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Captação clandestina de sinal de TV: furto, estelionato ou fato atípico?

Cabe aqui uma maior reflexão se essa atitude pode ser considerada crime ou não.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Atualizado em 7 de dezembro de 2017 18:41

Atualmente, existe uma crescente demanda por aquisição de aparelhos que transmitem o sinal fechado de TV, seja via cabo, satélite ou internet. Com isso, cresce também a captação clandestina desse sinal.

Acerca do tema, reflete-se que tal comportamento atinge diretamente a moral, a ética e os bons costumes, já que essa prática clandestina é amplamente difundida e utilizada em diversas classes sociais do país.

Cabe aqui uma maior reflexão se essa atitude pode ser considerada crime ou não.

No dia 4 de fevereiro de 2015, foi apresentado na Câmara dos Deputados o Projeto de lei 188/15, de autoria do Deputado Cleber Verde (PRB/MA), que altera o artigo 155, do decreto-lei 2.848/40 (Código Penal), incluindo no § 3º sinais de TV a cabo.

Muito embora haja a possibilidade de tal conduta ser considerada crime, já que o projeto se encontra sujeito à apreciação do Plenário, vejamos o que diz o próprio artigo 155 do Código Penal:

''Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.''

Assim, com a inserção dessa conduta a ser tipificada como ilícita, cabe aqui uma análise dessa tipificação e se realmente poderia ser considerada furto.

Apesar de o enquadramento desse projeto, com a inclusão no art. 155 do CP, parecer viável, tem-se que a jurisprudência vem divergindo no assunto.

Ocorre que tal discussão se dá em três sentidos, qual seja: a) deve ser considerada furto - visão amplamente adotada pelo STJ; b) deve ser considerada estelionato - visão adotada em algumas doutrinas; c) deve ser considerada conduta atípica - visão adotada recentemente no STF.

Deste modo, mesmo tendo a jurisprudência adotado por analogia que tal conduta pode ser tipificada como furto e até mesmo estelionato, note que não há cominação legal para descrever como ilícito penal, não podendo ser enquadrada como crime.

Por outro lado, note que a lei 8.977/95, que dispõe sobre o serviço de TV a cabo, em seu art. 35, considera:

''Constitui ilícito penal a interceptação ou a recepção não autorizada dos sinais de TV a cabo.''

Mesmo considerando ato ilícito, tal instrução não vem sendo adotada, uma vez que não há previsão na legislação penal, podendo levar ao entendimento de que o fato é atípico, ou seja, mesmo sendo um fato reprovável, consiste na ausência de correspondência, na falta do ajustamento, da adequação entre o fato natural e o modelo de conduta proibida: o tipo legal de crime.

Assim, por completa ausência de tipificação dessa conduta, destaca-se o embate hermenêutico estendido ao longo do tempo até que o projeto em análise seja concluído. Sendo a decisão do STJ considerada a mais compreensível e ajustável à ciência jurídica penal, denota-se que, assim como a transmissão via cabo se dá através de energia, a transmissão e propagação do sinal via internet ou satélite através de ondas também seja considerada energia.

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*Guilherme Suriano Ourives é advogado, pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil; Pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal; sócio do escritório Pegolo & Ourives Advogados Associados.

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