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O voto nas ações em usufruto

O nu proprietário reserva a si o direito político do voto nas deliberações sociais, entregando ao usufrutuário os direitos patrimoniais voltados aos lucros distribuíveis.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Atualizado em 7 de dezembro de 2016 08:08

Muito frequentemente vemos disposições, ou testamentárias ou por meios contratuais de doação, criando usufruto sobre participações acionárias ou mesmo até sobre cotas de capital de limitadas.

Em tantos casos o nu proprietário reserva a si o direito político do voto nas deliberações sociais, entregando ao usufrutuário os direitos patrimoniais voltados aos lucros distribuíveis e a partilha de capital.

Nessas hipóteses ocorre considerar sobre eventuais garantias ou amarras a favor do usufrutuário no sentido de não correr este o risco de ter diluídos ou apequenados seus direitos patrimoniais por deliberações sociais posteriores tomadas com o concurso do voto do nu proprietário.

E ressalta ponderar sobre possível acordo de acionistas (ou de cotistas) entre um e outro, ou seja, entre o nu proprietário e o usufrutuário onde se convencionem condições e limites para o exercício do direito de voto daquele.

Naturalmente que no trato normativo do acordo de acionistas a lei 6.404/76 nada dispõe sobre compromisso de voto entre os que partilham o direito real sobre as ações. Assim como nada transparece nos artigos 39 e 40 da lei ao cuidarem do usufruto e demais direitos reais sobre os títulos acionários.

Entende-se que o artigo 118 da lei não comporta terceiros, como o usufrutuário (que não dispõe do direito real de propriedade das ações) como parte no acordo de acionistas (Neste sentido Celso Agrícola Barbi "in" Acordo de acionistas, 1993, BH, del Rey Editora, págs.82 a 85)

Contudo a doutrina majoritariamente aponta que, na esteira do artigo 114 da lei 6.404 o voto da ação gravada com usufruto só pode ser exercido mediante acordo prévio entre o nu proprietário e o usufrutuário ou nos termos do ato inter vivos ou causa mortis instituidor do usufruto.

Aliás, esse ajuste há de ser compulsório por uma ou outra forma, já que a norma legal afirma que ali o direito de voto "somente poderá ser exercido...".

O que se pode concluir e recomendar aqui é que o usufrutuário demande sempre do instituidor do usufruto essas limitações ao exercício do voto pelo nu proprietário - sobretudo se este for majoritário em conjunto com outros ou por si só - de modo a que não se reduza sem critérios objetivos, claros e justificados a distribuição dos lucros da companhia, e, no caso extremo, a repartição do capital líquido da mesma. Se acaso o direito real for instituído em testamento, muitas vezes sem oitiva do usufrutuário a se beneficiar, tal assentimento convencional não terá cabida, mas diante do comando legal fica de toda forma constrangido o nu proprietário a essa necessária aprovação para o exercício de seu voto.

Pois usando-se a força ordenatória do artigo 114 da lei 6.404/76, cabe ao usufrutuário da ação pertinente exigir o seu de acordo para que o nu proprietário exerça o voto em assembleia. E ficando claro que se preso o proprietário por convenção de voto em acordo de acionistas mesmo assim o seu voto para ser válido demanda a aprovação prévia do usufrutuário.

No silêncio do CC temos como aplicáveis às cotas de limitadas acaso repartidas em direito real de propriedade nua e direito real de usufruto, tais normas direcionadas às ações de sociedades anônimas. Realmente, mesmo que não optem os sócios da limitada à regência supletiva da lei acionária, esta se deve dar em matéria de usufruto, já pelo silêncio completo do CC no trato dessa específica matéria ao cuidar tanto das limitadas como das sociedades simples.
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*João Luiz Coelho da Rocha é advogado e sócio do escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha e Lopes Advogados. Professor de Direito da PUC/RJ.

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