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Aspectos como a PEC do Teto dos Gastos Públicos (PEC 55 ou PEC 241), MP 739/16 e a Reforma Previdenciária (PEC 287/16) e a dizimação das comunidades indígenas de Dourados-MS

Hoje a situação de algumas famílias dentro da comunidade indígena Aldeia Bororó é precária, seja por falta de saneamento básico ou por falta de fonte de renda.

terça-feira, 28 de março de 2017

Atualizado às 08:12

Introdução

Apresentamos os aspectos gerais e específicos da relação entre as tristes reformas do final de 2016 e começo de 2017 e o indígena do sul de Mato Grosso do Sul - segunda maior população demográfica do país. Para isto faremos uma análise dos aspectos das
PEC 55 (ou 241), MP 739/16 e a Reforma Previdenciária - PEC 287/16 - e suas mudanças na vida do povo no Brasil; daremos pinceladas na relação do indígena da Região de Dourados-MS e a sua vulnerabilidade social.

As contrarreformas e os índios de Dourados-MS: uma busca por resultados que não sejam os previsivelmente negativos

A Previdência Social é único instituto federal de cunho socialista no que diz respeito ao próprio entendimento sociológico do termo. Para tanto fazemos remissão ao que nos ensina Marcel Mauss (2003), antropólogo francês, sobre suas considerações a respeito da importância da previdência junto a um projeto mais socialista/comunitário de sociedade.

Toda a nossa legislação de previdência social, esse socialismo de Estado já realizado, inspira-se no seguinte princípio: o trabalhador deu sua vida e seu trabalho à coletividade, de um lado, a seus patrões, de outro, e, se ele deve colaborar na obra da previdência, os que se beneficiaram de seus serviços não estão quites em relação a ele com o pagamento do salário, o próprio Estado, que representa a comunidade, devendo-lhe, com a contribuição dos patrões e dele mesmo, uma certa seguridade em vida, contra o desemprego, a doença, a velhice e a morte (MAUSS, 2003, p.296)1.

Sabe-se que o cotidiano de uma grande maioria de indígenas da cidade de Dourados-MS é dotado de uma imensa vulnerabilidade social (BECKER & ROCHA, 2016)2, que se organizam de forma cultural, e demográfica que vai além da Reserva Indígena de Dourados, com elementos culturais próprios entre as Aldeias Bororó, Jaguapiru, Boquerão e Apyka'i, Aldeia MS Mudas, Panambizinho, que são divididas políticamente pelos próprios indígenas que ali residem.

Isto posto, com os projetos de lei aqui pautados, como a PEC 55 e/ou PEC 241, intituladas de PEC do Teto dos Gastos Públicos, que foi aprovada recentemente, teremos os recursos que são investidos em áreas básicas da sociedade brasileira, como educação, saúde e assistência, desestatizados, ou seja, não poderão receber acréscimos em percentual de recursos por um período de vinte anos. O desestatizado é para remarcar o quanto o Estado foge de suas obrigações enquanto de bem-estar social.

A PEC 55 e/ou PEC 241 ataca diretamente as comunidades indígenas, pois são povos com maior vulnerabilidade devido às poucas ou às inexistentes ações do Poder Público para os cidadãos que vivem em tais áreas. Um grande exemplo disto é o acesso a saúde, que é limitadíssimo a 3 (três) postos de saúde espalhados em 3.600 hectares3 e para a segunda maior população indígena do Brasil. Os recursos que serão repassados a estes entes públicos não acompanharam a demanda demográfica, logo, se verá uma maior procura à benefícios da Previdência Social, por fatores que envolva a saúde dos indígenas devido ao impedimento ao labor por questões de saúde, e estes, requereram benefícios previdenciários como auxílio-doença, aposentadoria por invalidez, LOAS ao deficiente, LOAS ao idoso (BPC), pois se atestará um crescente número de cidadãos com impedimentos ou incapacidades para o labor devido a falta de assistência médica dentro das Reservas Indígenas. Ou ainda, poderemos ver o Estado proporcionando uma maior precarização da vida dos sujeitos mais vulneráveis, porque mais pobres no recorte determinista social de classe.

O que vai ser proposto e, principalmente, o que vai ser aprovado é uma mistura de decisão política com embasamento técnico. Há questões políticas em qualquer reforma (FOLHA DE SÃO PAULO, 2016, p.A12). Aqui podemos destacar que o termo reforma usado pelo Poder Público é apresentado erroneamente, pois, a reforma vem para dar melhor forma, o que de fato não acontecerá para os futuros beneficiários da Previdência Social. Por isso, consideramos uma CONTRARreforma da Previdência Social esta PEC 287/2016, pois vai em outra direção, que não a benéfica para os segurados do RGPS, consequentemente, os menos afortunados economicamente desta pátria.

De concreto, há a vigência da não menos polêmica MP 739/2016 (legislação produzida pelo Presidente Interino em Exercício e não pelo legislativo), responsável por sublinhar que as pessoas seguradas e contempladas tanto pelo auxílio-doença quanto pela aposentadoria por invalidez poderão ser "convocadas" para avaliação a qualquer momento pelo INSS, afim de se verificar se as condições que ensejaram os benefícios se mantêm ou não4.

Hoje a situação de algumas famílias dentro da comunidade indígena Aldeia Bororó é precária, seja por falta de saneamento básico, seja por falta de fonte de renda, tendo em vista que em grande medida, a subsistência se dá através da prática da agricultura de mandioca, milho, batata, feijão, frutíferas e soja (Pereira, 2013)5. Por outro lado, a "situação de reserva" (Pereira, 2004, p. 256)6 que combina a limitação do espaço com o forte adensamento populacional da área reflete diretamente na baixa produtividade agrícola, por fim, tendo a subsistência de tais famílias nas mãos do assistencialismo de cestas básicas da FUNAI e do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul.

Tais áreas de comunidade indígenas são reconhecidas hoje pela Carta Magna brasileira, logo no seu art. 231, CRFB/88, o qual, de modo explícito, reconheceu o valor da cultura indígena ao afirmar que "são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições". Assim se vê essa ordem pluriétnica e multicultural na CF/887. As tradições e seu cotidiano nas comunidades indígenas devem ser analisadas por um contexto antropológico - a partir do ser humano - para então sugerirmos os impactos que estas ações de contrarreforma resultaram. OBS: o que se busca neste artigo é evitar que estes resultados, que serão negativos, venham se efetivar.

Outro medo que assombra a população brasileira, no que se tange às reformas, é a da Proposta de Reforma Trabalhista apresentada pelo Poder Executivo no dia 22 de dezembro de 2016 que, como a Reforma da Previdência, será enviada ao Congresso com regime de urgência, mascarada pela contrapartida dos saques integrais de contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na
MP 363/16. Apesar de maquiarem o anúncio da Reforma Trabalhista, as (multi)mídias têm apontado tais mudanças importantes na vida do trabalhador brasileiro, como o aumento significativo na jornada de trabalho (CARTACAPITAL, 2016)8. Assim, a insegurança jurídica, diante de tais contrarreformas é algo evidenciado nas rodas de conversas, ou nos amplos debates no mundo digital. Insegurança é o que os brasileiros estão sentindo diante de tais contrarreformas anunciadas.

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1 MAUSS, Marcel (2003). Ensaio Sobre a dádiva. Forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. In: Sociologia e Antropologia. São Paulo: Cosac & Naify, pp.185-318.
2 BECKER, Simone e ROCHA, Taís de Cássia Peçanha. 2016. Nota Sobre a "Tutela Indígena" no Brasil (legal e real): com toques de particularidades do sul do Mato Grosso do Sul. Trabalho de Conclusão de Curso/artigo da Especialização em Direitos Humanos. Dourados: UFGD.
3 PROGRESSO, (2017). Disponível em:
(clique aqui) acesso: 01/03/2017 às 21:20hrs.
4 DIAS, Rachel Aparecida Soares Sanches; BECKER, Simone. Análise Discursiva de Práticas do INSS voltadas à erradicação e ao enfrentamento dos feminicídios. 2015. Especialização em Direitos Humanos em forma de artigo. Dourados: Universidade Federal da Grande Dourados/UFGD.
5 PEREIRA, Levi Marques. A Reserva Indígena de Dourados - RID, Mato Grosso do Sul: a atuação do Estado brasileiro e o surgimento de figurações indígenas multiétnicas, 2013, mímeo.
6 PEREIRA, Levi Marques. Imagens kaiowá do sistema social e seu entorno. Tese de Doutorado defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) da USP. São Paulo: USP, 2004.
7 VITORELLI, Edilson, Estatuto do Índio - Lei nº 6.001/1973, 3º Ed., Salvador - 2015, Editora JusPodivm.
8 CARTACAPITAL (2016). Disponível em: 
(clique aqui) acessado em: 01/03/2016 às 21:45hrs.

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*Valentin Ferreira Moraes é graduando em Direito na FADIR - UFGD

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