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Jânio Quadros Poeta

Quadras de decassílabos com rimas de preciosidade elaborada, substantivos rimando com verbos e adjetivos, sem concessão nenhuma a rimas pobres, como aquelas de verbo com verbo e eco final de sufixos adverbiais.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Atualizado às 08:52

Pesquisando a história da Academia de Letras da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, encontro versos de Jânio Quadros poeta.

Primeiro ainda estudante, membro da Academia de Letras da Faculdade, Cadeira Castro Alves. Depois, já tendo sido Presidente da República, como colaborador especial.

Nenhuma surpresa. Presidi a Academia de Letras nos duros anos de 1967/1968 e sabia das incursões poéticas janistas.

São versos de esforçado pretendente parnasiano. Tecnicamente rigorosos. Quadras de decassílabos com rimas de preciosidade elaborada, substantivos rimando com verbos e adjetivos, sem concessão nenhuma a rimas pobres, como aquelas de verbo com verbo e eco final de sufixos adverbiais. Cuidadosa a métrica, recaindo as sílabas tônicas ao rigor das regras.

Vale reviver os versos de Jânio poeta juvenil. Para a lembrança biográfica de um Presidente da República e para a recordação dos grandes nomes que passaram pela Academia de Letras da Faculdade de Direito - os primeiros quando ainda nem existia a USP, nem havia outras Faculdades no Estado, quando era simplesmente a Faculdade de Direito de São Paulo!

EVOCAÇÃO1

Meu São Paulo querido! Eu te revejo

pequenino, brumoso, frio, tristonho...

E humilde, São Paulo, e sertanejo,

eras grande no amor! Grande no sonho!

Eu me lembro, São Paulo. Uma janela

Se ilumina na bruma, e, de repente,

Abre-se, e à luz incerta de uma vela,

a moça escuta a serenata quente.

Há romances no ar! Baila no espaço

um cheiro de aventura, e, na taberna,

os boêmios recitam no compasso

eternos versos da poesia eterna.

Corre um rumor longínquo. E a bruma fria

traz vozes de poesia e de oração...

-- Um estudante canta a Academia,

outro estudante prega a Abolição!

Passam vultos sombrios, e distante,

no silêncio da noite, alguém dedilha,

uma canção de amor à linda amante

que se oculta, medrosa, na mantilha.

Meu São Paulo querido! Eu te revejo

pequenino, brumoso, frio, tristonho...

E humilde, São Paulo, e sertanejo,

Eras grande no amor! Grande no sonho!

LUA LONDRINA2

Não surge, não. Apenas dilacera

o negrume da urbe fumarenta

e a espreita entre o carvão, o pó e a hera,

semi-oculta, sorturna, macilenta.

Reponta outra vez, e agora espera

alcançar toda a Londres sonolenta,

as docas, Piccadilly e, se pudera

a infindável metrópole cinzenta.

Lua londrina que prescruta o mundo

no terror do que vê e foge, presto,

da babel de um planeta moribundo.

Tímida lua que espelha no asfalto

a tragédia, a miséria, a morte e o resto

da humanidade que não olha ao alto.

Lembrei-me da clássica "Antologia dos Poetas Bissextos Contemporâneos" de Manuel Bandeira. Que tal tentar um dia tentar uma "Antologia dos Políticos Poetas Bissextos" -- ou, ao menos, "Políticos à Procura da Poesia"?

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1 "Arcádia", órgão da Academia de Letras da Faculdade de Direito da USP, 1938, vol. 8, pág., 27.

2 "Arcádia", órgão da Academia de Letras da Faculdade de Direito da USP, 1972, n. 2, pág. 29.

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*Sidnei Beneti é ministro aposentado do STJ.




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