RSE: prevenção e precaução como mecanismos de prevenção de passivos trabalhistas
Na sociedade contemporânea o respeito à dignidade humana e ao meio ambiente de trabalho saudável representam instrumentos de paz e de equilíbrio social.
quinta-feira, 22 de junho de 2017
Atualizado às 12:07
Os acidentes de trabalho e as doenças ocupacionais provocam gravíssimas repercussões em todo o ambiente empresarial, mas, especialmente, no campo jurídico, constituindo hoje a prevenção de riscos, uma área de gestão estratégica das organizações.
A prevenção de riscos profissionais proporciona um ambiente de trabalho mais seguro e agradável aos trabalhadores promovendo sua dignidade e o valor social do trabalho, além de representar a diminuição de custos para a empresa, decorrentes de eventuais condenações judiciais. Estes fatores, somados, em última análise, importam em aumento de produção e produtividade.
Na sociedade contemporânea o respeito à dignidade humana e ao meio ambiente de trabalho saudável representam instrumentos de paz e de equilíbrio social.
O meio ambiente laboral é tema de fundamental importância e a sua regulação, vigilância e controle pelas autoridades competentes são precípuas, pois o meio ambiente saudável é reflexo de uma sociedade íntegra, com respeito máximo dos direitos fundamentais à vida, à saúde, corolários do pilar máximo da dignidade da pessoa humana e reflete ainda outro princípio magno de extremo valor social: a função social da empresa.
Em pesquisa aos processos que adentraram ao Tribunal Superior brasileiro, é possível constatar que em 2017 apenas, até abril, foram registrados 2.241 processos com pedido de danos morais em decorrência de acidentes de trabalho. Com pedidos de dano material, este número sobe para 2.9611.
A quantidade de demandas ajuizadas em 2017 apenas com os pedidos de Dano Material representa 34% do total de processos do acervo do Tribunal Superior do Trabalho brasileiro, num total de 8.809. As referentes aos pedidos de danos morais, representam 87% dos 2.569 processos totais2.
No dia 20 de fevereiro de 2017, a dimensão do caso se demonstrou tão grande que o STF julgou para a suspensão de todos os processos que tratem sobre o tema no Brasil para o julgamento da chamada Repercussão Geral. O plenário do tribunal entendeu que a matéria tem natureza constitucional e tem repercussão econômica e social, tendo em vista sua relevância para o desenvolvimento das relações empregatícias.
O Brasil ainda não ratificou a Convenção 187 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê a adoção de medidas mais efetivas para preservação da segurança e saúde.
Convenção 155 da OIT, que trata da segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho, foi aprovada pelo Brasil (decreto 2/92 e decreto 1.254/94).
A Convenção 161 da OIT, também aprovada pelo Brasil (decreto 86/89 e decreto 127/91), caminha neste mesmo sentido, ao priorizar em seu art. 1B, I e II as funções essencialmente preventivas dos serviços de saúde no trabalho, que devem orientar o empregador, os trabalhadores e seus representantes na empresa sobre os:
I. requisitos necessários para estabelecer e manter um ambiente de trabalho seguro e salubre, de molde a favorecer uma saúde física e mental ótima em relação com o trabalho";
II. a adaptação do trabalho às capacidades dos trabalhadores, levando em conta seu estado de sanidade física e mental.
O ser humano, em um certo momento inserido no conceito da lógica do descarte no ambiente laboral hodiernamente com o surgimento de uma nova questão social, marcada por acirradas controvérsias em relação à segurança, à saúde e à integridade física no meio ambiente de trabalho. O desequilíbrio entre trabalhadores e empregadores se torna axiomático em um nível que uma catarse se tornava iminente.
Tanto o princípio da precaução como o da prevenção devem atuar na atual gestão empresarial. Com o tempo a doutrina, que os reputava sinônimos, evoluiu no sentido de constatar e demonstrar que se tratavam de conceitos distintos.
O princípio da prevenção pode ser sintetizado como o conjunto de fatores que se relacionam com a execução das atividades dos trabalhadores e envolve elementos materiais, como locais de trabalho em sentido amplo, maquinas, móveis, utensílios e ferramentas e imateriais como rotinas e processos dentro oriundo do poder diretivo patronal.
Já o princípio da precaução consiste na adoção antecipada de medidas amplas, que possam evitar a ocorrência de possível ameaça à saúde e segurança. Aponta para a necessidade de comportamento cuidadoso, marcado pelo bom senso, de abrangência ampla, direcionado para a redução ou eliminação das situações adversas à saúde e segurança. Considera-se que as medidas de proteção adotadas com base na incerteza científica poderão ser reexaminadas com o avanço e a segurança das descobertas científicas a qualquer momento tornando-se o mais democrático dos princípios, pois, além de ele assegurar um mínimo de segurança, paralisando atividades, quando envolvidas pela incerteza científica, ele também pode ser revisto ao longo dos estudos e descobertas científicas que assegurem a segurança do empreendimento, obra ou atividade que antes se julgava arriscada.
A prevenção trabalha com os riscos conhecidos pela ciência, a precaução deve observar os riscos ainda desconhecidos. Por isso, o princípio da precaução deve ser aplicado até mesmo antes do princípio da prevenção, eis que, na dúvida sobre uma determinada atividade apresentar perigo ou não, deve-se decidir a favor do meio ambiente do trabalho.
A falta de parametrização da responsabilidade das empresas pode trazer uma gama de prejuízos financeiros e estruturais à empresa. Deixar esta definição para os juízes é retirar toda e qualquer certeza do empresário, sem garantia de efetiva atenção às necessidades do empregado.
Como dever-se ético da gerência da empresa para com seus stakeholders, a ideia de que um imprevisível possa se tornar constante gera insegurança em todo o aparato estrutural da empresa, gerando desconfiança e retração de investimentos, bem como retirada de capital, o que causaria uma queda exponencial de seu setor financeiro, podendo resultar no encerramento de suas atividades.
Em face da falta de garantias legislativas que possam determinar uma aplicação coerente das decisões judiciais nas várias instâncias existentes no Brasil, o fato da necessidade de uso de medidas extremas para a solução destes conflitos faz com que se crie expectativas que podem não corresponder com a realidade, bem como não trata de forma efetiva da prevenção e da minimização dos danos que podem ser causados pelo acidente de trabalho.
Neste sentido, poderíamos utilizar a responsabilidade civil como incentivo econômico como meio de coagir o comportamento dos empresários a fim de gerar um interesse maior pela prevenção dos acidentes do trabalho, tendo em vista a possibilidade de que ele possa vir a ser condenado ao pagamento de indenizações ao trabalhador, ou à sua família, no caso de falecimento, em valores arbitrados judicialmente que podem superar os gastos reais, bem como a capacidade econômica da empresa, que teria havido anteriormente, caso o comportamento preventivo fosse adotado.
Indagamos, é mais barato prevenir ou indenizar? Para uma efetiva conclusão concomitante a adoção de um comportamento adequado, é necessário que o texto da lei seja racional, ou seja, é necessário que de sua leitura seja perceptível que a prevenção é o caminho a ser adotado, tanto para um ambiente de trabalho saudável, como para minimizar a responsabilização e consequentemente os custos da empresa.
As empresas devem possuir as informações necessárias para avaliar e adotar medidas preventivas eficientes e dentro do escopo de seu empreendimento, para que não haja gastos desnecessários ou insuficientes no tocante a prevenção no ambiente de trabalho.
Sendo assim, a redação legislativa necessita ser lógica, sucinta e coerente para que sem esforços, seja compreendida quais as reais necessidades de prevenção, pois o caráter coercitivo da norma se torna devidamente eficaz, já que será possível realmente quantificar o custo e o benefício da prevenção, já que além de preservar a saúde do trabalhador, é possível aduzir que não haverá prejuízo no empreendimento decorrente do pagamento de indenizações por responsabilidade civil.
O interesse dos investidores, juntamente com seu poder aquisitivo, é o verdadeiro guia dos interesses das empresas, entretanto a força de trabalho é o que possibilita a concretização de todo e qualquer plano econômico que possa vir a ser traçado.
Dentro deste paradigma, é possível enxergar que a manutenção do meio ambiente de trabalho saudável, e a diminuição de todos os riscos que possam vilipendiar a saúde do trabalhador são objetos que merecem profunda atenção tanto de empresários quanto de gestores.
Assim, faz-se mister que dentro do panorama da responsabilidade social empresarial seja incutido a cultura de prevenção e precaução com o intuito de minimizar e reduzir os riscos de acidentes e consequentemente as possíveis demandas judiciais decorrentes dos acidentes que possam vir a ocorrer.
Dentro da legislação brasileira já existem diversos mecanismos que indicam o mínimo a ser observado pelos empresários e gestores no que diz respeito à segurança, mas estes parâmetros são apenas basilares, devendo a prevenção e a precaução serem aprofundadas nos paradigmas empresariais
O momento atual é de disrupção de antigos paradigmas empresariais e o enraizamento na responsabilidade social empresarial dos princípios da prevenção e da precaução para que seja possível a construção de uma gestão mais inteligente e efetiva para que seja possível maximizar os lucros e minimizar o impacto na saúde dos trabalhadores.
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1 TST: CASOS NOVOS POR ASSUNTO. Disponível aqui.
2 TST: ACERVO POR ASSUNTO. Disponível aqui.
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*Adriano Jannuzzi Moreira é graduado em Direito pela UFMG, especializou-se em Direito Tributário pela Universidade Gama Filho. Mestre em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos. Possui MBA em Gestão de Negócios pela Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais. Pela UPC Universitat Politécnica da Catalunha especialização Internacional em Gestion Integrada de Prevencion, Médio Ambiente y Calidade e Síndrome del Edificio Enfermo.