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Leniência do judiciário ao apreciar atos de improbidade administrativa

Marcos Vinicius Marinho da Silva e Armando Soares de Castro Formiga

O referente artigo encontra ensejo na impunidade dos agentes políticos e públicos frente ao Poder Judiciário, orquestrando atos que originaram maiores ônus que propriamente benefícios.

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Atualizado às 08:22

INTRODUÇÃO

Em consonância com o autor De Plácido e Silva, probo e probidade derivam do latim probus, probitas, aquilo que é reto, leal, justo, honesto, podendo ser interpretado também como uma "maneira criteriosa de proceder". Decorrente de improbitas que significa, imoralidade, malícia, desonestidade, má conduta e índole. Ainda seguindo o ilustre autor supracitado, ímprobo "é o perverso, corrupto, devasso, desonesto, falso, enganador" (PLÁCIDO E SILVA, 2016 p. 432;454). Em outra descrição, o autor Antônio Geraldo da Cunha, no Do dicionário etimológico da língua portuguesa assim a define, "probo refere-se a quem apresenta caráter íntegro" (CUNHA, 2011, p. 522.), ou seja, em sentido inverso, ímprobo é quem se encontra em estado de integridade. Em igual raciocínio, Garcia e Alves salientam: "probus" quer dizer "o que brota bem" (pro+bho - da raiz bhu, nascer, brotar)" (2011, p. 109).

Portanto, probidade se define como, o comportamento honesto, baseado na retidão do caráter íntegro e em segundo plano, o surgir do bem, manter-se leal ao proceder nas atitudes. Improbidade administrativa, em compêndio, elucida o comportamento que rompe a honestidade e a lealdade que se espera ao gerir da coisa pública, independente da atribuição de agente público ou de correligionário privado. Improbidade administrativa traduz a mais alta desconfiguração da fidelidade assumida por quem faina com bens e poderes cujo tem como titular último o povo.

A história e a filosofia nunca obliteraram a improbidade, tanto dos homens da sociedade quanto dos homens do Estado. Sendo aquela a improbidade comum, intrínseca da humanidade de forma geral; Locke em sua obra Dos Tratados de Governo Civil desperta a sociedade a caucionar-se contra qualquer atentado, mesmo dos legisladores, sempre que se mostrassem levianos ou maldosos e regessem planos contra a liberdade e propriedade dos indivíduos. E esta, a improbidade que alcança os valores morais da maior parte da sociedade, empregados ao Estado, tem-se Maquiavel que em seu livro O Príncipe aduz dentre as várias lições sobre a melhor conduta a ser adotada pelos soberanos, aconselhava o príncipe a não manter-se fiel às suas promessas quando suprimida a causa, eis que seu cumprimento poderia gerar gravame, uma vez que nem todos os homens eram bons.

Os desvios comportamentais que postergam a normatividade estatal, ou os valores morais de determinado grupo em troca de uma vantagem correlata, manifestar-se-ão como principal via de degradação dos padrões ético-jurídicos que devem manear o comportamento individual nas esferas pública e privada.

Segundo a história, especificamente a do Brasil, mostra que a corrupção tem suas entranhas na colonização do país. A Monarquia à época foi a base para a edificação do sistema colonial português, onde o monarca que detinha total poder, a exemplo, a Constituição de 1824, em que estabelecia 4 (quatro) poderes constituintes, o Poder Executivo, gerido pelo monarca, o Poder Legislador, formado por deputados, o Poder Judiciário, formado por juízes e ministros; e por último, talvez mais importante, o Poder Moderador, que detinha controle sobre todos os outro, também chefiado pelo monarca (VICENTINO; GIANPAOLO; 2012).

Com a chegada da família real ao Brasil, o modelo aplicado por D. João VI para aproximar-se e conseguir apoio político e financeiro da elite local foi à concessão de honrarias e títulos de nobreza à época, transmutando a importância dos títulos de acordo com a intensidade do retorno e fortalecimento declinados à Coroa. Somente em oito anos, D. João VI distribuiu mais títulos de nobreza que Portugal nos trezentos anos anteriores. (GOMES. 2007, p. 196-197). Essa elite que se formou com esse exemplo, desprovida de valores éticos e instigada pelo espírito do "é dando que se recebe", ascendeu ao poder e sedimentou um verdadeiro cancro na estrutura administrativa. O tesoureiro de D. João VI Bento Maria Targini, foi nomeado barão e depois visconde, imortalizando-se na célebre frase "Quem furta pouco é ladrão, quem furta muito é barão, quem mais furta e esconde, passa de barão a visconde" (CAVALCANTI, 2011 p. 46).

Diante desse cenário implantado, já no começo do século XIX, as distorções comportamentais não permaneciam restritas aos detentores de poder, mostrava-se disseminadas dentro do ambiente social. Thomas Lindley descreve em sua narrativa "Narrativa de uma viagem ao Brasil" assim aos comerciantes baianos da época: "[e]m seus negócios, prevalece à astúcia mesquinha e velhaca, principalmente quando efetuadas a s transações com estrangeiros, aos quais pedem o dobro do preço que acabarão aceitando por sua mercadoria, ao passo que procuram desvalorizar o que terão de obter em troca, utilizando-se de todos os artifícios ao seu alcance, Numa palavra, salvo algumas exceções, são pessoas inteiramente destituídas do sentimento de honra, não possuindo aquele senso geral de retidão que deve presidir a toda e qualquer transação entre os homens." Destacando que ética e honestidade já não eram valores que gozavam de grande prestígio à época.

Essas distorções auferidas no Brasil à época de sua colonização continuaram a expandir quando tornou-se Reino, e institucionalizada durante a República, e absurdamente vivo nos dias atuais, leva-nos a uma descrença de solução e uma verdadeira crise de valores morais, éticos e políticos fazendo-me lembrar de um trecho da obra O Príncipe de Nicolai Maquiavel, onde escreve "também aqui, como dizem os médicos sobre a tuberculose, no início o mal é fácil de curar e difícil de diagnosticar. Mas, com o passar do tempo, não tendo sido nem reconhecida nem medicada, toma-se fácil de diagnosticar e difícil de curar. O mesmo sucede nos assuntos de Estado. Prevendo os males que nascem, o que só é permitido a um sábio, estes são curados rapidamente. Mas quando se permite que cresçam, por não havê-los previsto, todos os reconhecem, porém não há mais remédio".

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*Marcos Vinicius Marinho da Silva é acadêmico do curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins.

*Armando Soares de Castro Formiga é professor da Faculdade Católica do Tocantins.

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