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Licenciamento do direito de uso de jogos eletrônicos: obras audiovisuais ou softwares?

Uma análise comparativa dos efeitos tributários.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Atualizado às 07:39

O setor de jogos eletrônicos (games) tem sido objeto de muitas discussões jurídicas, especialmente na esfera tributária. Isso se dá em razão da importância que os jogos eletrônicos conquistaram no mercado, sendo um dos segmentos da indústria do entretenimento que mais cresce.

Segundo o relatório denominado Análise de Impacto Regulatório 1/2016/SEC, produzido pela Agência Nacional do Cinema (ANCINE), no ano de 2015 o setor movimentou no mundo US$ 91,5 bilhões, superando a indústria cinematográfica.

Atualmente os games são jogados não apenas por jogadores amadores e casuais, mas também por atletas profissionais remunerados, no contexto dos chamados e-Sports (esportes eletrônicos). Além disso, possui novos formatos, sendo disponibilizados não apenas por console e computadores, mas também online e via mobile (celulares e tablets).

Por outro lado, o setor de games no Brasil ainda está em desenvolvimento. A produção nacional carece de investimentos e incentivos, ofuscando-se diante da produção estrangeira dominante, especialmente dos EUA e do Japão. Portanto, ainda prevalece a importação dos jogos eletrônicos diante da baixa produção local.

Considerando a falta de regulamentação do setor, ainda não podemos afirmar se os games devem ser registrados como obras audiovisuais, programas de computador (softwares) ou ambos. Tal enquadramento tem efeitos na tributação dos negócios que envolvem o setor, especialmente nas remessas ao exterior pelo licenciamento do uso dos jogos no País.

A Lei dos Direitos Autorais (lei 9.610, de 1998) define como obra audiovisual uma criação do espírito que resulta da fixação de imagens e que tenha a finalidade de criar a ideia de movimento. Independe dos processos envolvidos para sua captação e do suporte ou meios usados para fixá-lo.

Os games decorrem de um processo complexo, envolvendo desde criadores até programadores, designers, editores, enfim, um time de profissionais entrelaçados com o roteiro inicialmente idealizado até a efetiva disponibilização ao consumidor.

Embora essa descrição se enquadre no conceito retirado da lei 9.610/98, o princípio da inalterabilidade das obras audiovisuais levanta uma dúvida sobre o enquadramento de games como tal. Isto porque, em tese, as obras audiovisuais não podem ser posteriormente alteradas ou editadas, e isso ocorre com frequência com os games.

Noutra esteira, temos os programas de computador (software), que muito embora sejam considerados um tipo de obra intelectual, são regulamentados pela lei 9.609, de 1998 ("Lei do Software").

De acordo com a Lei do Software, o software é um conjunto de instruções de linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou analógica para fazê-los funcionar.

Se, por um lado, os games possuem características próprias dos programas de computador (uma vez que os seus jogadores aplicam as instruções ali contidas), por outro lado trazem diversos aspectos visuais e criativos que os colocam no mesmo patamar das obras audiovisuais, tais como as suas imagens, sons e personagens.

Em sendo obra audiovisual, além da incidência do IRRF sob alíquota de 25%, as remessas ao exterior relativas ao uso, fruição ou exploração dos direitos no Brasil se enquadrariam no conceito legal de royalties e, assim, estariam sujeitas à incidência da CIDE. Também poderiam estar sujeitas ao pagamento da CONDECINE, cobrada à alíquota de 11% sobre os valores remetidos ao exterior, na hipótese de regulação da atividade pela Ancine. De outro lado, não estariam sujeitas ao ISS, por não existir previsão legal para essa tributação.

O licenciamento de uso de software, por outro lado, se sujeitaria à incidência do IRRF à alíquota de 15% e só se sujeitaria à incidência da CIDE se ficasse caracterizada a transferência de tecnologia para o Brasil, ou seja, a aquisição de conhecimentos tecnológicos. De outro lado, há previsão de incidência do ISS, cuja alíquota pode variar dependendo do município onde estiver localizado o estabelecimento do adquirente da licença.

Essa indefinição alimenta um estado de insegurança jurídica que dificulta o fomento do setor no Brasil. É altamente recomendado que o processo de regulamentação seja permeado por um diálogo interdisciplinar e por debates informados acerca das múltiplas incidências tributárias existentes no Brasil. Até lá, é imprescindível que seja feita uma análise dos riscos tributários envolvidos, mitigando riscos de autuação e cobrança de multas pelo Fisco.

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*André Sica é sócio fundador do escritório CSMV Advogados.

*Fernanda Lira é advogada do escritório CSMV Advogados.

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