja a ação monitória, sob pena de inépcia da petição inicial.
Porém, em outros casos concretos, o STJ entendeu que a liquidez não é requisito do título, uma vez que pode ser obtida ao longo do procedimento monitório por meio dos embargos legais. Assim sendo, embora o despacho do mandado monitório pudesse carecer de liquidez, a sentença obtida ao final do procedimento seria, por consequência do contraditório instalado, líquida e apta a ser executada.
Encontramos ainda o entendimento do STJ de que ocorrendo a iliquidez em decorrência do processo cognitivo instalado no curso de monitória, a mesma ainda se encontra como adequada para a constatação da obrigação, visto que no caso em questão não se reconhecia sequer a dívida, qualquer que ela fosse.
Nesse sentido:
LOCAÇÃO. FIANÇA. AÇÃO MONITÓRIA. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. SENTENÇA ILÍQUIDA. NULIDADE INEXISTENTE. PROVA ESCRITA. EFICÁCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. AUSÊNCIA. IRRELEVÂNCIA. Nas causas que contenham condenação genérica, prescindível que a sentença seja líquida, bastando que, entre o processo de conhecimento e o de execução, faça-se primeiro a sua liquidação. Inteligência do artigo 586, § 1º, do Código de Processo Civil. Desnecessária a liquidez da dívida contida no documento que instrui a inicial da ação monitória, eis que o próprio artigo 1.102a, do Codex Instrumental, requer "prova escrita sem eficácia de título executivo". A "prova escrita" é todo e qualquer documento que autorize o julgador a entender que há direito à cobrança de um determinado débito. Recurso especial improvido. (STJ - REsp: 596043 RJ 2003/0181475-5, Relator: Ministro PAULO MEDINA, Data de Julgamento: 02/03/2004, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação:--> DJ 29/03/2004 p. 287)
Na questão em análise, o Ministro Relator em seu voto nos traz a ideia de que o título que instrui a inicial da monitória poderia ser desprovido de liquidez, visto que esta depende do resultado de outro processo, visando tão somente a constituição da exigibilidade ao mesmo.
Assim, observamos que o dispositivo legal que autoriza o procedimento monitório é bem claro ao prescrever "prova escrita sem eficácia de título executivo", isto é, que não seja líquido, certo e exigível, sendo inteligível que esta "prova escrita" possa ser todo e qualquer documento que autorize o julgador a entender que há direito à cobrança de determinada dívida.
Com o advento da nova lei processual civil, buscou-se reduzir a discussão existente entre a possibilidade ou não de se instaurar a liquidação de sentença em ações monitórias, na medida em que o texto legal nos traz no §2º do artigo 700 a obrigação de determinar o máximo possível à dívida já na petição inicial.
A ação monitória é, uma vez ampliada as suas possibilidades, ação de conhecimento condenatória, com procedimento especial e de execução sem título, cuja finalidade precípua é alcançar a formação do título executivo de forma mais célere e mais simples do que ocorre na ação condenatória convencional.
Feitos estes esclarecimentos, verificamos que o processo de liquidação das obrigações ilíquidas é processo cognitivo, que culmina com uma sentença condenatória, depois de desenvolver pelo procedimento cabível.
A estrutura desses procedimentos e a necessidade de uma cognação para a liquidação da obrigação já afastariam a possibilidade da liquidação no processo da ação monitória.
Mas se a obrigação liquida só se impõe ao devedor, depois de uma sentença condenatória, a ideia da ação monitória fica totalmente afastada. Liquida a sentença, ela se executa.
Ilíquida, procede-se a sua liquidação, por arbitramento, por artigos, ou na conformidade do art. 509, inciso I, do Novo código de Processo Civil. Para fins da ação monitória, só se deve permitir a liquidação do título paraexecutivos, se ela depender de simples cálculo aritmético.
Nessa hipótese, aplicar-se-á, analogicamente, art. 509 do Código de Processo Civil. O credor da obrigação liquidável por cálculo aritmético efetuara essa operação e, juntando a inicial da ação monitoria o documento comprobatório da obrigação e a memória do cálculo, pedira a expedição do mandado monitório.
Se o procedimento apontado se admite na execução de sentença, como está no art. 509 do CPC, deve ser admitido, a fortiori, num processo cognitivo, como é o da ação monitoria, que abre ao devedor, por via de embargos, conforme artigo 702, §2º, as mais amplas possibilidades de questionar o pedido, inclusive discutindo o cálculo.
Desta forma, a natureza da matéria dispensa mais delongas, assim, submeto a censura dos doutos os entendimentos de que, se ilíquidas, as obrigações referidas no art. 700 do Código de Processo Civil não admitem a propositura da ação monitória, salvo quando a apuração do seu valor depender apenas de cálculo aritmético, tal como previsto, para sentenças condenatórias ilíquidas, no art. 509 daquele diploma.
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Bibliografias consultadas.
Neves, Frederico Ricardo de Almeida, Breves Comentários sobre a Ação Monitória, 1ª Edição, Editora Nossa Livraria, Recife, 1.996.
Talamini, Eduardo. A ação Monitória - Lei 9.079 - 2ª edição. Revista atualizada e ampliada - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001.
Tucci, José Rogério Cruz e. Ação Monitória: Lei 9.079- 3ª edição Revista atualizada e ampliada - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2001.
STJ - AgRg no REsp: 1402170 RS 2013/0043715-0, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 11/02/2014, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/03/2014.
STJ - REsp nº 437.638/RS, Quarta Turma, Relator Ministro Barros Monteiro , DJ de 28/10/02.
STJ - REsp nº 267.840/MG, Relator Ministro Barros Monteiro , DJ de 27/11/2000.
STJ - REsp Nº 439.103 - MG, Relator Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 25/11/2002.
STJ - REsp: 596043 RJ 2003/0181475-5, Relator: Ministro PAULO MEDINA, Data de Julgamento: 02/03/2004, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJ 29/03/2004.
Sérgio Bermudes defende ação monitória. Consultado em 09/06/2017.
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