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Dos requisitos para aplicação da justa causa

O empregador tem poder disciplinar sobre seu empregado, podendo-lhe aplicar punições quando o obreiro comete faltas. Esse poder não é absoluto, tendo como limitador o Princípio da Proteção ao Trabalhador, insculpido no artigo 9º da CLT.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Atualizado em 22 de fevereiro de 2017 10:24

De acordo com o artigo 2º da CLT, o empregador tem o poder diretivo, disciplinar, sobre seu empregado, podendo aplicar-lhe punições quando o obreiro comete faltas. Inclusive pode o empregador rescindir o contrato de trabalho de forma motivada, devido à falta cometida pelo obreiro, aplicando-lhe a sanção da justa causa, nos termos do artigo 482 da CLT. Diante de tal penalidade não há necessidade da empresa pagar diversos direitos a este empregado, que seriam devidos na modalidade de dispensa imotivada.

No entanto, o poder disciplinar do empregador não é absoluto, tendo como seu limitador o princípio que rege a Justiça do Trabalho, qual seja: O princípio da Proteção ao Trabalhador, insculpido no artigo 9º da CLT.

Devido a esse princípio, para que seja aplicada a justa causa ao obreiro, o empregador tem de obedecer alguns requisitos, pois a modalidade de dispensa em comento retira do trabalhador o direito ao recebimento de diversas verbas rescisórias, quais sejam: aviso prévio, 13º salário proporcional e férias proporcionais + 1/3.

Além disso, priva o obreiro do recebimento da multa rescisória de 40% sobre o FGTS depositado pelo empregador e o impede de habilitar-se ao seguro desemprego e de soerguer o FGTS que tem depositado em sua conta vinculada.

Portanto, devido ao princípio da proteção ao trabalhador, para que sejam retirados do empregado todos esses benefícios quando do término do seu contrato de trabalho, o ordenamento jurídico impõe ao empregador o ônus de fazer prova da justa causa aplicada, tendo o magistrado que analisar a justa causa aplicada sob a égide do princípio in dubio pro operário.

Uma vez aplicada a justa causa, o empregado, inconformado, baterá às portas do judiciário e aforará demanda trabalhista buscando a reversão da modalidade de dispensa, para ter garantido os direitos supracitados.

Para que a empresa consiga manter em juízo a justa causa aplicada ao obreiro, ela terá de provar que o trabalhador praticou as faltas que ensejaram a dispensa motivada e, para isso se sustentar em juízo, o empregador tem de observar os seguintes requisitos:

a) imediatidade: Não pode haver o transcurso de um longo tempo entre o conhecimento da falta pelo empregador e a aplicação da penalidade, sob pena de configurar perdão tácito. Assim, logo que o empregador tomar conhecimento da prática do ato faltoso, deve providenciar a aplicação da penalidade. O ideal é que o empregado seja dispensado, até, no máximo, o dia seguinte ao do conhecimento da falta pelo empregador, conforme recomendação do desembargador Sérgio Pinto Martins. (in Manual da Justa Causa. Sérgio Pinto Martins. São Paulo: Atlas, 2005, p. 33). Convém ressaltar que há casos em que o empregador investiga antes, a prática da falta, para ter certeza da sua autoria e para aplicar corretamente a penalidade (o procedimento de investigação deve ser instaurado de imediato), como é comum nas grandes empresas. Nesse caso, a penalidade deve ser aplicada logo após a conclusão da investigação e esta servirá de prova para a justa causa aplicada. Veja-se, a propósito, o seguinte julgado:

JUSTA CAUSA. AUSÊNCIA DE IMEDIATIDADE NA APLICAÇÃO DA PENALIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. Restando patente a inércia da empregadora ao não aplicar imediatamente a penalidade que entendia cabível pela prática de ato de improbidade por parte do empregado, não há que se falar em reconhecimento da dispensa por justa causa. (TRT 7ª R; RO 0001618-24.2014.5.07.0016; Rel. Des. Jefferson Quesado Junior; julg. 19/09/2016)

b) proporcionalidade entre a falta e a punição: A justa causa deve ser aplicada para falta gravíssima, aquela que impede o prosseguimento da relação de emprego em razão da quebra de confiança. Para aplicar a penalidade mais adequada, o empregador deve sopesar o contexto em que ocorreu, o passado funcional do trabalhador, grau de instrução do trabalhador, etc.

RECURSO ORDINÁRIO OBREIRO. JUSTA CAUSA. PROPORCIONALIDADE DA PENA. DESCARACTERIZAÇÃO. A cessação da relação de emprego mediante falta praticada pelo empregado é pena máxima que necessita ser grave a ponto de justificar a dispensa, no que é de fundamental importância que seja levada em consideração a extensão (gravidade) da falta cometida, a ponto de ensejar a resolução do contrato de trabalho. Constatada, na hipótese, que a punição aplicada foi proporcional à gravidade do ato praticado, sendo observada, inclusive, a gradação pedagógica (advertência e suspensão), há de ser mantida a decisão de primeiro que ratificou a justa causa aplicada pelo empregador como motivo da dispensa do reclamante. Apelo desprovido. (TRT 19ª R; RO 0001308-97.2012.5.19.0260; Primeira Turma; Rel. Des. Antônio Adrualdo Alcoforado Catão; Julg. 21/01/2014; DEJTAL 18/02/2014; Pág. 12)

c) non bis in idem: o empregador não pode punir o empregado duas vezes pela mesma falta. Ex: o empregado falta injustificadamente 3 dias seguidos ao trabalho, devido a essa falta é punido com advertência, posteriormente, o empregado falta outra vez injustificadamente, e o empregador, desta vez, lhe aplica suspensão de 2 dias, e, em um terceiro momento, o empregado volta a faltar, sendo-lhe aplicada no suspensão de 3 dias, no entanto, quando o empregado retorna ao trabalho, após cumprir os 3 dias de suspensão, o empregador se arrepende de tê-lo punido apenas com suspensão, e devido ao seu histórico de faltas, resolve dispensá-lo por justa causa. Se isso ocorrer, por mais que o empregado já tenha faltado diversas vezes, prevalecerá as punições de advertência e suspensão já aplicadas, pois o obreiro já havia recebido punição pelas faltas injustificadas : a dispensa por justa causa será convertida em dispensa sem justa causa pela Justiça do Trabalho, senão vejamos:

DISPENSA POR JUSTA CAUSA. Impossibilidade de dupla punição. Princípio da singularidade da punição conquanto o direito de aplicar punições seja autorizado pelo poder diretivo do empregador, já que é ele quem responde pelos riscos do negócio (CLT, art. 2º), o seu exercício subordina-se à observância de alguns requisitos, dentre os quais o da singularidade da punição (non bis in idem). Dessa forma, uma vez imposta uma determinada sanção ao empregado faltoso, não poderá o empregador agravá-la com a aplicação de outra mais ou com a sua conversão por alguma mais gravosa. (TRT 12ª R; RO 0003415-13.2013.5.12.0022; Quinta Câmara; Relª Juíza Maria de Lourdes Leiria; DOESC 31/03/2014)

d) não discriminação: o empregador não pode punir de forma diversa empregados que praticaram a mesma falta:

RUPTURA CONTRATUAL. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. REQUISITOS. No exercício do seu poder disciplinar, deve o empregador, ao dispensar o trabalhador por justa causa, em razão do cometimento de conduta prevista no art. 482, da CLT, observar: A gravidade do ato; a imediatidade da pena; a proporcionalidade com o ato faltoso; non bis in idem; e a não discriminação do empregado. Vislumbra-se discriminatória a postura do empregador que pune de forma diferente empregados que praticaram a mesma falta, deixando, inclusive, de apenar um deles, o que impõe o afastamento da penalidade imposta apenas ao outro. (TRT 1ª R; RTOrd 0000558-19.2010.5.01.0082; Nona Turma; Rel. Des. Rogerio Lucas Martins; Julg. 14/02/2012; DORJ 17/02/2012)

Portanto, antes de demitir por justa causa um empregado, o empregador deve analisar se todos os requisitos mencionados foram observados, evitando assim a reversão da modalidade de dispensa em juízo.
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*Meriane de Araujo Borges é advogada do escritório Bella Martinez Advogados.

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