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Da prática de "pejotização" reconhecida judicialmente - a fraude trabalhista cometida por empregadores para a sonegação dos direitos do trabalhador

Ao profissional que dedicou anos de estudo para firmar-se no mercado de trabalho, encontrando-se no prejuízo em relação a seus direitos trabalhistas, orienta-se que procure a Justiça do Trabalho.

segunda-feira, 27 de março de 2017

Atualizado às 07:47

Em decisão de 24 de fevereiro de 2017, a Quinta Turma do TST1 não conheceu o recurso de uma clínica de Vila Velha (ES), que buscava modificar a decisão do v.acórdão do TRT da 17ª Região, o qual havia reconhecido o vínculo trabalhista de um médico que realizava exames de ultrassonografia. No caso concreto, ficou comprovado que o médico foi coagido a constituir a pessoa jurídica para prestar serviços à clínica, no entanto, com subordinação jurídica e demais requisitos legais o que configurou vínculo empregatício e consectários legais (Processo: RR-1224-80.2014.5.17.0002).

Neste caso, mais uma vez a Justiça do Trabalho, por decisão do TST, reconheceu a prática da "pejotização", que consiste na prejudicial situação de impor ao trabalhador a criação de uma pessoa jurídica que "preste serviços" ao empregador em troca de supostos benefícios, como um salário superior sem os encargos trabalhistas. Na verdade, o trabalhador deixa de receber, ao optar por não ter carteira assinada, os direitos trabalhistas previstos em lei, como FGTS, Previdência Social, 13º salário, férias, horas extras, seguro-desemprego, entre outros.

Com efeito, o profissional é prejudicado, sendo coagido a constituir a pessoa jurídica para finalidade de atuação no mercado e permanência no emprego, como no caso do médico em análise (muitos em início de carreira não podendo sequer questionar a condição de trabalho). A decisão do TRT3 (Processo RO-1224/2014-0002-17) externou os seguintes fundamentos:

"Lembro, aqui, porém, uma sentença que li, em outros processos, do Exmo. Juiz João de Oliveira Batista, em que ele registrava o estranhamento quanto às atuais situações de médico de hospital: ele não é empregado; ele é um autônomo que trabalha dentro do hospital. Então, ele citava essa perplexidade que vem ocorrendo, com uma certa frequência, de médicos em hospitais serem uma espécie de autônomo, com aluguel de espaços (coisa que vem acontecendo em algumas outras categorias). No particular, a reclamada contava com onze prestadores de serviços (médicos), dois sócios e um radiologista/empregado; o reclamante recebia um percentual no valor do exame, configurando trabalho por produção a clínica agendava os horários dele, de acordo com sua disponibilidade-; além disso, a reclamada possuía horários de funcionamento; tinha empregados (recepcionistas, assistentes etc.); e nessa estrutura se inseriam os médicos, que não eram autônomos, liberais, ou coisa que o valha. As clínicas adotam esse procedimento, assim como os hospitais, entretanto falta combinar com o ordenamento jurídico, que é indisponível às partes.

(...)

Há detalhes que não são capazes de afastar uma coisa que é absolutamente evidente: se um médico está trabalhando dentro de uma área em que se explora atividade de medicina, o trabalho dele não pode ser eventual, quando o conceito de eventualidade - todos que atuam no Direito do Trabalho o sabem - está relacionado muito mais à atividade, à exploração, ao fim da atividade econômica do que a quantas vezes a pessoa trabalha naquele empreendimento. O reclamante não era sócio, pois só havia dois; logo, é empregado." - destacado.

No mesmo sentido, de acordo com o princípio da primazia da realidade, a jurisprudência dos Tribunais combate a ocorrência de fraude trabalhista:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. PESSOAS JURÍDICAS. FRAUDE. VÍNCULO DE EMPREGO RECONHECIDO. É incontroversa nos autos a existência de contrato de prestação de serviços entre a empresa em que o Reclamante figura como sócio e a Reclamada. No entanto, tanto a prova oral, quanto a prova documental demonstram a existência de trabalho subordinado, com prestação apenas formalmente executada por meio de pessoa jurídica. Patente a ocorrência do moderno fenômeno da assim chamada "pejotização" das relações laborais, sistema fraudulento onde as empresas, para reduzirem seus custos, contratam, ao invés de empregados, pessoas jurídicas, camuflando a existência de relações trabalhistas informais. Referida modalidade fraudatória, inclusive, tem sido objeto de costumeira análise por parte da Corte Superior Trabalhista, que a vem rechaçando de maneira enérgica. Por sua vez, não se cogita de que o reconhecimento de vínculo propiciaria ao Obreiro beneficiar-se da própria torpeza, pois, necessária a ponderação de que ao empregado, quando da contratação, não é dado discutir, em igualdade de condições, as cláusulas contratuais, e, assim, devem ser considerados, os princípios protetivos que norteiam esta seara, bem como o fato de a questão se tratar de matéria de ordem pública, insuscetível de transação pelas partes. Presentes os elementos caracterizadores da relação de emprego (arts. 2º e 3º da CLT), resulta evidente a fraude praticada pela Ré (art. 9º da CLT), impondo-se a declaração do vínculo. Recurso da Ré a que se nega provimento. (TRT-PR-11946-2014-005-09-00-8-ACO-20847-2015 - 7A. TURMA Relator: UBIRAJARA CARLOS MENDES Publicado no DEJT em 07-07-2015) - destacado

Não bastasse o reconhecimento do vínculo trabalhista, a Justiça do Trabalho tem reconhecido, em alguns casos, o dano moral pela ocorrência da "pejotização":

PEJOTIZAÇÃO. EXIGÊNCIA DO EMPREGADOR PARA QUE O TRABALHADOR CONSTITUA PESSOA JURÍDICA COMO CONDIÇÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. INVALIDADE. ARTIGO 9º, DA CLT. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. O sistema jurídico pátrio considera nulo o fenômeno hodiernamente denominado de "pejotização", neologismo pelo qual se define a hipótese em que o empregador, para se furtar ao cumprimento da legislação trabalhista, obriga o trabalhador a constituir pessoa jurídica, dando roupagem de relação interempresarial a um típico contrato de trabalho o que exige o reconhecimento do vínculo de emprego. ASSÉDIO MORAL. "ROUPAGEM". O assédio moral, ou, ainda, manipulação perversa, terrorismo psicológico, caracteriza- se por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do trabalhador, expondo-o a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar-lhe ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica. O assédio moral é concebido como uma forma de "terror psicológico" que pode ser praticado pela empresa ou pelos próprios colegas. A necessidade de obtenção de lucro não se sobrepõe à honra, imagem, intimidade e dignidade da pessoa humana, princípios constitucionais que norteiam a nossa sociedade e cujo zelo compete a todos os cidadãos brasileiros. No caso em tela o "assédio" restou configurado na "roupagem", de exclusão da "posição da empregada no emprego", deteriorando seu ambiente de trabalho. Portanto, sempre que o trabalhador, em razão do contrato de trabalho, por ação ou omissão do empregador, sofrer lesão à sua dignidade, honra, ou ofensa que lhe cause um mal ou dor (sentimental ou física) causando-lhe abalo na personalidade ou psiquismo, terá o direito de exigir a reparação por danos morais e materiais decorrentes da conduta impertinente. Nesse sentido dispõem os artigos 186 e 927 do CC de 2002. (TRT 2ª R.; RO 0233100-21.2009.5.02.0048; Ac. 2012/0933661; Quarta Turma; Relª Desª Fed. Ivani Contini Bramante; DJESP 24/08/2012) - destacado

E ainda, os Tribunais também têm reconhecido o direito do profissional em ser reparado, a título de danos materiais, pelos custos do "empreendimento", ou seja, da manutenção da pessoa jurídica objeto de fraude:

INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. DEVOLUÇÃO DE DESPESAS COM A CONSTITUIÇÃO E MANUTENÇÃO DE PESSOA JURÍDICA. "PEJOTIZAÇÃO". ATO ILÍCITO. (...). (...). Na hipótese, infere-se que o Regional, na decisão recorrida, embora tenha reconhecido que a contratação da reclamante condicionada à constituição de pessoa jurídica constituiu fraude às normas trabalhistas e tenha mantido a declaração de existência de relação de emprego com o primeiro reclamado, Bradesco Vida Previdência S.A., entendeu que essa condição exigida à reclamante não configurou ato ilícito nem exercício abusivo do direito, motivo pelo qual indeferiu o pagamento da indenização por danos materiais. Contudo, evidenciada a fraude à aplicação das normas trabalhistas, é nula, de pleno direito, a forma de contratação formalizada pelas partes, por se tratar de prática ilegal e ilícita, nos termos dos artigos 9º da CLT e 187 do CCB. Por outro lado, para que haja a condenação dos reclamados ao pagamento de indenização por danos materiais, decorrentes da constituição e manutenção da pessoa jurídica, é imprescindível a comprovação dos prejuízos patrimoniais alegados pela reclamante, nos termos do artigo 333, I, do CPC, visto que os danos materiais, ao contrário dos danos morais, não são presumíveis. No caso dos autos, o Tribunal Regional não se pronunciou sobre a existência ou não de comprovação nos autos dos valores gastos com a abertura, manutenção e encerramento da pessoa jurídica, visto que entendeu ser indevido o pagamento dos danos materiais, por não estar configurado ato ilícito do reclamado, o que não subsiste, conforme ora fundamentado. Dessa forma, torna-se necessário que o Tribunal a quo se manifeste sobre esse aspecto (...). Recurso de revista conhecido e provido para determinar o retorno dos autos ao TRT de origem para que examine o recurso ordinário da reclamante à luz da existência ou não de comprovação nos autos dos valores gastos, a título de danos materiais, com a abertura, manutenção e encerramento da empresa, à luz das regras de distribuição do ônus da prova a esse respeito. Sobrestada a análise dos demais temas do recurso de revista" (TST , Relator: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 06/05/2015, 2ª Turma)

CONSTITUIÇÃO DE PESSOA JURÍDICA. EXIGÊNCIA DO EMPREGADOR. BURLA À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. RESSARCIMENTO DE DESPESAS. A exigência de constituição de pessoa jurídica para fins de contratação dos serviços da obreira, esquivando-se o real empregador dos encargos trabalhistas, gera a obrigação de reparar o dano material correspondente às despesas empreendidas com a abertura e manutenção da empresa, especialmente quando o vínculo empregatício já foi reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, nos autos de reclamação trabalhista que precedeu a esta" (TRT-22 - RO: 1195200600422004 PI 01195-2006-004-22-00-4, Relator: MANOEL EDILSON CARDOSO, Data de Julgamento: 29/04/2008, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJT/PI, Página 05, 9/5/2008) - destacado

Portanto, ao profissional que dedicou anos de estudo para firmar-se no mercado de trabalho - exemplo dos profissionais de saúde -, encontrando-se no prejuízo em relação a seus direitos trabalhistas, orienta-se que procure a Justiça do Trabalho. Principalmente, frisa-se, quando houver real e clara subordinação, ou seja, recebimento de comandos e ordens (até mesmo pelo whatsapp e e-mails), jornada delimitada pelo empregador (escalas), entre outros fatos decorrentes da rotina de empregado subordinado (art. 3º da CLT), uma vez que a fraude trabalhista (art. 9º da CLT) o prejudicará em todos os seus direitos trabalhistas.

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1
Médico comprova vínculo de emprego com clínica radiológica

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*Vitor Ferreira de Campos é advogado em Londrina/PR.

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