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Débito de ISS não pode suspender a emissão de Nota Fiscal de Serviços Eletrônica

Essa prática tem causado grandes transtornos para os prestadores de serviços, principalmente, aos pequenos empreendedores.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Atualizado às 08:51

Em 16 de dezembro de 2011, foi publicada a Instrução Normativa 19/11 da Subsecretaria da Receita Municipal da prefeitura de São Paulo, que disciplina a suspensão da autorização para emissão da Nota Fiscal de Serviços Eletrônica (NFS-e) para os contribuintes inadimplentes, com efeito a partir de 1º de janeiro de 2012.

Desde então, essa prática tem causado grandes transtornos para os prestadores de serviços, principalmente, aos pequenos empreendedores.

Para fins de suspensão da autorização da emissão da NFS-e, considera-se inadimplente em relação ao recolhimento do Imposto sobre Serviços, o contribuinte, pessoa jurídica domiciliada no município de São Paulo, que alternativamente:

i) deixar de recolher o ISS devido por 4 (quatro) meses de incidência consecutivos; e/ou

ii) deixar de recolher o ISS devido por 6 (seis) meses de incidência alternados dentro de um período de 12 (doze) meses.

Acontece que o bloqueio da emissão NFS-e, além de ser imoral em tempos de recessão econômica, é inconstitucional, por impedir o regular desempenho das atividades econômicas do contribuinte em razão da falta de pagamento do ISS, conforme assegura a Constituição Federal, veja:

"Art. 5°. (...)
XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; (grifou-se)

______________________________________________________________________

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei." (grifou-se).

O professor Hugo de Brito Machado explica que "qualquer que seja a restrição que implique cerceamento da liberdade de exercer atividade lícita é inconstitucional, porque contraria o disposto nos artigos 5°, inciso XIII, e 170, parágrafo único, do Estatuto Maior do País."1

A propósito, o STF possui entendimento consolidado há tempos de que é vedado ao fisco compelir o contribuinte ao pagamento de tributos, por meio de cerceamento de atividade, como por exemplo, a suspensão da emissão de notas fiscais, entre outras medidas, note-se:

Súmula 70. "É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo".
Súmula 323. "É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos".
Súmula 547. "Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais".

Seguindo nessa linha de raciocínio, o STJ possui jurisprudência firme, senão vejamos:

"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ICMS. MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIZAÇÃO PARA EMISSÃO DE TALONÁRIO DE NOTAS FISCAIS. EXISTÊNCIA DE DÉBITOS COM A FAZENDA PÚBLICA. PRINCÍPIO DO LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA. ARTIGO 170, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SÚMULA Nº 547 DO STF.
1. O Poder Público atua com desvio de poder ao negar, ao comerciante em débito de tributos, a autorização para impressão de documentos fiscais, necessários ao livre exercício das suas atividades (artigo 170, parágrafo único, da Carta Magna).
2. A sanção, que por via oblíqua objetive o pagamento de tributo, gerando a restrição ao direito de livre comércio, é coibida pelos Tribunais Superiores através de inúmeros verbetes sumulares, a saber: a) é inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo (Súmula nº 70/STF); b) é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos (Súmula nº 323/STF); c) não é lícito a autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais (Súmula nº 547/STF); e d) é ilegal condicionar a renovação da licença de veículo ao pagamento de multa, da qual o infrator não foi notificado (Súmula nº 127/STJ).
3. Destarte, é defeso à administração impedir ou cercear a atividade profissional do contribuinte, para compeli-lo ao pagamento de débito, uma vez que este procedimento redundaria no bloqueio de atividades lícitas, mercê de representar hipótese da autotela, medida excepcional ante o monopólio da jurisdição nas mãos do Estado-Juiz.
4. Recurso especial desprovido. (REsp 783766, Rel. Luiz Fux. DOU 03.05.07)." (grifou-se)

Especificamente quanto à suspensão da NFS-e pelo município de São Paulo em razão de inadimplência do ISS, o TJ/SP possui entendimento pacífico que a IN SF/SUREM 19/11 é norma inconstitucional, veja:

"APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. EMISSÃO DE NFS-e.
Pretensão de afastar a aplicação da Instrução Normativa SF/SUREM nº 19/2011, que prevê a suspensão da autorização para emissão de notas fiscais de serviço eletrônicas para contribuintes inadimplentes. Admissibilidade. Impossibilidade de a autoridade municipal condicionar a emissão ao pagamento de débitos fazendários. A Administração Pública deve se valer de instrumentos próprios para cobrança de seu crédito. Aplicação análoga das Súmulas 70, 323 e 547 do C. STF. Sentença que denegou a segurança reformada. Recurso de apelação da impetrante provido.
(Ap. nº 1019530-86.2015.8.26.0053. DJe 06.04.2016. Rel. Maria Laura Tavares)" (grifou-se)

"Mandado de Segurança. Medida liminar para afastar obrigação de não emitir notas fiscais de serviços. Indeferimento. Contribuinte em situação de inadimplência. Instrução Normativa n. 19/2011 SF/SUREM. Decisão reformada. Ato que inviabiliza o livre exercício da atividade econômica. Inexistência de disposição legal sobre a questão. Inconstitucionalidade do referido ato normativo já pronunciada pelo C. Órgão Especial. Precedentes do STF e deste Tribunal. Agravo de instrumento provido.
(AI nº 2217755-63.2016.8.26.0000. DJe 06.03.2017. Rel. Antonio C. A. Cortez)"

Portanto, diante das considerações efetuadas acima, não resta nenhuma dúvida de que as medidas adotadas com objetivo de forçar o pagamento de ISS pela prefeitura de São Paulo, suspendendo o funcionamento da NFS-e é inconstitucional, uma vez que fere o livre exercício de atividade profissional do contribuinte.

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1 Paulsen. Leandro apud Machado. Hugo de Brito. Direito Tributário. Ed. Livraria do Advogado. pág. 745.

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*Carlos Alberto Gama é advogado no Kauffman, Abid e Versolatto - Advogados Associados.

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