O que mudou na lei de nacionalidade e a influência para os lusodecendentes brasileiros
A prova dos laços de efetiva ligação com a comunidade portuguesa já é um requisito exigido em processos de nacionalidade.
terça-feira, 13 de junho de 2017
Atualizado às 07:41
No Dia de Portugal deu se a promulgação simbólica da lei de nacionalidade portuguesa. O quê de fato muda para os lusodescendentes?
Neste sábado o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, encerrou as comemorações do 10 de junho, dia de Portugal, com elogios aos emigrantes e lusodescendentes em São Paulo, Estado que abriga 200 mil dos 650 mil portugueses que vivem no Brasil.
Horas antes no mesmo dia, ainda na cidade do Porto em Portugal, promulgou simbolicamente, o diploma do Governo que regula o acesso à nacionalidade portuguesa por parte de netos de portugueses nascidos no estrangeiro.
Esse decreto-lei foi aprovado em Conselho de Ministros no passado dia 20 de Abril. Quanto aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro, prevê a possibilidade de atribuição de nacionalidade se, entre outras condições, tiverem "laços de efectiva ligação à comunidade nacional" e declararem que "querem ser portugueses".
Atualmente o processo é de naturalização. A nova lei de Nacionalidade atribui aquisição originária de nacionalidade.
A lei de Nacionalidade sofreu alterações, especialmente para aquisição de nacionalidade por estrangeiros que tenham pelos menos um ascendente do 2º grau em linha reta de nacionalidade portuguesa, ou seja, para os netos de portugueses. O processo instaurado pela norma até aqui vigente, atribui nacionalidade por naturalização, não havendo aquisição originária de nacionalidade e, portanto, a nacionalidade não se transmite às gerações seguintes, sendo até então a via de majoritária eleição pelos lusodesentendes brasileiros para o pleito de nacionalidade, os quais têm suas origens portuguesas nas imigrações que se deram especialmente no início do século passado, representando hoje os brasileiros que são netos, bisnetos e tataranetos de portugueses.
O 10 de junho assinala definitivamente um dia importante à esta questão, pois, o decreto regulamentar, simbolicamente promulgado e ainda não publicado, trará eficácia às referidas alterações legislativas.
Se por um lado a nova lei, expressamente revogou a possibilidade de naturalização aos netos, por outro lado atribui efeito "ex tunc" à nova regra, ao dispor que as alterações introduzidas em matéria de aquisição originária de nacionalidade aplicam-se também aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro em data anterior a sua vigência.
Entretanto, seguindo uma tendência em matéria de politicas públicas portuguesa de nacionalidade iniciada em 2006, que passou a prestigiar o ius soli e o ius domicilli, a nova lei ao possibilitar a aquisição de nacionalidade de forma originária para os netos de portugueses, que em efeitos práticos faculta, portanto, a aquisição às seguintes gerações e, dessa forma passa a alcançar os bisnetos. A norma passa a exigir, porém, o preenchimento de certos requisitos e prova da chamada ligação efetiva com a comunidade portuguesa.
Este é o ponto fulcral de anseio do meio jurídico e de descentes que se interessam pela questão, uma vez que com a publicação do decreto regulamentar a matéria tornar-se-á clarificada.
Publicação do decreto regulamentar e a "ligação efetiva com a comunidade portuguesa".
A prova dos laços de efetiva ligação com a comunidade portuguesa já é um requisito exigido em processos de nacionalidade propostos com outros fundamentos, como por exemplo, os cônjuges de portugueses e, por tratar-se de um critério subjetivo, para sua prova tem seguido o posicionamento jurisprudencial.
Espera-se que o tão aguardado decreto regulamentar que dará eficácia às alterações legislativas trace de forma objetiva os critérios que passarão a ser compreendidos como laços de efetiva ligação com a comunidade portuguesa para os netos de portugueses.
Como ressaltado, em reforço à tendência de uma política pública que prestigia o ius soli e o ius domicilli, em 20 de abril p.p. o Ministério da Justiça publicou nota esclarecendo quais serão os critérios adotados e estes valorizam a prévia residência em Portugal, e, sendo assim, em um primeiro momento parecem dificultar a obtenção de nacionalidade para a maioria dos brasileiros netos de portugueses:
a) A residência legal em território nacional;
b) A deslocação regular a Portugal;
c) A propriedade em seu nome há mais de 3 anos ou contratos de arrendamento celebrado há mais de 3 anos, relativos a imóveis sitos em Portugal;
d) A residência ou ligação a uma comunidade histórica portuguesa no estrangeiro;
e) A participação regular ao longo dos últimos 5 anos à data do pedido na vida cultural da comunidade portuguesa do país onde resida, nomeadamente nas atividades das associações culturais e recreativas portuguesas dessas comunidades.
Visto que há três anos se espera pela publicação do Decreto Regulamentar e desde abril p.p. apenas dispúnhamos de uma nota ministerial, justificou-se a orientação para os netos de portugueses buscarem o quanto antes a propositura do processo para naturalização. Algumas dúvidas permanecem e serão finalmente elucidadas com a oficial publicação do decreto.
Por outro lado, aos lusodescendentes que atualmente não preenchem os sinalizados requisitos para propositura de pedido de nacionalidade portuguesa e aos demais brasileiros que veem Portugal como a menina de seus olhos e almejam lá viver, resta usufruir dos inúmeros incentivos que dispõe o Governo Português que visam fomentar os investimentos em Portugal, seja através das autorizações de residência para atividade de investimentos, como é o exemplo do Visa Gold, seja pelos vistos de residência destinados à aposentados e titulares de rendimentos que propiciam isenções tributárias para rendimentos e pensões obtidas fora de Portugal.
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*Angelita Reis é lusodescendente, advogada inscrita na OAB e Portugal e mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa.