Novo CPC exige autonomia da Advocacia Pública
A consolidação gradativa do sistema de precedentes torna clara a necessidade de autonomia da Advocacia Pública.
sexta-feira, 17 de março de 2017
Atualizado às 08:04
O primeiro ano de vigência do CPC/15 gradativamente implanta o sistema de precedentes e muda a cultura dos operadores do direito. A consolidação gradativa dessa nova mentalidade torna clara a necessidade de autonomia da Advocacia Pública.
Desde o início da tramitação da nova legislação, a celeridade processual foi declarada como um de seus principais objetivos1. Com o início dos trabalhos, percebeu-se que a celeridade por si só não seria suficiente para garantir o devido processo legal e, gradativamente, a segurança jurídica ganhou espaço2.
Uma das principais apostas para se chegar ao equilíbrio entre celeridade e segurança foi a utilização de precedentes em sentido técnico.
O primeiro ano deixou claro também que o enquadramento de uma decisão como precedente pode ter várias funções e utilidades, mas pouco se discutiu sobre a atuação direta dos advogados públicos nessa seara.
A remessa necessária é o maior exemplo de que uma alteração na concepção do papel e da importância da Advocacia Pública se faz imprescindível. Entre o rol de precedentes capazes de dispensar a remessa necessária estão os entendimentos coincidentes com orientações vinculantes no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidadas em manifestação, parecer ou súmula administrativa3.
O art. 496 do CPC atribuiu a mesma força normativa para precedentes firmados no âmbito administrativo e judicial no tocante à remessa necessária.
Os entendimentos firmados pela Advocacia Pública ganharam a mesma força normativa que precedentes oriundos do STF e STJ no que se refere à dispensa de aplicação do instituto.
Essa importante missão ainda não vem sido exercida no âmbito das diversas Advocacias Públicas. A principal razão para tanto é a falta de autonomia.
Não faz sentido se atribuir o mesmo efeito normativo de entendimentos obtidos no âmbito das Advocacias Públicas sem que se dê a mesma garantia das decisões judiciais.
A característica comum de todos os órgãos que proferem as mencionadas decisões nos incisos I, II e III do art. 496, § 4o, é a autonomia.
Essa é a garantia que assegura que determinadas decisões possam ter efeitos normativos. Não há como conceber, portanto, que uma decisão administrativa tenha o importante efeito de bloquear a remessa necessária sem as mesmas garantias dos órgãos jurisdicionais.
O pressuposto fundamental do CPC para a remessa necessária foi a identidade de garantias entre os órgãos que possam gerar tais precedentes. Como a Advocacia Pública pode proferir entendimentos com os mesmos efeitos normativos de decisões de tribunais superiores, é imprescindível lhe conferir as mesmas prerrogativas sob pena de comprometer o sistema de precedentes e a necessária ponderação dos princípios da celeridade e da segurança jurídica.
A nova legislação processual codificada, portanto, tornou imperiosa a aprovação da PEC 82/07 sob pena de fulminar as pretensões do CPC de uma duração razoável do processo.
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1. Co'digo de Processo Civil : anteprojeto elaborado pela Comissa~o de Juristas Responsa'vel pela Elaborac¸a~o de Anteprojeto de Co'digo de Processo Civil. <Clique aqui>
2. Sobre o tema, vide: VIANA, Juve^ncio Vasconcelos. Da duração razoável do processo. In: Revista Diale'tica de Direito Processual, n. 34, p. 53-68, Sa~o Paulo: Diale'tica, jan./2006, p. 53; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Se'rgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento. Sa~o Paulo: RT, 2006, p. 584; GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Técnicas de aceleração do processo. Sa~o Paulo: Lemos & Cruz, 2003, p. 40.
3. Art. 496, § 4o, do Novo CPC. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I - súmula de tribunal superior;
II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.
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*Silvano José Gomes Flumignan é doutor, mestre e bacharel em direito pela USP. Professor da UPE e da ASCES/UNITA. Procurador do Estado do PE.