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Algumas questões acerca do inventário negativo de bens no direito brasileiro

O direito brasileiro se revela avesso à ideia de um patrimônio sem um titular determinado, o que em se tratando de pessoas existentes se resolve em termos de tradição e transcrição, enquanto meios de aquisição da propriedade inter vivos.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Atualizado às 09:48

Como cediço o direito brasileiro se revela avesso à ideia de um patrimônio (entendido pela generalidade dos autores, a partir de postulados ponteanos, como um conjunto de posições jurídicas ativas e passivas, suscetíveis de avaliação econômica e consequente expressão monetária) sem um titular determinado, o que em se tratando de pessoas existentes (naturais ou jurídicas) se resolve em termos de tradição e transcrição, enquanto meios de aquisição da propriedade inter vivos.

Mas desde há muitos, se encontra superada a ideia dos romanos que, com sua singular pragmaticidade, asseveravam no sentido de que mors omnia solvit, ou seja, em tradução literal, uma ideia de que a morte tudo resolve, de sorte tal que, ao menos hipoteticamente, com o falecimento do de cujus sucessiones agitur, os problemas estariam acabados, tudo estaria resolvido (não obstante os romanos acolhessem a ideia de morte numa acepção mais ampla que a do direito atual - aceitava-se, por exemplo, o conceito de morte civil1).

Isso porque no direito romano bastaria que se morresse com um herdeiro homem que seria responsável pelo culto dos antepassados (deuses lares - vindo daí a expressão "lar" para significar o local do fogo sagrado dentro de uma casa - simbolizando os parentes mortos), para que se impedisse que os mortos de dada estirpe familiar passassem por necessidades no mundo espiritual, com libações anuais nas sepulturas desses entes queridos falecidos (acreditava-se que a vida seguia no túmulo, geralmente localizado nas casas ou lares)2.

Aí, diga-se en passant, pode-se perceber a gênese dos rituais que empregamos atualmente no dia dos mortos, quando são levadas flores aos jazigos dos entes queridos falecidos.

E, da mesma forma, verifica-se a gênese da proteção ao imóvel de família (no direito romano a propriedade tinha esse caráter sagrado e não era alienada nem para o pagamento de dívidas do pater famílias que seria vendido como escravo se dívida não fosse paga, para que os demais membros da família conservassem o local sagrado)3.

Clique aqui e confira o artigo na íntegra.

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1. Nesse sentido interessantes ponderações históricas apontadas por Thomas Marky em célebre obra acerca de direito romano, mencionada nas referências do presente texto, às páginas 35 e seguintes.

2. Fustel de Colanges. A Cidade Antiga, como mencionado nas referências ao final deste texto.

3. Com narrativa acerca desta correlação entre propriedade e o seu caráter sagrado no direito romano e seu reflexo nos dias atuais, em obra mencionada nas referências deste texto, o entendimento de Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, às fls. 65.

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*Júlio César Ballerini Silva é magistrado e professor de cursos de graduação e pós-graduação na Unisal, Esamc, Proordem, Pitágoras e Unifeob. Mestre em Processo Civil pela PUC/Campinas. Especialista em Direito Privado pela USP.

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