Mediação, impedimento e suspeição
A mediação busca dar efetividade aos direitos individuais atribuindo ao cidadão a possibilidade de tornar-se senhor de seu destino, assenhorando-se da busca do seu processo decisório.
quinta-feira, 18 de maio de 2017
Atualizado em 17 de maio de 2017 09:44
Diante da premente necessidade de divulgar e estimular no Brasil a utilização do sistema multiportas, especialmente a mediação, enquanto habilitante ao exercício da cidadania, nunca é demais lembrar os princípios pelos quais deve pautar-se, que, invariavelmente reafirmam a ética como princípio maior.
A mediação é um instituto que deve ser entendido não apenas como uma qualidade normal, inerente ao homem comum e atinente ao direito natural, e que está em íntima relação com a boa fé, mas também como um instituto que decorre da ordem constitucional e legal.
É o que se depreende da leitura da nossa Constituição Federal, desde seu artigo primeiro e, ainda dos artigos 5º, 37, para citar mais alguns. Também, não escapou ao legislador infraconstitucional, e pode ser verificado, para ficarmos nos exemplos mais específicos, nos artigos 2º, 5º e 30 da Lei de Mediação, no Estatuto da OAB artigo 34, inciso VII, no Código de Ética dos Advogados, artigos 10, 35 e 36 e no artigo 2º e 166 do NCPC, sempre tendo em mira o cidadão e o exercício e garantia de seus direitos.
De fato, a mediação busca dar efetividade aos direitos individuais atribuindo ao cidadão a possibilidade de tornar-se senhor de seu destino, assenhorando-se da busca do seu processo decisório. E assim o faz, tendo por base princípios basilares, entre eles o da autonomia da vontade e da confidencialidade garantidores do processo, corolários que são do dever ético, que obriga a todos os envolvidos na relação, e que traz como consequência, o poder-dever do mediador. Portanto, qualquer que seja sua profissão de origem, o mediador poderá se dar como impedido ou suspeito, nos termos da legislação processual de regência, todas as vezes em que, consultado sobre a possibilidade de atender a determinado cliente, deparar-se com situação na qual já tenha atuado anteriormente a qualquer título, e ainda, quando estiver diante de situação que, por razões de foro íntimo, o impeçam de zelar pelo procedimento de modo equânime.
Digo poder-dever, porquê a ele não pode o mediador furta-se, especialmente pelo fato de que o procedimento de mediação envolve várias partes às quais deverão sempre ser oferecida confiança e conforto para buscarem, com segurança, a volta do processo dialógico que, em toda área do interesse humano, permitirá a busca de um caminho.
Nunca é demais lembrar que o procedimento de mediação, é parte de um sistema, decorrente de uma decisão política abrangente que, enquanto política judiciária, deve estrito cumprimento ao legislado.
Daí porquê estende-se também aos egressos das carreiras públicas e de outras carreiras ou profissões que sejam pautadas pelo sigilo profissional e que tenham, de algum modo, se manifestado em assuntos que envolvam um dos mediandos ou ambos.
Sendo assim, a obrigatoriedade de declaração de eventual impedimento ou suspeição, por parte dos mediadores quando procurados pela parte, é dever legal, pautado também no princípio da boa-fé.
Tais cautelas são imprescindíveis para que as partes possam, conscientes das causas que levaram à declaração de suspeição ou impedimento do mediador por elas procurados, aferirem se podem ou não suplantá-las, com base na efetiva confiança que, ainda assim, depositam nos mediadores escolhidos para o procedimento de mediação. Nunca sendo demais lembrar que, acaso a opção seja a revelação efetiva da causa do impedimento, o mediando que a ela deu causa, deve autorizar o ato, sob pena de ter-se infringido o sigilo profissional.
São cuidados como esses, que devem ser avaliados caso a caso, que permitirão a eficácia da implementação entre nós da cultura da paz.
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*Cláudia Junqueira de Almeida Prado é mediadora do Instituto de Mediação Luiz Flávio Gomes.