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Prioridade para a infraestrutura

Não se tem dúvida da importância do combate à corrupção, mas é igualmente fundamental para o país a preservação de suas empresas e empregos.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Atualizado em 24 de agosto de 2017 17:17

Por que a indústria de infraestrutura nacional, hoje fortemente abalada com a sucessão de malfeitos descortinados pela operação Lava-Jato, há de merecer atenção especial do Estado brasileiro? Essa indagação comporta diversas respostas. A mais importante, contudo, é que a Constituição Federal assim o determina, especialmente em seu artigo 170, VIII, que cuida da exigência do pleno emprego de todos os fatores de produção como um dos alicerces da ordem econômica e social. Com efeito, é obrigação constitucional do Estado desenvolver e implantar políticas públicas que tenham por alvo o desenvolvimento da indústria, em seus diferentes segmentos, assegurando-se, entre outros, o pleno emprego da mão de obra. Não pode, pois, o Estado mostrar-se alheio ao quadro de desmonte das empresas do setor de obras de infraestrutura, com as trágicas consequências dele advindas, especialmente no campo do desemprego.

Alguns números oferecem a dimensão do problema: pesquisas feitas entre as dez maiores empresas do setor mostram que, apenas entre funcionários diretos e terceirizados, a redução de vagas entre o fim de 2013 e dezembro de 2016 foi de quase 600 mil pessoas. Analistas apontam que o efeito foi ainda maior, quando se consideram as vagas indiretas. Entre 2013 e 2015, segundo Relação Anual de Informações Sociais (Rais), os 12 principais ramos da construção fecharam 330,7 mil postos de trabalho com carteira assinada, uma diminuição de 20%. Somaram-se a eles outros 227,1 mil demitidos em 2016.

Para o enfrentamento desse quadro desolador, o ordenamento disponibiliza diferentes ferramentas próprias a fim de assegurar a preservação da empresa, atendendo-se, assim, à exigência constitucional. Entre eles, destaca-se o acordo de leniência, introduzido pela lei 12.846/13, a Lei Anticorrupção. Esta, ao mesmo tempo em que instituiu a aplicação de sanções rigorosíssimas àquelas empresas que cometem atos lesivos à Administração Pública, também dispôs sobre a possibilidade de celebração de acordo de leniência com a pessoa jurídica infratora. O acordo autoriza a redução das penalidades aplicáveis em troca da colaboração com o processo de apuração das infrações, permitindo a identificação dos demais envolvidos, bem como a obtenção de informações e documentos capazes de atestar a prática da conduta ilícita. Ademais, a lei 12.846 determina a inclusão de cláusulas no acordo que imponham a adoção ou o aperfeiçoamento de um programa de integridade pela empresa signatária.

Vê-se, pois, que o acordo de leniência cumpre inúmeras funções, destacando-se a preservação da empresa. Bem agiu, portanto, o legislador ordinário ao instituí-lo, porque em absoluta consonância com a Constituição, ao mesmo tempo que disponibilizou ao gestor público um instrumento consensual de política pública, cujo exercício é verdadeiro poder-dever. Com efeito, não está no âmbito do poder discricionário do administrador público, pautado por um juízo de conveniência e oportunidade, a celebração do acordo de leniência com uma dada empresa infratora se ela preencher os requisitos legais. Nessa hipótese, será imperativa a celebração do acordo, porque com ele o ressarcimento do Erário, observada a capacidade de pagamento da empresa, se mostra muito mais efetivo que aquele perseguido num processo litigioso e estará acompanhado do aporte de informações, que permitirá à Administração Pública desenvolver não apenas a responsabilização de quem mais de direito, mas também a implantação de rotinas que previnam a repetição dos ilícitos.

Não pode, assim, o gestor público, sob pena de agir com improbidade, recusar-se a firmar, preenchidos os requisitos legais, acordo de leniência, pois é de sua aplicação que a empresa infratora retirará as necessárias condições de sua própria preservação, nem tampouco deixar de reconhecer o acordo firmado, para todos os seus efeitos. Não se tem dúvida da importância do combate à corrupção, mas é igualmente fundamental para o país a preservação de suas empresas e empregos.

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*Sebastião Botto de Barros Tojal é professor da Faculdade de Direito da USP e sócio fundador do escritório Tojal | Renault Advogados.

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