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Algumas considerações a respeito da tutela jurídica da pessoa idosa no Direito brasileiro - tutela da saúde

O reconhecimento de uma tutela jurídica aos mais idosos no Brasil parece se delinear a partir do advento da Carta Política vigente.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Atualizado às 08:00

Na elaboração de qualquer trabalho científico de se buscar uma análise acerca da atualidade do tema que se prestará de objeto de estudo, eis que isso conferirá relevância a tal objeto o que parece adequado, no tema em testilha, na medida em que se está a observar as considerações acerca de uma década de vigência do Estatuto do Idoso, a conhecida lei 10.741/03.

De todo modo parece igualmente conveniente que todo trabalho científico parta de uma análise histórica do seu objeto para uma melhor compreensão do tema, permitindo verificar sua evolução no contexto social e permitir melhor análise desta atualidade.
Nesse sentido, a opinião de Vincenzo La Medica:

Para a exata compreensão de um instituto jurídico, é necessário procurar-lhe as fontes e considerá-lo através de sua evolução histórica; mais que não seja "para tirar - como ensinava Carrara - da comparação das antigas leis com as novas, argumentos demonstrativos da progressividade das nossas doutrinas, utilizando-os para ulteriores desenvolvimentos ou para corrigir as novas disposições, se em qualquer ponto forem menos sabiamente elaboradas."1

E o reconhecimento de uma tutela jurídica aos mais idosos no Brasil, ao menos de forma mais sistêmica, ou não genérica, parece se delinear a partir do advento da Carta Política vigente.

Quanto a isso, parte-se da constatação de que o Brasil se organiza como uma República Federativa e que a mesma seja, por imposição da Constituição Federal um Estado Democrático de Direito. E não é desnecessário apontar que as normas jurídicas devem se pautar por um crivo de efetividade, ou seja, devem, no mínimo, atender às finalidades para as quais foram criadas.

A sociedade brasileira não mais tolera situações de vazio normativo, como o revelam as recentes manifestações populares que, dentre outras pautas, se postaram contra os direitos não cumpridos pelos órgãos públicos - fato notório amplamente divulgado pelas mídias.

E um dos fundamentos deste Estado Democrático de Direito previsto pela CF implica, justamente, no cumprimento de um princípio de dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso IV, CF), com despatrimonialização do direito, buscando-se uma personificação das relações jurídicas2. A partir daí os direitos relativizam-se, devendo sempre ser constatados a partir dessa premissa.

São ainda objetivos deste Estado Democrático de Direito, a construção de uma sociedade mais livre, justa e solidária (art. 3º, inciso I, CF) e promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Ou seja, todo ser humano deve ser respeitado, no que tem de humano, não no que possuir de bens, não se admitindo nada que retire a dignidade de uma pessoa enquanto tal, sendo o Brasil um país que tem o dever de ser solidário e justo, respeitando as pessoas sem preconceito em relação à sua idade.

O fato da Constituição ter feito expressa menção à vedação desses preconceitos, do ponto de vista lógico e pelo princípio pelo qual as normas não devem conter preceitos inúteis, revela que, em verdade, no ano da promulgação da CF/88 havia efetivo preconceito etário que justificasse tal previsão. Se não houvesse preconceito etário o constituinte não teria se preocupado com isso, como de fato fez.
Nesse sentido, atual a opinião de Canotilho no sentido de que se deva aplicar o princípio da máxima efetividade, assim sintetizado:

Princípio da máxima efetividade ou da eficiência - "a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e embora a sua origem esteja ligada à tese da atualidade das normas programáticas (Thoma), é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais".3

Nessa época o país saía de uma rígida ditadura militar (regime totalitário), sendo conveniente que esses preceitos fossem ressalvados na democracia que se inaugurava, porque em outros períodos históricos determinados, em regimes totalitários como o nazismo e o stalinismo, pessoas idosas foram reputadas descartáveis4.

Mais além, pela primeira vez numa CF brasileira, ocorreu efetiva preocupação com a proteção jurídica de pessoas idosas, na medida em que o artigo 230 da CF exigiu que família, sociedade e Estado tinham o dever de amparar essas pessoas.

E não é só, essas instituições (família, sociedade e Estado) teriam que assegurar a participação dos idosos na comunidade, defendendo sua dignidade e bem estar, garantindo-lhe o direito à vida.

Nesse compasso o Brasil se equiparava a outros Estados como Espanha, Itália, México, Peru e Portugal, que igualmente fizeram inserir em suas Constituições, dispositivos protetivos das pessoas idosas5.

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1 MEDICA, Vincenzo La. O Direito da Defesa, Campinas: M & E, 2003, p. 9.

2 CASSETARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2.011, p. 401.

3 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 7ª Edição, 3ª Reimpressão, p. 1.224.

4 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo: Companhia das Letras, 2.004.

5 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva, Comentários à Constituição do Brasil, Vol 8, São Paulo: Saraiva, 1.998, p. 1.036.
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*Júlio César Ballerini Silva é magistrado, professor e coordenador Nacional do Curso de Pós-Graduação em Direito Civil e Processo Civil da ESD/Proodem.


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